Capítulo 93- Uma longa noite

Start from the beginning
                                    

- Por favor não chora. Não estou indo muito longe. O hotel que escolhi fica bem perto daqui. Eu prometo que venho vê-la todos os dias de manhã, pois vou querer saber como você está fisicamente, e também vou querer ter notícias dos nossos bebês.-
Anne assentiu, pois não havia mais nada que pudesse dizer para fazer Gilbert ficar. Ele parecia decidido, e ela não iria ficar no caminho dele. Mas, dentro dela, uma voz gritava em seu ouvido as palavras: " Diga a ele que precisa dele" Diga antes que seja tarde".

Gilbert pegou a mala, sorriu para ela antes de dizer:

- Fique bem e cuide dos bebês.- a voz continuava gritando dentro da cabeça dela como um disco riscado, mas, quando percebeu, Gilbert a estava beijando no rosto , e se encaminhando para a porta por onde saiu deixando Anne completamente sem chão.

Ela se encostou na porta, escorregando até o ladrilho frio onde abraçou sua barriga, e disse chorando baixinho:

- Eu perdi o papai de vocês.

Anne não queria acreditar que aquilo estava acontecendo. Era dor demais para o seu coração. Ela levantou a cabeça e olhou para o apartamento imenso, sentindo o silêncio pesar ao seu redor. Não havia mais o riso de Gilbert, suas brincadeiras bem humoradas, o café da manhã compartilhado, as doces alegrias daqueles abraços nos quais ela amava encostar sua cabeça e descansar. Aquele era o seu mundo, o único no qual era feliz. Anne comprara aquele apartamento por que queria construir sua família ali. Ela se lembrava do quanto Gilbert ficara bravo, porque ele pensar a que ela queria ficar longe dele, mesmo assim, ela o trouxera ali, pois tinha quase certeza de que no momento em que ele pusesse os pés dentro do apartamento, Gilbert se apaixonaria pelo lugar assim como ela.

E de fato aquele milagre acontecera, e ambos passaram a viver ali como um verdadeiro casal, e quando o casamento acontecera, aquele espaço gigantesco já era um lar, onde John e Sarah seriam recebidos e amados como os cristais lapidados da casa.

Anne acariciou-a barriga de novo, pois foi isso que lhe restou, seus dois filhinhos eram seu único ponto de apoio dentro de cada cômodo daquele apartamento que antes transpirava harmonia e amor, e agora somente uma tristeza vazia tomava conta das paredes brancas daquele castelo solitário. Anne se sentia como uma princesa consorte , sem seu príncipe , sem sua coroa, sem seu trono, dentro de um reino onde tudo fora perdido em uma guerra de sentimentos, onde o principal jogador desistira e jogara a toalha dando as costas a todos os sonhos a que construíram ali dentro.

Era lógico que não estava se isentando da culpa. Ela tinha muita responsabilidade na ida de Gilbert para um hotel, ao invés de ficar ali com ela, pois Anne o tratara como um mero conhecido por dias, mas, ela não pensou que ele a deixaria ali com seus filhos sozinha para cuidar de si mesma. Ele dissera que viria de manhã pra vê-la, mas, diante das circunstâncias, ela poderia confiar que ele realmente cumpriria sua promessa?

Anne se levantou do chão e foi para a cozinha, abraçando os próprios ombros, tentando não prestar atenção ao barulho dos próprios passos que ecoavam pelo apartamento, fazendo-a se lembrar que estava completamente sozinha. Ela precisava se alimentar, ou acabaria agravando seu quadro de anemia, mas, o pior era que o enjoo persistia, levando seu apetite todo embora, ainda assim tinha que insistir, não queria ficar doente, ou pior, prejudicar os seus bebês. Sem muito ânimo, ela abriu a geladeira para preparar a sopa nutritiva que precisava comer, e seus olhos arderam ao ver todos os potinhos prontos que ela teria apenas que esquentar no microondas. Gilbert deixara a refeição de quase uma semana pronta, e diante daquele cuidado dele, ela começou a chorar, e continuou vertendo suas lágrimas, até quando estava sentada na bancada consumindo cada alimento daquele dia.

Depois que terminou de comer, ela voltou para a sala, e ligou a televisão apenas para companhia, pois não tinha vontade de assistir nada, pensando desconsolada o que faria sozinha nos quinze dias de licença que o médico do estúdio lhe dera. Agora que Gilbert não estava ali, Anne não tinha muita coisa para fazer, e ter apenas o silêncio como seu companheiro, e ouvinte passivo, a faria enlouquecer em três tempos. Aquilo não era uma escolha, e sim uma necessidade, e precisava obedecer tanto a dieta que Gabriela lhe prescrevera quanto as ordens de repouso do outro médico, assim, sua vida recairia em um tédio que a deixaria deprimida com certeza.

Anne with an e- Corações em jogoWhere stories live. Discover now