Boa noite! 😉 O encontro tão esperado, espero eu!
Deixo a música que ouvi a escrever este capítulo. Afinal, este episódio tem a sua magia...
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A cada passo que avançava, o meu coração batia mais depressa e a minha respiração tornou-se mais acelerada o que fazia com que me cansasse mais. Não queria causar dor, nem sofrimento aos meus pais e só de imaginar tal situação ficava transtornado. Mas sentia-me confiante, ao mesmo tempo, porque tinha a minha madrinha ao meu lado e a magia dela que me podia ser muito útil.
Estava tão concentrado no meu receio que nem prestava atenção ao que me rodeava. Mas quando vi a grande porta do salão escancarada fiquei com a consciência que dentro de alguns minutos eu e os meus pais voltaríamos a estar frente a frente. Ao fim de oitenta anos, eu voltava para a minha casa e para os meus pais.
- Tens a certeza que é isto que queres, Filipe? - perguntou a minha madrinha, parando de andar e olhando-me nos olhos.
- Sim. Vai à minha frente. Estarei logo atrás de ti. Vai.
Ela abanou a cabeça em concordância e entrou no salão.
- Violeta! - exclamou uma voz forte e grossa.
Era o meu pai.
- Ainda bem que regressaste, Violeta! - disse a minha mãe, com a sua voz doce.
Não podia perder a coragem e sem pensar mais nas consequências que podia acarretar a revelação da maldição que pairou sobre Aragão e Olisipo, dei um passo em frente, segurando com força a bengala do príncipe esqueleto.
- Ampara-me. Não me deixes ficar mal - murmurei para a bengala como se ela fosse mágica.
Entrei no salão dos tronos. Nas majestosas cadeiras a que se chamavam tronos encontravam-se os meus pais. Dei um olhar rápido ao meu redor e estava tudo exactamente igual há oitenta anos atrás. O tempo ali também não tinha passado.
Eu caminhava atrás da minha madrinha não mantendo grande distância entre nós. As minhas pernas estavam trémulas devido ao nervosismo, mas tentava andar direito. E quando estávamos próximos o suficiente dos meus pais, a minha madrinha fez uma vénia e eu imitei-a. Não foi tão graciosa e ágil, mas fiz o melhor que consegui.
- Vossas Graças! - cumprimentou formalmente a minha madrinha.
Se em Olisipo o uso era tratar o rei por Vossa Majestade, em Aragão era por Vossa Graça.
- Esperávamos ansiosos pelo teu regresso. Trazes notícias do meu filho? - perguntou o meu pai, sem rodeios.
- Encontraste-o? - perguntou a minha mãe, com um sorriso cheio de esperança.
Minha pobre mãe!
Eles estavam tão concentrados na fada e ansiosos por saber o que ela tinha para contar que nem notaram a minha presença.
A minha madrinha mostrou-se hesitante em responder.
- Violeta? Encontraste o meu filho?
- Apresenta-me, Violeta - encorajei-a.
Tratei-a pelo nome próprio para não causar confusão.
- Quem é o senhor? - quis saber o meu pai, de imediato, mirando-me de alto a baixo.
- Vossas Graças, aqui tendes o vosso filho, o Príncipe Filipe de Aragão.
Dei dois passos à frente para ficar ao lado da minha madrinha.
- Que brincadeira vem a ser esta, Violeta? - questionou-a a minha mãe, geladamente.
- Sim, que brincadeira de mau gosto vem a ser esta? O meu filho, Violeta? - perguntou o meu pai, com um ar autoritário.
- Estou aqui, pai - respondi. - Eu sou o teu filho.
- Infelizmente, não é uma brincadeira, Vossa Graça - disse a minha madrinha.
Ambos ficaram incrédulos e olhavam para mim com desconfiança. Mas a minha mãe sussurrou algo para o meu pai que eu consegui ouvir:
- A voz dele, Carlos.
Até me espantei por não padecer de surdez.
- Não digas disparates, Ana. Como pode o nosso filho ser um velho?
- Fui amaldiçoado - esclareci, de imediato.
Na verdade, eles é que tinham estado a dormir um sono amaldiçoado que os protegeu de envelhecer.
Os meus pais ficaram apreensivos. Não sabiam se haviam de acreditar ou duvidar e olhavam para a minha madrinha que abanava a cabeça afirmativamente para confirmar que eu era quem dizia ser. Era normal que não acreditassem de imediato, porque um rei e uma rainha tinham de ser astutos e proteger o seu reino, o seu povo, inclusive o seu filho de malfeitores, ladrões, impostores, oportunistas...
- E quem teria coragem de amaldiçoar o meu filho? - perguntou o meu pai, examinando-me com o olhar da ponta das botas à ponta dos cabelos.
Infelizmente, não restava nada do que eu era há oitenta anos atrás. Esse Filipe jovem não passava de um fantasma, estava preso no tempo.
- Uma bruxa - respondi.
A minha mãe levou a mão ao peito e soltou um "ah" de espanto e o meu pai levantou-se do trono com toda a sua magnitude e caminhou lentamente até mim.
- Será possível? - questionou-se ele com a sobrancelha erguida.
Era um gesto tão típico dele quando estava desconfiado.
Próximo de mim, o meu pai mirou-me o rosto com pormenor. Mantive-me firme. Não queria expressar nenhuma emoção, principalmente que viesse alguma lágrima inesperada.
Pela expressão do seu rosto percebi que ele passou de desconfiado a aterrorizado.
- Não pode ser - disse ele, abanando a cabeça negativamente, não querendo aceitar a verdade. - Não, não...
- Carlos... - chamou a minha mãe com a voz trémula, levantando-se do trono.
