69 Extremo...

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Donga,

Ordenei que o Raul levasse o celular da Eloá, e agora, estou enviando mensagem no celular da Jessy para ela destrancar o portãozinho de grade branca, que é a entrada de seu barraco.

Ela, a mãe e a irmã moram nos fundos do barraco de uma senhora. Um barraco humilde pra caralho, no final do corredor estreito que não passa duas pessoas lado a lado.

Jessy vem sorridente pelo caminho escuro, destranca o cadeado, e numa guinada, colide seu corpo no meu, mergulhando no meu pescoço. Está perfumada, um shortinho curto de tecido e uma blusa fina de alça sem sutiã. Gosta de me instigar, procura sempre me receber com roupas que exibem seu corpo para despertar meu tesão.

— Demorou, hein... Seus quinze minutos, foram duas horas. — Se suspendendo no peito de seu pé, fecha as mãos na gola da minha blusa e prega sua boca na minha sedutoramente, o sorriso se expandindo em seus lábios grossos. Cerro minha boca sem retribuir.

Ao captar minha inércia, se solta de mim desconfiada, os olhos procurando em meu rosto algum indício da minha recusa.

Quando fala, sua voz está encharcada de suspeita.

— Que foi, Saulo? — Os olhos ansiosos a cata de respostas.

— Vamos ter esse papo lá dentro, Jessy... — digo num tom enxuto, prendendo seu cotovelo e a incentivando para entrar na frente.

Ela se desprende quando já estamos no início do beco e desliza pelo espaço apertado para encostar novamente o portão atrás de nós; não tranca. Feito isso, entrelaça nossos dedos, uma animação nova despertando…

— Tá... vem! — sai na frente, me puxando apressadamente, olhando para trás como se quisesse conferir se ainda estou ali.

— Tem alguém ai? Queria ter um particular... — pergunto, abaixando a cabeça quando o beco se transforma num quintal de terra cheio de corda para pendurar roupas, que são bem mais baixas que eu.

— Não, estou sozinha. Por isso te chamei. Preparei uma surpresa para você e tudo...— Ela solta minha mão no limite da porta. Sorri genuinamente, o olhar resplandecendo em entusiasmo ao parar para me dar passagem primeiro, para dentro dos quatro cômodos que formam sua casa.

Puta que pariu, que surpresa é essa?
Vim para dar última forma no nosso lance e ela preparou uma surpresa?!
Pelo jeito, vai ser mais complicado ainda do que eu pensei...

Atravesso a cozinha e o umbral do quarto, que no lugar de ter uma porta, é coberto por um lençol pendurado em pregos, para separar os dois cômodos. É a primeira vez em dias que eu reparo nisso. Nas outras vezes em que estive aqui, sempre estava muito na onda para observar.

— Depois tu passa na boca, vou deixar o Fabinho avisado pra liberar uma grana pra tu botar uma porta aqui. — Falo já no quarto, enquanto vejo as fotos dela pregadas na parede em frente. O guarda-roupa velho com uma porta caindo e a cama de solteiro em que dormimos juntos durantes os últimos dias.

Me comove a situação delas, porque vim desse mesmo lugar. Saí da extrema pobreza também. Se hoje tenho conforto, é porque tive que sacrificar muita coisa para isso, mas não me esqueço que durante minha infância e boa parte da juventude, morei em condições muito piores do que essa. Hoje, podendo fortalecer outras pessoas que vivem na mesma condição, não consigo não fazer, saca? Independente de estar ou não com ela, sei o quanto é foda uma mãe solteira criar os filhos, ainda mais sendo favelada, ainda mais ganhando merreca. No que elas precisarem, eu estarei dando uma moral sim, não tem porquê não fazer. Quando vivíamos em seis pessoas no barraco da minha avó, do mesmo tamanho desse aqui, recebemos muita ajuda. Hoje, graças a Deus tenho de sobra pra fazer o mesmo por quem mora na minha favela.

Love no Morro da Liberdade 1Onde as histórias ganham vida. Descobre agora