72 | Dreams.

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Adam e minha mãe ouviam as palavras atentas da ortopedista. Eu não consegui ouvir mais nada depois de:

- Sua lesão não se curou tão bem, Nina. Você não poderá mais dançar balé. Não na ponta. - Disse.

Tudo o que veio depois saiu como um ruído alto e incômodo. Meus ouvidos não alcançavam nenhum palavra de nenhum deles. Minha mãe estava vermelha, irritadiça e ansiosa. Adam, esperançoso. Eu não prestava atenção, mas sabia. Olhava para o seu rosto expressivo enquanto sua mão apertava forte a minha. Ele não acreditava em uma palavra dita pela médica. Nenhum dos dois.

- Mas você pode encontrar outra dança, Nina. Só não pode usar as pontas. - Ela disse segurando a minha mão.

Só ouvi porque a doutora encostou em mim.

- Tudo bem. - Assenti.

Queria chorar, mas não chorei. Permaneci em silêncio esperando a consulta terminar para irmos embora.
Quando saímos, mamãe estava nervosa e com raiva. Tinha certeza de que ela queria chorar mais do que eu.
Tori e Adam se encararam e depois olharam para mim em busca de qualquer vestígio de que eu eu fosse enlouquecer ali mesmo. Continuei sem dizer nada, como sempre. Não havia muito o que dizer ou o que fazer. Estava feito. O décimo sexto fouetté que dei naquele dia, em Londres, foi a minha hamartia... causada por mim mesma. Eu teria que lidar com a culpa se alastrando por todos os cantos do meu corpo. Só não queria lidar com ela naquele momento.

- Você pode ir trabalhar, mãe. - Murmurei. - Sei que está pensando em ir para casa, mas eu estou bem.

- Não acho uma boa ideia te deixar sozinha, querida.

- Não estou sozinha. Estou com Adam e a Margot deve estar nos esperando com um banquete.

- Eu... - Arquejava. Interrompi-a.

- Não vou me sentir melhor com você acumulando trabalho por minha causa e depois tendo que se virar para conseguir resolver as coisas a tempo. Eu vou ficar bem.

- Jura? - Segurou minhas mãos.

- Juro. - Anuí.

Abracei-a forte e a vi entrar no seu carro, com o qual viemos. Mamãe estava de coração partido, tanto quanto eu. Pior do que ver seus sonhos serem arrancados de você, é ver os sonhos da sua filha serem arrancados dela. Minha mãe nunca se acostumaria a não poder fazer nada todas as vezes que me visse ter que lidar com a dureza da vida. Era difícil para mim, porém, certamente, mais para ela. Por isso a necessidade incessante de fazê-la sentir melhor... Achar que eu estava bem mesmo que quisesse gritar até perder a voz.

- Eu vou chamar um táxi. - Disse Adam.

- Nós podemos voltar andando? - Puxei sua mão.

- Sim, claro.

De mãos dadas, caminhamos da cidade até onde alcançamos a estrada que nos levaria para casa. Adam tentava arrancar palavras de mim. As vezes eu pensava que Adam tinha medo de que, se eu me calasse por muito tempo, não voltaria mais a falar. Perderia a voz na garganta e não conseguiria reencontrá-la.

- Você não precisa tentar me fazer ficar confortável. Não há nada que possa me fazer sentir melhor agora. - Balbuciei.

- Eu... desculpa. - Desviou o olhar.

O cabelo de cachinhos castanhos estava bagunçado por ele ter passado a mão mais vezes que eu consegui contar, nervoso. Usava uma jaqueta jeans, blusa cinza e calça também jeans. Não me acostumava com o quão bonito ele era e nem em como olhar para ele me fazia sentir minimamente melhor.

- Não tem pelo o que se desculpar, Adam. - Ergui nossas mãos para beijar a dele.

- Eu sinto muito, Nina.

O Silêncio Entre Nós Onde as histórias ganham vida. Descobre agora