- És idêntico ao meu pai - disse o meu pai, com a voz a querer vacilar.
- Sou? - questionei-o, surpreendido.
O meu pai ficou branco como se tivesse sido apunhalado e nem me respondeu.
- Vossas Graças, é o mesmo o vosso filho. Jamais o traria se não tivesse a certeza absoluta - manifestou-se a minha madrinha, com uma voz calma.
A minha mãe desceu do trono, apanhou um pedaço de tecido do seu longo e rico vestido nas mãos para facilitar o andamento e correu para junto do marido. O meu pai mantinha-se uma estátua, mirando-me. O silêncio instalou-se. Era um silêncio perturbador. Porquê é que eles não falavam, não manifestavam os seus pensamentos?
- Filipe? - perguntou a minha mãe, mas percebi pelo seu timbre e pelo seu olhar que ela estava convencida.
- Sim, mãe - confirmei, com emoção na voz.
- Oh, meu Deus! - exclamou ela, indignada, levando uma mão para tapar a sua boca aberta. - O que é que te fizeram?
A história era tão cruel. O que é que eu devia responder para não a fazer sofrer mais naquele momento? Bastava afirmar aquilo que ela via.
- Envelheceram-me.
Vi os seus olhos serem ameaçados pelas lágrimas, ela estendeu os braços... Esperava pelo abraço dela que esteve ausente de mim por 80 anos e senti tanta falta. Por fim, mãe e filho iriam se reencontrar. Mas, fiquei mais uma vez sozinho.
- Ai - queixou-se a minha mãe, levando a mão ao peito.
- Mãe...
Via cair ao chão sem vida. Oh, meu Deus...
Nesse instante, o meu pai pareceu voltar à vida e ajoelhou-se para a puxar para os seus braços.
- Violeta - chamei-a, aflito.
- Ana... Ana... - chamou-a o meu pai, abanando-a.
- Calma, Vossa Graça - pediu a fada, enquanto lhe tomava os sinais vitais.
- Violeta, o que se passa? - perguntei, assustado.
- A tua mãe apenas desmaiou. Não deve ter aguentado a emoção. Eu vou leva-la para o quarto, Vossa Graça.
O meu pai concordou abanando a cabeça afirmativamente. A minha madrinha enfeitiçou-a para que o seu corpo levitasse e voasse até ao seu quarto. A minha mãe parecia a segunda bela adormecida.
- Ela vai ficar bem - acalmou-me a minha madrinha, vendo o meu ar extremamente preocupado.
O meu pai ergueu-se, lágrimas corriam pelo seu rosto e quase sem voz disse:
- Filho - estendeu os braços e caminhou na minha direcção.
- Pai.
Não aguentei quando os braços do meu pai rodearam o meu corpo e senti o seu abraço forte. Deixei cair a bengala e abracei-o para matar as saudades que senti durantes anos a fio. Tive tantas saudades. Finalmente, recuperei o meu pai, o meu herói! Senti ele a soluçar.
- Não chores, pai - pedi.
- Como é que essa bruxa se atreveu a fazer-te mal? - indignou-se ele, choroso. - E eu pensava que tinhas fugido com aquela moça que tanto falavas.
- A Rosa - esclareci.
- Julguei-te mal. Perdoa-me, filho!
- Não chores, pai, não chores - pedi eu, carecidamente.
Não sei quanto tempo tivemos abraçados, porque eu mais do que ele, precisava daquele abraço. Ele não sentiu falta do meu abraço, porque esteve a dormir por oitenta anos, sem dar conta do tempo passar e sem envelhecer. Que bom era o seu abraço!
- Não chores, Filipe - disse o meu pai, separando-se de mim e enxugando-me as lágrimas com os seus dedos.
Fiquei surpreendido, mais uma vez, por não dar conta de que estava a chorar.
- Essa bruxa vai arrepender-se do que te fez, Filipe - disse o meu pai, com ódio.
- Não, pai. Não faças nada. Primeiro, temos que falar. Prometes-me? Por favor...
- Prometo - disse ele, ao fim de algum tempo, secando agora as suas próprias lágrimas com a manga do seu gibão. - É fascinante!
- O quê? - perguntei, confuso.
- És idêntico ao teu avô. Se calhar, em menino também eras, mas como não conheci o meu pai nessa idade não me podia aperceber.
Sorri.
- Eu gostava de ter conhecido o avô.
Perdi o meu avô quando tinha um ano. Não tenho nenhuma lembrança dele, infelizmente.
- Filipe... - ele estava apreensivo.
- Sim? - encorajei-o.
- Quantos anos tens? Eu sei que tens dezoito, mas a tua aparência é de quantos anos?
Como estavas tão enganado, pai. Engoli em seco. Era melhor dar-lhe tempo para digerir tantas informações.
- Falamos disso, mais tarde. Eu preciso sentar-me, descansar as pernas.
- Vêm sentar-te ao meu lado, filho - disse ele, com um tom de voz preocupado, apontando para o trono da minha mãe .
A minha madrinha que preferiu manter-se em silêncio enfeitiçou a bengala para se erguer e eu segurei-a com firmeza. Caminhamos lado a lado, mas o meu pai abrandou o passo para me puder acompanhar. Quando me sentei no trono da minha mãe, senti-me finalmente em casa. Inúmeras vezes me sentei naquele trono quando o meu pai se encontrava sozinho naquele salão e tivemos ali longas conversas. Havia coisas que nem o tempo podia mudar! Suspirei de alívio, porque sentia-me leve e as dores nas pernas aliviaram.
Continua...
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Caros leitores, estamos próximos da história dar uma reviravolta. Espero que estejam a gostar.
E agora como os pais de Filipe irão reagir e que irão fazer?
Um abraço ❤