A Ilha de Eudamón - II

36 1 0
                                    


Mar e Thiago estavam tentando controlar Rama, que tinha tanta emoção que não podia contar-lhes com clareza a noticia.

- Temos que conseguir o figurino. E também o som, porque o lugar o coloca, mas acho que nós vamos ter que levar nosso próprio som, porque nunca se sabe, e nós temos que soar bem.

- Rama... do que está falando? Não te entendemos nada!

- Falo de que o Chango nos conseguiu um show! A FM, a que toca nossa demo, quer a gente no show do final do ano!

- Como quer a gente? - perguntou Mar.

- Sim, que cantemos, TeenAngels ao vivo, na frente de milhares de espectadores! O Chango disse que nossa demo está matando... o único ruim é que o show é no mesmo dia do casamento de Nico e Cielo, mas enfim... onde está Tacho? Tem que aprender as coreografias já!

E saiu correndo, falando sozinho, sem poder conter sua excitação. Mar e Thiago se olharam, ainda não se animavam a acreditar no que Rama acabara de lhes contar. Nesse momento chegou Julia, e ainda que tentou minimizar sua preocupação, era muito evidente.

- Estefania veio para cá? - perguntou.

- Não. - disseram em coro Mar e Thiago.

- Se a virem...

- Aconteceu algo, Julia? - perguntou Mar.

Julia a olhou, ainda seguia doendo que Mar se negasse a dizer "mãe", mas deixou passar por alto, e lhes confessou.

- Essa noite ela não dormiu em casa, não atende o celular, não sei onde está... não foi a casa de nenhuma amiga, por favor, se puderem me ajudar a buscá-la, eu os agradeceria... estou desesperada.

Mar e Thiago lhe prometeram procurá-la. Mar se ofereceu para acompanhar Julia, que agradeceu. Thiago ligou para Nacho, e ele não tinha nem ideia de onde Tefi estava. Depois começou a ligar para cada colega do colégio, mas de repente, entre chamada e chamada, seu celular tocou. Era Tefi. Chorava, e com a voz entrecortada pela angustia, lhe pediu que fosse vê-la.

- Onde está, Tefi?

- Estou em um hotel. Por favor, não diga nada. Vem, te necessito.

Ele não disse nada a ninguém, como prometido a ela, e foi ao hotel que Tefi indicou. Ela o fez passar, tinha os olhos vermelhos de chorar.

- O que fez, Tefi?

- Sai de casa... não aguento mais, Thiago, não consigo mais.

Ele se sentou junto a ela, nunca a havia visto chorar dessa maneira.

- Pelo menos ligue para sua mãe, ela está desesperada.

- Mentira, não está desesperada! Fica o dia todo falando de Mar, pensando em Mar, comprando coisas para Mar... eu não importo nem um pouco!

- Sabe que não é assim, Tefi...

- Por que me acontece isso, Thiago? Por que ninguém prefere a mim? Você escolheu ela... minha mãe escolheu ela...

- Tefi, está dizendo besteiras. Vamos ver, primeiro e principal... você e eu... era qualquer coisa, Tefi, e você sabe. Vai me dizer que alguma vez esteve apaixonada por mim?

- Poderia ter me apaixonado...

- Não, sabe que não... nos conhecemos desde os quatro anos, sempre fomos amigos, não tínhamos nada a ver um com o outro. Você se encaprichou comigo, como antes havia se encaprichado com Ito e com Zeta...

- Eu sabia... - estalou ela em mais pranto, como seguindo com o tema, ainda que falava de outra coisa.

- Sabia o que?

- Que Mar podia ser filha de minha mãe, e sabia há muito tempo, e não disse nada, me calei. Sou horrível, sou um lixo... tinha pânico de que acontecesse o que aconteceu... que preferisse a ela, que é sua filha biológica, e eu...

- Tefi, sabe que sua mãe te ama, e que isso não vai mudar nada...

- Tudo muda. Tudo mudou, e para sempre.

Bateram na porta. Ela se assustou.

- Você pediu comida? - perguntou Thiago.

Ela negou, enquanto ele foi abrir a porta. Alí estava Mar. Thiago ficou duro. Tefi também.

- Mar... eu estou aqui porque...

- Não tem que me explicar nada. Vim falar com ela. - disse Mar, sem ciumes, pela primeira vez na relação.

- Você disse a ela que eu estava aqui? - perguntou Tefi a Thiago com ódio.

- Não, foi Nacho. - esclareceu Mar. - Já deveria saber que se quiser guardar um segredo, não deveria conta-lo a Nacho.

- A mim ele não disse... - disse Thiago confuso.

- Você não sabe arrancar um segredo de alguém. - lhe disse Mar, e sorriu. - Nos deixa a sós?

Tefi quis reter a Thiago, mas ele a deixou as irmãs a sós. Tefi tentou sair, e Mar a sentou a força. Se olharam por alguns instantes. Mar sabia que Tefi a odiava, e Tefi não lhe caia nada bem também. No entanto, via em sua cara que estava sofrendo, e não era justo que alguém sofresse. Mar achava que devia essa tentativa a sua mãe.

- Não vim aqui por você, vim por Julia. - começou Mar. - Ela te ama, e está desesperada te procurando. Não pode fazer isso com ela.

- Claro, pobrezinha sua mamãezinha, não?

- Não vim discutir. Só queria te dizer que te entendo. Entendo que te saltou a térmica, que você estava muito bem com seu pai e sua mãe, e de repente te aparece uma irmã, que ainda por cima você não suporta. Entendo que tenha ocultado o que sabia, entendo que me odeie, entendo tudo. E sabe por que te entendo? Porque você é adotada.

- E? - disse Tefi, já beligerante.

- E que isso significa que também te abandonaram. E ainda que depois tenha sido criada com muito amor, eu sei que essa é um dor que não passa nunca, que sempre está. Talvez você e eu temos algo mais em comum que só uma mãe.

Quando Julia viu ambas aparecerem em sua casa, tentou dissimular sua emoção e se manejar com naturalidade; sabia que suas duas filhas, por motivos diferentes, detestavam as demonstrações muito emotivas.

- O que querem comer? - perguntou ela radiante. Era a primeira vez que Mar havia aceitado comer em sua casa.

- Não sei... que Tefi escolha. - disse Mar.

Tefi a olhou com raiva, e replicou.

- Não, que a blacky escolha, que é a nova integrante da família.

- Estefania, não chame assim a sua irmã!

- Ela nunca vai ser minha irmã! - gritou Tefi, enquanto se trancava em seu quarto batendo a porta. Julia negou com a cabeça, e a seguiu até o quarto, onde a repreendeu por ser tão malcriada.

Mar observou que sua mãe tinha tirado da geladeira milanesas e batatas, certamente para cozinhar sua comida preferida: milanesas com purê. Pegou seu celular, aquele que Thiago lhe deu, e mandou uma mensagem de texto a ele dizendo: "Graças a você, encontrei minha mãe". E ele respondeu: "Graças a você, perdi o meu pai".

E enquanto ainda se ouviam os chiliques de Tefi desde o quarto, Mar sorriu. Agora tinha uma mãe. E uma irmã. 

Quase Anjos - A Ilha de Eudamón (Português)Where stories live. Discover now