Dragões Feridos.

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É difícil me lembrar duma noite mais longa do que a da festa da fogueira. Eu já tive momentos piores na minha vida, mas aquela noite, Deuses, ela foi interminável.

Cecilia estava arrasada e fomos praticamente escorraçados da festa. Orin percebeu bem que o cerco estava se fechando e saímos às pressas como penetras descobertos. Na sede dos Dragões contamos tudo o que acontecera para Adriel, e ela olhou com dó para Cecilia, sabíamos que a elfa não gostava da ideia de conviver com uma mestiça, mas até Adriel se compadecia.

Estávamos sentados no sofá, todos guardando os pensamentos em silencio quando Sará suspirou e sorriu no escuro.

– Acho que a eleição já era. – Todos pensávamos o mesmo mas seria indelicado dizer tal coisa e Cecilia se encolheu no sofá. Pensei que Ivna fosse repreender Sará mas ele continuou a falar – Não importa o que digam maninha. Você é sim uma heroína, até eu tenho que admitir e se não podem aceita-la só por causa de sua condição eles não te merecem.

Cecilia sorriu para Sará e eu senti orgulho do meu time, a melhor coisa que eu tinha feito desde que formamos um esquadrão fora conversar com eles na festa, nossos laços estavam mais firmes do que nunca. Algo atravessou a janela quebrando o vidro e nos assustando. Houve um grito de medo e eu me levantei num pulo.

– Mestiça imunda! – Alguém gritou lá de fora. – Vá embora com as maldiçoes dos Deuses não precisamos de vocês aqui Dragões.

Cecilia recomeçou a chorar e Ivna a abraçou. Eu me preparei pra sair e Sará já se levantava.

– Não saiam. – Disse Orin. – Deixem que se expressem como quiserem.

– Chama isso de se expressar? – Perguntei furiosa. – São animais.

– Não temos o que fazer, é melhor deixar essa história terminar por si só.

Saí com Sará para espiar. Ouvimos xingamentos serem entoados pela rua, a maioria dos agressores parecia bêbados e os que estavam sóbrio apenas se sentiam traídos e nem olhavam pro nosso salão. Voltei pra dentro e fui dormir.

Tive sonhos estranhos que se embaralham na minha cabeça, tudo gritaria e confusão, perdia meus amigos e depois eu virava um grifo e Emilian me domava, foi bem estranho e por sorte alguém me acordou. Abri os olhos cansada e vi Cecilia, ainda estava muito escuro e todos pareciam dormir.

– Queria pedir um favor. – Disse Ela de olhos inchados.

Foi um pedido estranho e corajoso, pensei duas vezes se aceitava ou não ajuda-la, mas no fim achei que era meu dever. Ela quis cortar o cabelo pra que ficasse como o meu, repicado e curto, apenas com a diferença de manter a franja que ela tanto gostava, o problema eram as orelhas, nesse corte elas ficariam amostra, sem chance de Cecilia passar despercebida.

– O que achou? – Perguntou Cecilia me olhando com os cabelos castanhos curtos.

– A mesma coisa que achei quando me vi no espelho.

– O que?

– Ficou horroroso. – Ela sorriu. – Mas mostra exatamente o que somos, certo?

– Certo.

Ficamos conversando até amanhecer e aproveitamos pra preparar o café da manhã, assamos pães no forno a lenha, seria delicioso come-los ainda quentinhos com queijo e ovos mexidos. A primeira a levantar foi Ivna, que parou na cozinha e ficou encarando Cecilia, não disse nada, apenas se aproximou e ainda bocejando nos ajudou com os ovos, deu uma ombrada em Cecilia e sorriu, mandou um beijinho e Cecilia riu, as duas se abraçaram e continuaram a cozinhar. Me senti estranha olhando as duas, o mesmo sentimento que eu tinha ao ver Gil e Blasco, brincando e conversando, um mais novo o outro mais velho, eram minhas irmãs, como Alana já fora um dia. Sorri e entrei na brincadeira.

Escama NegraWhere stories live. Discover now