[07] Margot.

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Caminho calmamente até o carro de Margot estacionado de frente para o colégio.
Adam acena para mim enquanto fala com Natalie, sua namorada que não gosta mesmo de mim, só finge porque quer fazer caridade e porque quer que Adam se sinta melhor com ela fazendo caridade. Eu não faço nada sobre seu aceno, senão adentrar ao carro o mais rápido que posso.
Margot guardou minha bicicleta na parte de trás do grande veículo como o habitual. Anna disse que não iria conosco, pois seu pai, Jack, a buscaria para irem visitar sua avó.

Margot é a minha cuidadora. Por todo o país, um pessoal aprende a cuidar de pessoas como eu, que não podem fazer as coisas sozinhas. Minha fobia social piorou muito depois de meu pai morrer, ao ponto de eu não ser capaz falar com as pessoas. No início, sair de casa parecia o fim do mundo. Com o passar do tempo, foi se tornando menos complicado, entretanto, a questão da fala nunca melhorou. Eu não consigo falar; as palavras emperram na minha garganta como se algo as grudasse ali. Como se houvesse uma barreira entre minha voz e o mundo. Eu tenho ciência que isso é puramente psicológico, mas meu tratamento terapêutico de cinco anos com a dra. Emma James — mãe da minha melhor amiga, mas minha psicóloga antes de Anna ser minha amiga — só facilitou que eu falasse com a minha mãe, com Margot e com Anna. As vezes, até me comunicar com a própria dra. James é complicado e tenebroso.

Margot sempre participava das minhas aulas particulares antes de eu começar a frequentar a escola e agora me busca por não morar tão longe daqui. Ela me leva à psicóloga e às aulas de ballet porque eu tenho pavor em chegar perto do volante de um carro. Sou arrastada pela onda de memórias de meu pai adentrando ao seu carro no dia de sua morte. E nunca mais voltando.
O principal dever de Margot é garantir que eu esteja fisicamente bem, pois ela não pode fazer muito pelo meu psicológico, senão ter certeza de que estou tomando meus remédios para depressão e ansiedade. Todos os dias, antes do almoço, ela verifica meu peso — a depressão me fez emagrecer muito e não querer comer absolutamente nada — para se assegurar de que não estou emagrecendo de maneira não-saudável. Ela também avalia meu corpo para ver se, bem, se não há nenhuma nova marca de automutilação, como eu fazia no passado. Margot cuida bem de mim.

Eu falo normalmente sem interrupções, com apenas quatro pessoas: minha mãe, Margot, dra. James -— Na verdade, com ela ainda há interrupções — e Anna. Ultimamente, as palavras têm fluído mais naturalmente com Cody, o que é incrível, porque ele é uma pessoa muito legal e inteligente. Além do mais, leu todos os clássicos mais clássicos do mundo, então seria bom ter alguém para falar sobre como as Irmãs Brontë eram genial. Contudo, trocar duas palavras com seu sobrinho, algo que não entendi ao certo, foi uma novidade inesperada. Eu sabia que Cody tinha um sobrinho, mas não imaginava nada como Adam é. Não imaginava um rosto estruturado, olhos castanhos profundos, um sorriso gentil, um corpo extremamente atraente e a incessante vontade de conversar comigo mesmo sabendo que eu não posso — e não quero. Eu esperava um garoto qualquer de dezessete anos, mas considerando a beleza incontestável do meu padrasto, devia ter passado pela minha cabeça que alguém do seu sangue não seria nada perto de ter uma má aparência. A aparência de Adam é bonita e ele é um ótimo jogador de futebol do time da escola, o que devia garantir que ele fosse mesquinho e arrogante, não alguém altruísta. Talvez ele só esteja interessado em fazer caridade como a namorada. Para ser sincera, não acredito muito nisso.

Olho para Margot. Ela tem olhos claros, cabelos escuros e ondulados, é magra, alta e tem uma filha de dez anos, a Abby. Ela nunca me disse a sua idade, mas acredito que não tenha mais que vinte e oito, visto que me contou que foi mãe nova, durante o colégio, ainda. Longa história para outra hora.

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