35 - Um Conto Chinês

23 1 1
                                    

A grama verde-brilhante dos picos de Rozan estava especialmente bonita naquele tempo, as árvores retorcidas em seus troncos com lindas armações de folhas. As quedas de água poderosas e espalhadas pelos rios livres de neblina naquela estação do ano. Uma fumaça seresteira escapando de uma pequena chaminé de uma pagoda erguida no meio de um pico distante.

E dentro dela a mais profunda escuridão.

As cores vibrantes dos ligustros e áceres vermelhos ao redor perdiam-se na soleira de uma porta de correr. A porta correu e dela saiu um velho muito enrugado, caminhando em dificuldades com a ajuda de uma bengala; sua barba quase tocando-lhe os joelhos era praticamente a única coisa que se via debaixo de um enorme chapelão de bambu.

A casa perdia ainda mais cor quando o velho a deixava. Na cozinha, trabalhava feliz uma menina, cuja voz era ainda a única cor que uma pessoa muito enferma poderia apreciar, afundada em seu poço perdido.

Ouvia, noite após noite, a voz de seus amigos lhe chamarem; suas mãos vacilarem tateando o vazio, tropeçando em seus erros e angústias para quase sempre acordar sobressaltada de um pesadelo. Ofegante. Triste.

— Shiryu. — falou a voz. — Teve outro pesadelo?

Era Shunrei, a única cor que ainda via.

Não respondeu, pois sabia que Shunrei ficava sempre preocupada com suas noites mal dormidas.

— Preciso trocar seus curativos.

Dentro de si, Shiryu se sentia muito mal por ela, pois desde que voltara para casa, Shunrei, muito comovida, buscou conhecimento em regiões vizinhas; lia dia após dia guias e antiguidades em busca de qualquer coisa que pudesse ajudá-la. E nenhuma diferença fazia.

E lá estava ela acordando para mais um dia. Shiryu colocou as mãos na nuca e desamarrou as faixas cuidadosamente colocadas por Shunrei.

— Sente-se melhor? — perguntou ela.

— Sim. Muito obrigada.

Tinha os olhos ainda, diferente da bodisatva da Compaixão em sua história contada para Saori; mas os olhos que tinha, se não podiam enxergar nada, certamente lhe causavam muito desconforto, pois eram ainda muito sensíveis depois do procedimento cirúrgico. Sentia sempre muita dor.

No fundo, ela sabia que Shunrei buscava um jeito de fazê-la enxergar novamente. Não era apenas aliviar a sua dor que ela buscava, mas devolver-lhe todas as cores.

As dores ela conseguia realmente resolver e por isso Shiryu era muito grata.

Ainda que nada pudesse ver, Shiryu não sabia explicar, mas tinha certeza de que, ao saber que seus curativos e ervas haviam funcionado, Shunrei sorria. Como se o ar se movesse de forma quase imperceptível quando a garota estava animada.

— Hoje eu vou até o pequeno lago de Luhua. — falou ela. — Dizem que crescem ali ervas que podem te ajudar.

— Shunrei... — começou Shiryu. — Sou muito grata a você. Mas...

— Não comece novamente, Shiryu. — disse a amiga, comovida.

— Nem o Mestre Ancião sabe como seria possível curar meus olhos. Você também sabe disso.

Ela ouviu como a respiração de Shunrei vacilou. A tábua de madeira rangeu, e Shiryu sabia que isso acontecia sempre que a amiga entrava e saía de seu quarto; não saiu rápida, colérica, mas calmamente, encolhida. Voltou, aí sim mais firme.

— Não desista! — falou ela. — A Xiaoling e os outros devem estar esperando boas notícias suas.

Shiryu lembrou-se de Xiaoling, que a havia trazido até sua casa; a viagem toda contando bobagem, a fazendo rir, puxando sua mão no trânsito e, em último momento, também explicando com muita dor o que havia se passado com ela para o Mestre e Shunrei.

Os Cavaleiros do Zodíaco: A Lenda de SeiyaWaar verhalen tot leven komen. Ontdek het nu