26 | Flowers and poems.

6.1K 711 93
                                    

Bato na porta de madeira três vezes e logo ela é aberta. Nina aparece de shorts pretos, moletom da escola, as meias coloridas e de óculos. Lhe caem bem, aliás. Óculos deixam as pessoas com um ar mais intelectual, mas a deixa mais fofa (e intelectual e bonita).
 
 
"Flores amarelas." Sorrio, puxando o pequeno buquê de umas flores amarelas que não sei seus nomes, mas são lindas. "Suas favoritas."
 
 
Seus olhos verdes brilham à meia luz do corredor e do abajur do seu quarto. Nina abre um sorriso e passa as mãos pelos seus cabelos negros.
 
 
"Eu não sei se esse tipo de flor, em si, são as suas favoritas, mas são amarelas." Entrego-a. "E são muito cheirosas."

Nina assente e cheira as flores, ainda sorrindo. Ela tem um sorriso muito, muito bonito.

"O Chris me contou que vocês vão sair." Balanço a cabeça. "Gosta dele?"

"Não." Ela ri com ironia.

"Olha, eu queria dizer que ele é legal e não vai fazer nada com você, se você não quiser. E eu e a Natalie vamos com vocês." Sorrio. "Posso entrar?" Arqueio as sobrancelhas.
 
 
Nina hesita. Olha para as meias, olha para as flores, olha para mim. Ela assente. Nina assente. Como assim? Ela vai me deixar entrar? Entrar no seu quarto? De primeira?

Assinto de olhos arregalados e adentro ao espaço. Ela acende a luz e põe as flores em um jarro que aparenta ser novo, sobre o criado mudo ao lado da sua cama, após retirar o papel que a rondava.
 
 
"Você toca algum instrumento?" Indago.

"Meu.... pai. Ensinou a-a... piano." Ela murmura, sentando-se na cama de pernas esticadas.

"E por que vocês não têm um?" Arqueio as sobrancelhas.

"Temos." Nina bate no espaço ao seu lado quando encosta suas costas na parede. Sento-me ao seu lado, da mesma forma que ela está.

"Onde? Na sua sala escondida?" Brinco e ela ri.

"Torre." Ela dá os ombros.

"É o nome? "A Torre"?"

"Torre." Ela afirma.

"Ok, só "Torre"." Rio. "Quer começar aquele trabalho que a Emery passou?"

"É." Ela balança a cabeça e fica de joelhos na cama para pegar seu notebook na ponta.
 
 
Reparo na forma como seu cabelo negro para um lado só, deixando seu rosto mais bonito limitadamente iluminado pela luz fraca das lampadas. Ela põe os óculos na sua cabeça, deixando a mesma luz sobressair seus olhos verdes. Nina abre o notebook e digita a senha. E eu sei que não devia reparar tanto nela, mas ela tem um corpo muito bonito, fora do estereótipo mundial. Eu posso ver algumas linhas de cicatrizes sobre as suas coxas e as celulites espalhadas pela mesma. O moletom sobe um pouco, deixando parte da sua barriga à mostra. Ela digita algumas coisa no google, volta a se sentar ao meu lado com o mesmo em seu colo. Então, Nina digita "There's a Blue Bird In My Heart.", poema escrito por Charles Bukowski, põe o notebook na cama e se inclina novamente para abrir a gaveta do criado mudo, de ondr ela retira um caderno moleskine de capa verde água com flores brancas e dois lápis.
 
 
"Vou ler, ok?" Digo e ela assente.
 
 
Há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas sou duro demais com ele
eu digo, fique aí, não deixarei
que ninguém o veja.

há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas eu despejo uísque sobre ele e inalo
fumaça de cigarro
e as putas e os atendentes dos bares
e das mercearias
nunca saberão que
ele está
lá dentro.

há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo,
fique aí, quer acabar
comigo?
quer foder com minha
escrita?
quer arruinar a venda dos meus livros na
Europa?
há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas sou bastante esperto, deixo que ele saia
somente em algumas noites
quando todos estão dormindo.
eu digo, sei que você está aí,
então não fique
triste.

depois o coloco de volta em seu lugar,
mas ele ainda canta um pouquinho
lá dentro, não deixo que morra
completamente
e nós dormimos juntos
assim
com nosso pacto secreto
e isto é bom o suficiente para
fazer um homem
chorar, mas eu não
choro, e
você?
 
 
"Esse poema é incrível, Nina." Arregalo os olhos. Ela sorri e assente. "Meu Deus."
  
 
Então ela escreve e escreve e escreve. E quando estou lendo o quinto poema, noto que Nina já está a dormir com a cabeça em meu ombro. Sorrio e respiro fundo. Mas depois de passar quase uma hora assim, a deito na cama, retiro o caderno, os lápis e o notebook para que ela não chute nada. Cubro-a e beijo a sua testa antes de apagar a luz e sair do seu quarto.
 
 
"Ei, Adam." Ouço a voz feminina de Victória sussurrar. "Como ela está?"

"Ela dormiu. Estávamos fazendo um dever de literatura." Balanço a cabeça.

"Pode colocar música? Sem música, ela tem pesadelos." Ela põe o cabelo atrás da orelha.

"Posso, claro." Afirmo. "Tori, por que as melhores e mais bonitas pessoas se escondem?"

"Por terem medo de não serem isso. Elas nem sabem que são. Acontece que elas sempre são." Ela suspira.

"E tem como mostrá-las que são mais?"

"Tem. Eu nunca consegui, mas não significa que você não vá." Ela dá os ombros.

"Eu aprendi sobre o que ela passa, Tori. É horrível. É pior que só ficar triste. Não minimizando o 'estar triste', mas, Deus." Balanço a cabeça.

"Tive a mesma reação. É horrível, para uma mãe, ver a sua filha assim. Não posso mudar, só amá-la." Ela afaga meu ombro. "Queria a minha menina alegre de volta."
 
 
"É comum sentir falta de algo que nunca teve?"
 
 
"Não. Não mesmo." Ela sorri. "Boa noite, querido. Durma bem." Ela se aproxima para beijar minha testa. "E obrigada."
 
 
"Também agradeço."

O Silêncio Entre Nós Onde as histórias ganham vida. Descobre agora