Capítulo 21

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Capítulo 21

Cristina caminhava rápido pela rua. Naquele horário, tudo ficava muito escuro. Os olhos arregalados por trás de seus óculos de aros grandes e redondos reagiam a cada barulho. A luz dos carros acendia atrás dela.

Ninguém precisava saber seu nome para notar suas origens asiáticas. Os cabelos lisos, o rosto redondo, a pele clara. Talvez por isso não se desse bem com a mãe, por ela lembrar constantemente o rosto do pai.

Cristina Midori não o conheceu. Quando adquiriu consciência, ele não vivia mais com a mãe. Nem sabia se um dia realmente viveram juntos. Aquele era um assunto proibido entre as duas. Não sabia exatamente como, mas era uma verdade estabelecida que ele as tinha abandonado. Nada mais precisava ser dito. Uma dor estranha pairava no ar. Ninguém o confessava, mas estava ali. Midori não tinha coragem de perguntar a mãe. Imaginava que a dor da senhora seria imensa. Confundia a dor dela com a própria.

No entanto, tinha herdado da mãe o corpo robusto, as penas grossas, o quadril largo. Em nada lembrava os corpos esguios dos japoneses que via na internet. Se odiava por aquilo, por lhe dar a impressão de sempre ser gorda.

Naquele dia, ela beijara uma amiga no colégio.

Elas conversavam sobre algo nos corredores. Era difícil encontrar alguém que compartilhasse seu amor por livros e séries. As duas comentavam o último lançamento do serviço de streaming. Entre as conversas, uma piada repentina. Risos descontrolados. E então um período de silêncio. Ela viu a boca perfeita da amiga. As linhas bem desenhadas, a carne macia, e não resistiu. Cristina a beijou.

— o que foi que você fez?

— Eu não sei.

A garota levantou e saiu correndo. Elas estavam escondidas dos outros olhares. Por sorte ninguém viu. Ela se perguntava que problema tinha beijar uma garota, e se isso fazia dela uma sapatão. Aquele nome a fez se sentir mal. Não tinha nenhuma vontade de ser masculina, como também não precisava ser feminina em excesso. Também era verdade que não se sentia nem um pouco delicada. Tinha momentos em que pensava que aquilo não era nada. Mas depois os pensamentos voltavam a sua cabeça, e ela não podia mais fazer as vozes se calarem.

Um carro elegante e prateado se aproximou e reduziu a velocidade para acompanhar a moça. O vidro escuro baixou revelando um homem branco e gordo. Ele exibia um sorriso malicioso.

— Ei, linda? E aí?

Cristina ignorou. Não adiantava usar roupas largas, deixar o cabelo po lavar, amarrado com um laço imundo. Aqueles cretinos não paravam de aparecer.

— Ei! — ele continuou — Estou me sentindo muito sozinho. Estou precisando de uma companhia.

— Vai tomar no cu, seu safado! — Ela explodiu.

— Nossa! Eu adoro mulheres decidas. — o carro mantinha a velocidade suficiente para acompanhar a moça. A rua estreita estava deserta. Ele continuou. — Quanto você quer? Eu pago. Te dou o preço que você me pedir. Eu quero uma menininha igual a você. Eu sempre quis uma japinha.

Ela deu um pulo tão alto que escorregou e caiu no chão. O que tinha acontecido? O que era? Seria um tiro? Observou o carro e viu que o homem fora arremessado do interior do carro contra o vidro. Ele estava ensanguentado. O carro continuava andando. De repente algo bateu no veículo e ele voou como um brinquedo para o outro lado da rua contra a parte da frente de um galpão fechado àquela hora. Uma mulher negra apareceu diante dela.

Parecia um colosso, e se confundia com a escuridão. Cristina via em seu rosto. Era má. Cruel e linda. Ficou sentada no chão boquiaberta.

Não havia evidência alguma que aquela mulher linda tinha sido a responsável. Não a viu arremessar o homem contra o para-brisas, não a viu jogar o carro do outro lado da rua. Ele continuava lá amassado. Mas em seu coração, a reconhecia. Ela sentia que seria capaz de seguir aquela mulher para o outro lado do mundo.

Nandi e os Filhos de Hórus (Em Revisão)जहाँ कहानियाँ रहती हैं। अभी खोजें