Capítulo 09 - Parte 07

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— Não sou obrigado a dar explicações de minhas atitudes pra você. Vamos nos banquetear sobre a tua carcaça, como fizemos com tuas irmãs antes de ti.

— Podes não sentir nada, quando eu te ameaço. Deve ser fácil para tua figura vir se apresentar aqui e galante. È tudo mentira. Eu sei. Eu sinto o teu desespero. Eu sinto a tua fome. Por baixo desta pelo brilhante, deste teu olhos cheios de luz, tua carne está seca. Tuas vísceras estão secas. Eu posso sentir o teu cheiro de terra. Sei que isso é algo que Vós não podem fazer, sentir o cheiro das coisas. Vós nos perseguem com estas idéias que tem na cabeça vossa, que julgam muito superior, e muito capaz. Mas a verdade é que todos vós são um bando de cegos.

— cegos? Eu acho que você está equivocada quanto a alguns aspectos de nossa realidade. Quanto a ver, julgo, vemos perfeitamente bem. Somos os filhos de Hórus, somos os falcões, as águias do mundo, e caçamos a tua raça, como quem os pássaros caçam serpentes e morcegos.

— Moleque besta! Não existem nem duas, nem três. Tudo é uma raça só. Eu quero saber se verás tão bem quando tiveres as vísceras de teu macho nas mãos, quando eu a arrancar todas para fora.

A sorriso eterno no rosto de Heitor morreu. Suas feições amenas e equilibradas deram lugar a um careta horrível, como se um a superfície de uma fruta muito brilhante e lisa se contorcesse e revelasse os sulcos negros e podres por baixo da casca.

A voz também oscilou de seus tons melodiosos para um grito furioso.

— Sua vagabunda!

Era um grito de tirar a razão. Cristiano se sentia completamente impotente. Pensou em fugir, mas sentiu que não existia na terra lugar que o pudesse esconder. Estava ali diante daquela cena a beira da loucura. Tinha plena convicção de que morreria naquela noite.

Teve a nítida impressão de que Heitor se arremessava contra o monstro. Quando deu o primeiro passo, teve tempo somente de reparar que a criatura arremessava algum objeto, como um saco de areia, sobre seu patrão. A lâmina cortou o céu, e em seguida, sentiu apenas que algo se partia no ar, e ficou cego depois que uma grande quantidade de um líquido viscoso caiu sobre seu rosto. Desesperado, limpou desesperado o líquido do rosto. Achava que era lama. Até que percebeu que na verdade era sangue, e as duas partes de fita jaziam ao seu lado, e restos de vísceras tinham caído sobre seus ombros. Ficou desesperado de medo. E passou a contorcer-se de todas as formas no chão. Primeiro escorregou no sangue misturado com terra, e caiu de boca aberta no chão. Quando se levantou, tentou afastar pra longe de si, descontrolado, os restos de carne que estavam sobre ele. Ele já começava a correr em qualquer direção. Tinha a impressão que corria inclusive na própria direção do mostro, o mesmo do qual queria tanto fugir. Teria corrido frenético, tão tivesse sido arremessado violentamente com um soco no rosto contra o chão.

Quando se estatelou no chão, tinha certeza que não se levantaria nunca mais. Decidiu apenas esperar a morte chegar.

— Levante-se seu idiota! Preciso de você! Era Heitor.

— Preciso que você nos ajude a se livrar do corpo.

— De quem? Do monstro?

— Não. Ele fugiu.

— Qual corpo então? O meu?

— Como, meu jovem tapado? Você está vivo, por enquanto. Já que você está tão abalado que não consegue juntar suas ideias, eu vou ajuda-lo. Este é o corpo de Rita, pelo menos o que sobrou dela. Ela está em pedaços. E a menos que você me ajude, a menos que você tenha alguma utilidade, serei obrigado a cortá-lo ao meio também. Mas eu teria que cuidar de dois corpos. E pra mim, cuidar de um já é o suficiente.

O cheiro de sangue enchia o ar, mais o odor de vísceras. Não restava qualquer alternativa além de obedecer. O motorista surgiu do nada e o ajudou a juntar os pedaços e colocar em sacos pretos. Dava a entender que tudo aquilo estava preparado. Fez tudo aquilo imerso em torpor. Sentia que a qualquer momento morreria. Assim que terminasse de recolher os restos da mulher que ele conheceu a pouco tempo, a mesma mulher que a poucos instantes sorria e balançava suas pernas grossas pra ele. Cumpriu aquelas obrigações como se estivesse a beira da própria execução. Demorou um tempo maior do que seria necessário. Sentiu repentinamente uma saudade terrível de casa. Onde estaria sua mãe àquela hora.

Nandi e os Filhos de Hórus (Em Revisão)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora