Capítulo 32

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Domingo de manhã, mal acordo e o senhor Antônio me chama.

– Marcelo, quero que venha comigo, pegue a caminhonete, vamos ver o cafezal.

– Eu posso levar o senhor, seu Antônio – falou Ruben.

– Não, o Marcelo vem comigo.

– Olhei para ele e mostrei a língua.

Falou baixinho quando passou perto de mim. – Vai lá, sua coisinha, só se cuida, o velhote ai, gosta de bunda fresca.

– O quê? Chamou seu Antônio de velhote, e que gosta de bunda fresca?

– Idiota, falo baixo. E ele sai rindo da minha cara.

Seu Antônio entrou na caminhonete e saímos pelo campo.

– Suas terras são maravilhosas, seu Antônio.

– Espere para ver os cafezais, eles sim são lindos.

– O que foi, seu Antônio, o senhor não está bem?

– Só estou um pouco cansado, acho que é a idade.

Continuei conversando para distrai-lo um pouco, eu estava preocupada, não é normal estar cansado cedo assim, não são nem 9h.

– Tem filhos, seu Antônio?

– Tenho, falou triste.

– Nenhum mora com o senhor?

– Não, estão todos longe.

– O que fazem?

– Todos eles moram em outros estados, o filho mais velho mora fora do Brasil, o filho do meio morra na Bahia, o filho mais novo mora no Rio de Janeiro, só o mais velho vem me ver todos os meses, faz um mês e pouco que ele veio, trouxe um presente para mim, vou mostrar quando chegarmos em casa, para os outros dois filhos, eu não existo.

– Por que diz isso, senhor, acho que todos o amam do jeito deles, mas o amam.

– A filha, eu queria tanto ter meus filhos juntos, ter netos para encher essa fazenda de alegria, mas um não pode ter filhos, o outro é mulherengo, não sei como não tem filhos por aí, o mais novo, sabe como são os jovens, só querem se divertir, gazear aulas na faculdade, e beber.

– Logo, logo vou saber, seu Antônio, meus filhos estão crescendo. Seu Antônio, o senhor está bem? Peguei suas mãos. – O senhor está gelado; quer água? Entrego a ele a garrafa, bebe para se refrescar um pouco, vamos voltar pra casa, poderemos vir amanhã.

– Não, filha, quero mostrar o cafezal a você, amanhã não sei se posso vir, vai ver como estão lindos, devem estar brancos de flores.

Vai teimar. – Vamos lá, eu nunca vi de perto mesmo como é um pé de café.

– Verdade, vamos lá ver, filha. Chegamos ao cafezal. – Olha que beleza, parecem noivas vestidas de branco. Ele erguia as galhadas do pé de café. – Esse ano vai ser uma safra e tanto.

– É lindo mesmo, seu Antônio, estão brancos de flores.

– Cada flor é um grão de café, esse ano vai carregar bastante.

Seu Antônio explicava enquanto íamos caminhando para dentro da plantação de café, até ele parar.

– O que foi, não está bem, seu Antônio? Estava pálido, coloquei minha mão na testa dele estava gelado e suando. – Vamos voltar, seu Antônio, não seja teimoso, amanhã voltaremos aqui novamente ver o resto do cafezal, quer água, vou buscar na caminhonete, tem uma garrafa ainda lá, mal dou um passo e ele cai em cima de mim, sorte que não bateu a cabeça, mas eu machuquei meu braço, ele pesa como um elefante, consegui tirar seu corpo de cima do meu, achei que tinha sofrido um enfarto, porque já presenciei um. Assisti algumas vezes Discovery Channel, ensinam sobre primeiros socorros e sobrevivência, tentei reanimar, umas cinco vezes até os sinais vitais voltarem ao normal, agora leva-lo até a caminhonete sem machucá-lo, não será fácil, não vou conseguir carregar, então vou arrastando. Fiz tanta força, como o corpo fica mole parece que pesa o dobro, acho que o arrastei uns dois quilômetros pela demora de chegar, e colocar dentro do carro.

– Meu Deus, seu Antônio, o senhor parece um cavalo de grande, como vou colocar o senhor dentro do carro. Ajoelho no chão, olho para ele, não vou conseguir erguer o senhor, você pesa demais, vou ter que arrastar o senhor até aquele barranco, e encostar o carro, e colocá-lo na caçamba.

Sofri como uma mula, puxar esse homem para a caçamba da caminhonete não foi fácil, acho que demorei uma hora mais ou menos, poderia ter ido até a fazenda pedido socorro. Arrumei seu corpo na lateral da caçamba, e com um saco de areia que usam para fazer peso na traseira da caminhonete, coloquei no lado dele para escorar seu corpo, coloquei seu casaco embaixo da cabeça, e fui para a cidade, não sabia onde era o hospital, pedi informação cheguei rápido. Cheguei à portaria, avisei que estava com seu Antônio em cima da caminhonete e que tinha sofrido um enfarto. Levaram ele para a emergência. Meia hora depois me chamaram.

– A senhora é da família? – Perguntou o médico.

– Não, eu só trabalho para ele na fazenda, estávamos vendo os campos e os cafezais, vi que não estava bem, tentei leva-lo pra casa, mas é teimoso feito uma mula, quis continuar. Quando estávamos no meio do cafezal, ele desmaiou, reanimei, mas demorei muito para chegar, estávamos muito longe. – Tremendo muito, comecei chorar. – Como ele está, doutor?

– Bom, ele sofreu um enfarte, tem como avisar seus filhos, sou o médico da família. Ele está estável, mas vai ter que fazer uma cirurgia, me contaram que ele chegou na caçamba de uma caminhonete.

– Nem me fale, doutor, fiz tanta força para pegá-lo, olha como estou toda cheia de terra. Estou com as pernas e os braços em frangalhos, meu corpo dói todo.

– Isso é normal, depois de tanto esforço.

– Preciso tomar algo para me acalmar, foi um baita susto, achei que ele morreria.

– Graças a você, ele vai viver, agora avise a família, vai à recepção que a secretária liga para a fazenda, depois eu mando uma enfermeira medicar você.

– Obrigada doutor, posso ficar aqui até ele sair da cirurgia?

– Pode, mas vai demorar, acho melhor você ir para casa tomar um bom banho.

– Ele não tem ninguém para ficar aqui, seus filhos moram todos fora, tenho pena em deixá-lo aqui sozinho.

– Eu sei, ligue para a fazenda que Ilda avisa os filhos.

Há Quanto Tempo Esperava Encontrar Alguém AssimOnde as histórias ganham vida. Descobre agora