042

653 56 1
                                    

LYDIA

-Não vou te deixar sozinho nesses poucos minutos. –Brinquei e obtive como resposta um sorriso descontraído. –Ah, mas olhe só... Ele sabe sorrir! –Completei ao rir de minha própria frase.

-Você está muito cansada?

-Por que? –Questionei ao inclinar minha cabeça para o lado.

-Pensei em te levar para um ponto turístico da cidade... –Falou ao lançar-me um olhar “agitado”, como se esperasse uma resposta positiva.

-Ponto turístico? –Repeti. –Nesse horário? –Falei receosa.

-Não vou te sequestrar, Holt... –Zombou.

-Certo, vamos então. –Suspirei ao acomodar-me no banco ao tatear minha mão em busca do cinto.

Jason fez um percurso razoavelmente rápido, mesmo com os faróis do carro iluminando boa parte do caminho, eu não fazia idéia de onde estávamos ou pra onde iríamos, estava confiando naquele “quase estranho” que não dirigiu sequer uma palavra durante todo o caminho. Pela movimentação do carro e os pequenos barulhos deduzi que estávamos numa estrada de terra, curvei meu corpo para frente e forcei minha vista confirmando minhas suspeitas.

-Que lugar é esse, Jason? –Questionei inquieta. Ao fundo conseguia ouvir um barulho de água caindo e antes que eu pudesse questioná-lo novamente, ele aumentou as luzes e pude ver mais a frente uma pequena nascente, um pequeno paraíso. –Que lugar lindo... –Murmurei maravilhada ao destravar as portas.

-Nunca esteve em um lugar assim? –Jason parecia estar se divertindo daquele meu estado digno de uma criança que acabará de adentrar numa loja de doces. Já havia visitado inúmeros países, praias, piscinas naturais e outros inúmeros lugares que eram o sonho de viagem para muitas pessoas, mas aquilo... Aquela simplicidade, aquele lugar tão rústico e com um cheiro de terra molhada revigoravam totalmente minhas forças e faziam eu entender novamente a razão de deixar todo aquela vida monótona para trás.

-Não... –Respondi ao desembarcar do carro, fui para frente do mesmo e escorei meu corpo ali ao cruzar meus braços.

Fiquei alguns minutos apenas sentindo a brisa fresca que tal lugar proporcionava, logo a melodia da banda Creed ecoou no local dividindo espaço com os animais de vida noturna, tal musica atingiu-me de maneira nostálgica ao lembrar de Jonah, ele amava aquela banda. Não demorou muito para que aquela cena juntar-se com as lembranças melancólicas da minha família e logo senti minha garganta fechar e meus olhos marejarem.

-O que houve, Aretha? –Jason perguntou-me num tom preocupado ao sentar-se ao meu lado.

-Meu ir... –Travei de imediato ao começar a proferir aquelas palavras. –É, lembrei de um amigo que gostava dessa banda e bom... Senti saudades. –Comentei ao forçar um sorriso triste enquanto limpava algumas lágrimas que caiam.

-Amigo? –Ele me encarou.

-Sim, o melhor amigo que tive a honra de possuir. –Sorri ao lembrar do rosto de Jonah.

-O que houve com ele?

-Perdemos o contato. –Respondi prontamente.

-E não consegue retomar? Tenho certeza de que ele ficaria feliz.

-Não é tão simples assim, Jason. –Olhei para as águas que se moviam por conta dos pequenos peixes que ali existiam, a luz da lua iluminava boa parte da nascente fazendo com que aquela vista se tornasse quase uma obra prima.

-Devo imaginar que seja tudo muito complexo pra você, vejo que sente grande incomodo ao tocar nesse assunto.

-O termo “família” em si já é uma grande incógnita para qualquer pessoa. –Respondi e ele assentiu.

-Minha mãe vivia dizendo que cada um possui um inferno particular na mente. –Jason me olhou. –Você só tem que saber exorcizar seus demônios. –Ele sorriu de maneira sádica, tal gesto não me soou como algo ruim, foi como um conselho meio “torto”, Jason claramente não seria do tipo de homem que tocaria em meu ombro e falaria que tudo ficaria bem, pelo o pouco que conheci dele, sabia exatamente o quão esquivo ele era.

-Acontece que eu nunca soube como fazer. –Suspirei. –Sempre fui muito fraca, sabe? –Falei ao abaixar minha cabeça. –Acho que no fundo eu sempre... Sempre... Eu estou acostumada a sempre ser salva, consegue entender? Nunca me preocupei com nada além de mim, creio que sou muito... –Ele me interrompeu.

- Narcisista? –Indagou e eu ergui a cabeça para encará-lo.

-É, acho que essa é a palavra. Quando a situação aperta para o meu lado, eu meio que me retraio.

-Você não está errada por pensar em você, Holt. –Falou ao me encarar de maneira fixa. –Você não tem que se prender a família, bens ou o que for.

-Na maioria das vezes eu me sinto uma grande egoísta. –Passei a mão em minha face num movimento agitado, falar naquilo sempre seria descômodo, as lembranças pareciam fazer parte de mim desde que abandonei minha antiga vida, era como viver na presença de um fantasma recorrente.

Declínio Where stories live. Discover now