—- Como as aulas ocorreram? -— Ela sorri, ligando o carro assim que ponho o cinto de segurança

— Boas. — Minto.

Sair da sua zona de conforto com professores particulares e começar o segundo ano em uma escola onde tudo é grande demais e você não é capaz de responder a pergunta de um professor faz com que as pessoas te achem esquisita. E foi exatamente isso que eu ouvi hoje: que sou esquisita.

— Hoje você tinha história, física, matemática e mais alguma coisa, certo? Como pode ter sido bom? O que aprendeu? — Ela sorri.

— Que a segunda guerra foi trivialmente sangrenta, que Newton não tinha muito o que fazer e algumas fórmulas que não me lembro bem. Ah, e sobre filosofia e ciências sociais. — Dou os ombros.

Respondo para que Margot não se sinta ignorada, mas não aprendi nada disso hoje. Não faço ideia do que foi dito nas aulas.

— Oh, isso é muito bom. — Ela ri. — Você conheceu o sobrinho do Cody?

— Sim. E Adam é legal. — Dou os ombros mais uma vez.

— Você falou com ele? — Ela se anima.

— Duas palavras ontem.

— Quais? — Ela se anima. — Isso é um progresso, Nina. Estou orgulhosa, querida. — Ela afaga minha perna coberta por uma meia-calça preta.

— "Água" e "obrigada". — Reviro os olhos. — E alguns "ok", hoje.


— Bem, já é um começo. — Margot abre um sorriso ameno. — Não se banalize assim, meu amor.

— Como a Abby está? — Tento mudar de assunto.

— Ela está bem melhor. Foi só uma febre. Hoje ela irá dormir na casa de uma amiga. — Ela sorri. — É bom vê-la conseguir se soltar na escola nova.

— Fico feliz que ela esteja bem. — Sorrio.

Não dura muito, a mudança de assunto. Logo, Margo já está voltando a Adam.

— Mas então, ele é seu amigo? Fez amizade com ele? — Ela indaga, extremamente intrigada.

— Não. Bem, ele é legal. Tentou falar comigo algumas vezes e me pediu um livro emprestado. — Pisco os olhos freneticamente.

— Você emprestou? — Ela arqueia as sobrancelhas em dúvida.

— Sim. — Suspiro e inclino-me para ligar o rádio. Sei que ela vai falar algo sobre isso de emprestar um livro.

— Sério? Você não empresta livros nem para mim. — Ela abre um sorriso de lado.

— Desculpe se sou cautelosa com os meus bebês.

— Ah, tudo bem. — Ela sorri. — Mas isso é bem legal, Nina. É uma chance de arrumar um amigo. Você fez novos no colégio?

— Só tenho a Anna, mesmo. — Dou os ombros.

— Ah, Anna James! Aquela menina é demais. Uma ótima amiga para você. Ela já foi babá da Abby algumas vezes.

— Sim, ela é bem legal. Gosto dela.

— Mas, sabe, o Adam fala com você na escola? — Ela finalmente para o carro quando chegamos em casa.

Por que insistir nesse assunto?

— Ele falou comigo hoje para perguntar se eu estava bem e se havia alguém implicando comigo. Minha mãe deve ter dado minha ficha para ele e dito para me vigiar. — Saio do carro.

— Ah, não pense assim da sua mãe. Ela pode ter pedido ou ele só é uma boa pessoa. — Ela bate a porta do carro.

— Você sabe que ela pediu. — Reviro os olhos.

Margot e Tori são muito amigas. Talvez Margot conheça minha mãe melhor que eu, então é certo que minha mãe está sempre agindo a meu favor, independentemente de como.

— Ok, eu sei, mas não faz diferença. Ele deve ser legal e fazer isso por pura humanidade. — Ela tenta me convencer, mas não caio nessa.

— Sim, ele é claramente um humano. Mas não há um porquê para tal gentileza comigo. As pessoas não são gentis.  — Entro em casa. — Não com Nina Davis.

— Eu odeio quando você diz esse tipo de coisa. As pessoas são muito gentis, mas não são todas quem são. Se você tanto deseja achar pessoas gentis, seja uma e encontre a si mesma. — Ela mexe em meu cabelo carinhosamente.

Margot é a minha segunda mãe. Cuida de mim com tanta gentileza e cautela, que eu chego a endeusá-la. Sou grata por ela ser quem é, até quando fala desses assuntos tediosos.

— O que iremos comer hoje? — Ignoro seu sermão motivacional.

— Eu pensei em fazer o habitual. Macarrão. Hoje eu estou com preguiça de cozinhar. — Margot ri. — Quer algo novo que não dê muito trabalho?

— Não, está bom. Eu vou para o meu quarto, tudo bem?

— Não, fique aí. — Ela pede sorrindo.

— Eu tenho dever de casa para fazer. —  Dou uma desculpa.

— Ok. — Seu sorriso desaparece. — Eu vou subir para fazer a checagem em breve, ok? Descanse.

Margot caminha até mim e beija minha testa, me fitando calmamente. Ela age como se fosse minha mãe e isso é bom, porque ela é tipo isso para mim.
Eu me sinto péssima por lhe dar desculpas, mas no dia de hoje, já estive fora da minha zona de conforto o suficiente. Tudo o que necessito de mais desesperador e me esconder debaixo das cobertas e não sair de lá até que o mundo exploda — ou até que eu tenha aula de novo, infelizmente.
A depressão é sorrateira, silenciosa. Ela te faz sempre voltar à falsa sensação de conforto que é se trancar entre as paredes de um quarto escuro, com luzes apagadas e cortinas grossas e pesadas mantendo a luz do dia do lado de fora. Ela te faz sentir dependente disso; dependente da solidão.

Subo as escadas e vou até me quarto, ao lado do quarto de Adam. Nem sequer troco de roupa, apenas fecho as cortinas que minha mãe abre toda manhã quando saio de casa e me enfio entre os lençóis da minha cama. Não há dever de casa, não há ninguém para ligar e não há livro que me interesse agora. O que é o sentimento de que eu preciso estar aqui e que o mundo lá fora é ruim. Que sair é ter de encarar isso. Eu não quero encarar isso.

O Silêncio Entre Nós Where stories live. Discover now