A Invasão de Angeles - I

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Enquanto a cozinha se enchia de inusitadas gargalhadas, o andar de cima era invadido por incríveis gritos. Malvina os ouvia desde seu quarto, enquanto tentava apagar o hematoma de sua mandíbula. Não eram os gritos de Bartolomeu o incomum; de fato eram bastante frequentes; a novidade era essa voz rouca que gritava tanto quanto Bartolomeu. Saiu de seu quarto e se encaminhou até o extremo do corredor. Alí estava o quarto de seu sobrinho Thiago, vazio desde que ele havia se mudado para Londres. Mas essa voz rouca era, sem duvidas, a de Thiaguinho.

Malvina se emocionou, tinha adoração por seu sobrinho e, na verdade, ela era a unica que sentia a falta dele em sua ausencia. Mas Bartolomeu estava muito enojado, então decidiu não interrompe-los.

O quarto era uma habitação simples, impessoal, com alguns resquícios de decoração infantil. Desde que havia sido enviado pequeno a Londres, Thiago passava apenas alguns poucos dias por ano com eles. Durante os dois meses de férias de verão - inverno aqui - Bartolomeu se encarregava de que estivesse o menor tempo possivel na mansão. O levava para esquiar, o mandava de viagem com o filho de Adolfito Perez Alzamendi ou, se nada disso fosse viável, se instalavam na estancia; o que fosse necessário para que Thiaguinho não permanecesse na casa e nem entrasse em contato com as crianças da fundação. Por esse motivo, o quarto de Thiago apenas tinha alguns sinais seus.

Bartolomeu estava surpreso, Thiaguinho poderia ter uma ou outra birra, antes de mais nada, era um adolescente; mas jamais o havia enfrentado com essa veemencia. O Thiago que havia voltado de Londres, dessa vez, estava muito mudado. No entanto, Barto compreendia que devia domar esse potro sem demoras; um adolescente rebelde era a ultima coisa que necessitava nesse momento.

Thiago respondia a cada grito de Bartolomeu com um grito mais potente, e em uma atitude de clara rebeldia, fazia isso enquanto desarrumava sua mala e guardava sua roupa no guarda-roupa.
- Quando voce completar os dezoito anos e trabalhar e ganhar seu dinheiro, vai poder decidir. Enquanto isso, decido eu!
- Eu, a Londres, não volto! - gritava Thiago, decidido.
- Voce vai fazer o que eu mandar, mucoso! E se não gosta de como são as coisas, vá para a India chorar para sua mamãezinha, se é que vai conseguir encontrá-la!

Thiago o fulminou; ainda que desprezava sua mãe tanto como Bartolomeu, odiava que seu pai falasse dela nesses termos. Ignorou a menção a sua mãe e, em troca, vociferou:
- Para Londres não volto. Essa é minha casa e eu fico aqui!
- Arrume essa mala, porque mesmo que eu tenha que te levar pelos cabelos, voce vai subir no primeiro avião que sair para Londres! - sentenciou Bartolomeu e abriu a porta. Alí se topou com Malvina, que se afastou para deixá-lo sair.
- Se despeça de Thiaguinho, Malvina. Vai embora no próximo vôo.

Malvina sorriu carinhosamente para seu sobrinho, que deixou de lado sua furia assim que seu pai se afastou.
- Então que se comprometeu?
- Quase. - disse ela.
- Obrigado por me convidar. - reprovou Thiago.
- Está tão lindo! Quando cresceu tanto?
E o apertou com um forte abraço. Thiago agradeceu, era o primeiro abraço que recebia desde sua chegada.


Quase Anjos - A Ilha de Eudamón (Português)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora