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LYDIA

-Acho que agora você já pode contar o que aconteceu, certo? -Jonah falou ao aproximar-se mais de mim.

Eu não tinha coragem de encará-lo naquele momento, estava constrangida e com receio de sua reação. Pensei que aquele momento jamais chegaria, que nunca teríamos essa conversa, quando fui embora e deixei tudo para trás, pensei que iria enterrar todo o meu passado e pessoas que faziam parte dele... Mas obviamente os cosmos não ficariam ao meu favor e o acaso acabará de cair por terra.

-Eu... Eu... -Balbuciei enquanto sentia minha vista embaçar por conta das lágrimas que se formavam. -Eu realmente queria dar uma resposta que fosse do seu agrado, Jonah... Mas eu não posso, não consigo e... E não quero. -Ergui a cabeça e o encontrei me encarando com aquele olhar que tanto se assemelhava aos de minha mãe quando estavam impassíveis.

-Nunca houve sequestro? -Ele questionou mantendo um tom de voz controlado, no entanto, era perceptível o quão decepcionado e raivoso Jonah estava naquele momento.

-Nunca. -Falei ao passar a manga do moletom em meu rosto. -Eu planejei tudo. -Novamente abaixei minha cabeça. Minha dignidade estava no chão e não possuía quaisquer resquício de honra em meu tom de voz e postura.

-Que inferno, Lydia! -Jonah blasfemou ao bater fortemente na mesa. -Qual é o seu problema? -Continuou. -Você tem idéia do inferno que nos fez passar? Você ao menos pensou em como ficaríamos? -Jonah passou as mãos em sua nuca enquanto praguejava inúmeras ofensas que na maioria das vezes eram direcionadas a mim. Fiquei em silêncio o tempo todo, não estava com razão e nem mesmo com forças para debater ou me defender, então apenas fiz o que sempre fui ensinada: fica em silêncio e abaixar a cabeça. -Você não vai falar nada? -Indagou ao empurrar o bolo recém comprado.

Minhas mãos apertavam constantemente a barra do meu agasalho num gesto de ansiedade. Eu possuía tantas coisas presas em minha garganta, foram dezenove anos absorvendo tudo, concordando e sorrindo.

Ele continuava afirmando que eu havia me tornado uma pessoa egocêntrica e imprudente.

Egoísta? Não. Eu nunca fui egoísta. Naquele momento eu pude perceber que não fui egoísta ao pensar em mim pela primeira vez. Não foi correto os "meios" que utilizei para escapar da minha realidade, mas... Foi a única saída para o meu tormento.

-Eu não sou uma pessoa ruim, Jonah. -Falei tentando controlar as lágrimas que insistiam em descer. Jonah parecia implacável, não havia compreensão em sua postura naquele momento, posso até afirmar que se fosse possível ele me arrastaria pra casa enquanto continua com o discurso do quanto fui "egoísta e irresponsável".

-Eu discordo. Você sempre possuiu e usufruiu das melhores coisas. 

Discordava? Desde quando ele poderia discordar com o que eu achava de mim? Meu Deus! Até quando eu teria que suportar tudo aquilo?

-Eu sempre coloquei a felicidade de todos os outros antes da minha própria felicidade. Não cursei faculdade pois fui aconselhada de que não seria relevante para aquela fase da minha vida, não era o momento. Não viajei na minha formatura de conclusão do ensino médio porque segundo os pais de Andrew, não seria uma postura muito apropriada para uma mulher que se casaria no ano seguinte e precisava continuar com a atenção unicamente nos preparativos  da cerimônia. -Meus punhos estavam fechados e pela primeira vez desde o início de nossa conversa... O único sentimento que existia em meu coração era a raiva. -Mesmo estando com o peso considerado ideal para o meu porte físico fui induzida a fazer uma dieta totalmente restritiva... E por qual razão? Bom, o vestido ficaria melhor e isso deixaria o Andrew mais contente e interessado. E o que eu fiz, Jonah? Retruquei? Neguei? Não! Eu apenas concordei e deixei de comer as coisas que eu mais gostava nos últimos seis meses. -Cuspi cada palavra com verdadeiro asco enquanto as cenas passavam em minha mente como um filme de terror. -Então não me venha dizer que fui ou sou egoísta... Aguentei tanto por todos esses anos que... Que eu não pude mais suportar. -Completei ao levar uma das minhas mãos até o meu  peito ao sentir um grande aperto no mesmo, as palavras saiam com verdadeiro amargor e ressentimento.

O olhar de Jonah havia mudado por completo assim como sua postura. Os ombros caídos e olhar vazio denunciavam o quanto minhas palavras o desarmaram.

-Lydia... -Jonah murmurou extasiado.

-Eu sempre amei demais. Amei demais os nossos pais, nossos avós, Andrew, Andrea e você, Jonah. Amei todos vocês. Amei muito e de maneira tão intensa e cega que não sobrou amor pra mim. -Balbucei. -Eu não consegui amar a mim mesma.

Declínio Where stories live. Discover now