A voz da consciência

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Fabrício Fontes

Desse do momento que cheguei na casa do tio Fernando, antes um lar vibrante e acolhedor, agora era um mausoléu silencioso. O ar carregado de ressentimento e mágoa pesava sobre meus ombros enquanto eu observava a família reunida na sala de estar. Tio Fernando, outrora feliz, agora era uma figura triste e perdida em pensamentos, confinado em suas próprias angústia, ignorado por todos.

Não aguentava mais ver a maneira que todos estavam se dirigindo a ele, que forma ríspida e distante. A culpa corroía seu interior, era notório no seu olhar, enquanto eu me perguntava: como deve ser esquecer dos momentos mais importantes da sua vida ? Como é abrir os olhos é não se lembrar da sua esposa e filhos?

Com um aperto no coração, levantei-me e me dirigi ao grupo. 

- Com licença, disse com firmeza, minha voz cortando o silêncio opressor. O que está acontecendo aqui com relação o tio Fernando? 

Os olhares se voltaram para mim, carregados de surpresa e desconfiança. Minha tia Carmen, sempre a mais crítica, franziu a testa. 

- O que você quer dizer, Fabrício? Já vai puxar saco do seu tio?

- Não é puxar saco, sei sobre o pedido de divórcio da tia Olivia. Mas ninguém se preocupou em olhar para situação dele? Rebati, minha voz crescendo em intensidade.

- Então, ele pode fazer o que quiser, que devemos esquecer e relevar, mas ele não pode ser ignorado, faça-me favor, Fabrício! Carol levanta as mãos para alto indignada

Um murmúrio percorreu a sala. Senti a raiva pulsar em minhas veias. 

- Ele perdeu a memória, por Deus! Ele passou por uma cirurgia cerebral. E vocês o tratam como se fosse um criminoso, como se ele tivesse cometido um crime imperdoável!

- Magoar a esposa e filha para mim é crime imperdoável. Tia Carmen diz.

- Imperdoável é homem que por livre escolha, decide se esquecer da família e ir embora e nunca mais voltar. Ele sofreu um acidente que não sabemos as circunstâncias, que tirou sua lembranças. Por exemplo, tia Carmen. A senhora se lembra do dia do seu casamento? Sou enfático.

- Sim. Por que está me perguntando? Ela retruca.

- Papai, você se lembra do dia que inaugurou seu escritório de advocacia?

- Perfeitamente. Dia, mês e ano. Ele responde firmemente.

- Tia Olívia, a senhora se lembra do falecimento da sua mãe?

- Lógico. Memórias estão intactas na minha mente. Ela parece compreender a minha lógica.

- Meu tio, não se recorda da perda da maldita da ex- esposa, não se lembra como se apaixonou pela tia Olívia, como se casou, como se tornou delegado, não se recordar da amizades feitas e nem do nascimento dos filhos. Vocês acham que isso não causa desconforto e angústia no peito dele? Falar para uma criança de quatro anos que não é seu pai e ver os olhos dela dizer o contrário? Olhar para mulher paciente e gentil que não deveriam estar mais juntos, pois ele não se lembra dela, será que fácil dizer isso? Olhar fotos, ouvir histórias e sentir emoções que você não se recorda, será que isso não dói?

- Verdade, Fabrício. Uns dias depois da confusão do acordo do divórcio. Cheguei aqui, ele estava sentado no sofá com as fotografias do casamento e dos meninos bebê, ele dava socos na cabeça, dizendo porque não se lembrava. Quando eu me aproximei dele, seus olhos estão como rios. Não consegui confronta-lo. Ritinha fala emocionada.

- E fácil quando é com outro, porque estamos preocupados com os próprios sentimentos, se esquecendo das condições atuais dele. Todos nesta sala são pessoas que ele ama e que dizem amá-lo, que amor esse? Pergunto indignado.

ALGEMADO EM VOCÊWhere stories live. Discover now