A Garota Presa.

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Os relâmpagos iluminavam a noite escura, as primeiras gotas caíram e tentamos nos abrigar debaixo duma arvore, estava muito frio e sem opções. Cecilia revelou que tinha algum dinheiro.

– Do chapéu, meu pai disse pra ficar com ele.

Andamos com passos ligeiros, levando umas gotas aqui e outras ali, geladíssimas. Emilian apontou uma estalagem; "o gigante encravado". Entramos e ouvimos musica, o calor da lareira, as canecas batendo nas mesas e no balcão, vozes distraídas e alguns olhos nos observavam.

– Nada de crianças. – Gritou um sujeito barbado e barrigudo que usava um avental. – Não há nada para crianças aqui.

– Mas precisamos de leito meu nobre senhor. – Declarou Cecilia. – E veja, temos como pagar.

O sujeito coçou a barba.

– É pouco, da pra comer, mas não pernoitar.

– Como? – Perguntei. – Esse dinheiro é mais que suficiente.

– Estamos lotados. – Disse o estalajadeiro de forma preguiçosa e tentando sem sucesso esconder seu risinho maroto. – E vocês são três, e ainda por cima crianças, terei que ficar de olho a noite toda em vocês.

– Não vai precisar. – Disse dando as costas ao canalha. – Vamos Cecilia, vem Emilian, aqui só tem aproveitador e malandros.

– Moleques! Insulta meu estabelecimento.

Saímos da pocilga e a chuva apertou. Andamos sem rumo. Descobrir o que tínhamos que fazer ali ia ser difícil, a cidade era muito maior do que a que Cecilia apresentava a peça. Me perguntei quem encontraríamos ali.

– Estou com fome. – Reclamou Emilian enquanto caminhávamos numa praça, já estávamos ficando ensopados.

– E cansada também. – Completou Cecilia. – Precisamos encontrar onde dormir.

– Acho que vai ter que ser na rua mesmo. – Disse desanimada quando ouvi um assobio.

– Aqui, ei, senhoritas.

Na praça havia um sujeito num pelourinho, com as mãos e pescoço presos. Cecilia hesitou, mas eu me aproximei e chegando perto pude ver que era uma garota mais ou menos da minha idade.

– Eu não pude deixar de ouvir, vocês precisam de lugar pra ficar? É só me soltar que levo vocês em segurança.

Ela sorriu e o ingênuo do Emilian se aproximou no mesmo instante.

– O que vai fazer? – Perguntei.

– Ora solta-la. – Ele disse.

– Ela quer nos levar na conversa. – Disse Cecilia.

– Como assim?

– Ela está te engando Emilian, ela é uma criminosa e está sendo punida.

A garota tinha os cabelos molhados e escorridos.

– Uma injustiça, por favor, o guarda foi mijar e vai voltar dentro logo, me ajudem eu juro que cumprirei minha parte, um garoto depende de mim, isso tudo foi uma armação, me colocaram aqui pra que eu não atrapalhasse. Maninhas, eu juro, sou inocente.

Ela estava com muita urgência na voz o que nos alarmou, ela parecia extremamente desconfortável imobilizada daquela forma e tomando chuva, e ela tinha minha idade.

– Quem te incriminou? – Perguntei, e a garota hesitou, talvez fosse a chuva, mas pensei ter visto lagrimas brotarem de seus olhos.

– Meu pai. Por favor, preciso salvar alguém. O guarda vai voltar.

Escama NegraWhere stories live. Discover now