Meu Emilian empoeirado.

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Eu estava lendo um livro na sala, Treysa costurava algo ao meu lado, soltava um comentário, trabalhava no tecido, eu virava uma folha, contava a ela um trecho, depois silêncio, ela mexia na agulha novamente, fazia uma observação, eu molhava o dedo e virava mais uma página. Lilin entrou alarmada e Plem vinha logo atrás, ele tinha a mão no rosto e o sangue pingou primeiro no chão de madeira. Treysa soltou o crochê e pediu pra olhar, Plem não deixava, tampava o rostinho, Treysa insistiu e ele fazendo cara de aflição mostrou o corte nos lábios, na boca e um talho no queixo.

– Deuses. – Exclamou Treysa. – Está feio, que foi isso?

– O desgraçado do Emil. – Resmungou Plem que sentiu dor e tapou novamente o rostinho.

Treysa me encarou e eu disse que conversaria com ele, ela levou Plem até uma tina para limpar o machucado pedindo ajuda de uma outra irmã. Lilin me contou que Plem e Emilian haviam discutido novamente, eu sabia que os dois andavam se estranhando e que provavelmente Plem tivesse começado, mas a violência de Emilian me preocupava bastante.

– Onde ele está? – Perguntei à Lilin.

– Ele correu pro bosque.

Caminhei pelo jardim, as crianças estavam todas dentro de casa vendo o estado de Plem, menos Emilian, que devia estar escondido. Eu fui andando com raiva, Emilian era encrenqueiro e resolvia as coisas na mão, mas conforme eu andava pelo jardim, entre as arvores do pequeno bosque, fui me acalmando, ouvindo uma vozinha que dizia que Emilian era apenas um garoto, eles brigavam mesmo, eu brigava demais na idade dele, e meus melhores amigos, irmãos, eu conheci empurrando da cadeira e puxando pelos cabelos.

Fui encontrar Emilian apoiado numa arvore, ele estava emburrado, sentado no chão olhando os pezinhos, quando me viu desviou o olhar, percebi que ele estava irritado e também envergonhado, pelo menos ele parecia não ter gostado do que fez, já era algo.

Enquanto me aproximava, pensava em como abordar a situação, como começar a conversa, em como, Treysa me aconselhara, a ser justa e imparcial. Eu já tinha tido conversas antes com Emilian, sobre ter mais modos, não ficar pedindo tudo o que vê, a não ser rude com as pessoas, não atacar o primeiro sujeito que cambaleia pro nosso lado. Enquanto educava Emilian, eu me educava, refletia mais sobre a sociedade, sobre o porquê de fazermos o que fazemos, nem sempre eu tinha as respostas, e deuses! Ele sabia fazer a pergunta certa na hora errada, mas eu tentava com sinceridade responder tudo e não negar quando realmente não sabia o porquê das coisas. Era difícil, mas eu sentia que me saía bem várias vezes, e tivemos conversas produtivas, mas dessa vez Emilian tinha passado dos limites, ele tinha feito algo muito grave, e como tutora e responsável dele, eu sabia disso. Ele sabia disso.

– E aí parceiro? – Eu disse me sentando ao lado dele, também me encostando na arvore. – Um mal dia né?

Ele fez que sim com a cabeça, não me encarava, na verdade, quase nem se mexia.

– Treysa está cuidando de Plem.

– E?

– E que ele vai ficar bem. Pensei que você gostaria de saber.

Emilian deu de ombros.

– Por mim tanto faz. – Disse ele me olhando, e não vi remorsos como eu pensava, vi raiva.

– O que aconteceu?

– Ele que começou, me provocou por nada, acho que agora ele aprendeu a lição.

Eu estava me irritando, ainda mais quando lembrava do estado de Plem, o rosto e a boca cortados.

– Não fale assim Emilian, não interessa se ele te provocou, você não pode fazer isso.

Escama NegraWhere stories live. Discover now