#30 - Conversas na Trilha

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"Há mais de um século, acredito que há pelo menos dois, talvez três, uma revolta popular pôs fim ao reinado de Raibanuin, um polêmico ditador que adotou um nome élfico, mesmo sendo oganter. Dizem que sua pele adquiria uma textura dourada ao Sol e isso lhe subiu à cabeça. Como se sabe, ogânteres tem aspecto de albino às sombras, mas cada um tem seu próprio tom de pele diferente, revelado pelo Sol. Com a queda de Raibanuin, a população de Jorneik se fortaleceu. Decidiram que não haveria mais rei em sua nação. Bastava de reis mentirosos, cruéis e xenófobos. No ano seguinte, Jorneik se tornou o primeiro -- e até o momento, único -- reino comandado por representantes eleitos e periodicamente substituídos. Suas fronteiras se abriram para acolher qualquer pessoa, de qualquer espécie. O lugar se tornou ponto neutro e confiável para encontros e negociações entre povos diferentes e muitos tiveram que aprender a língua deles para esse intento. Não demorou para que o Jorneikanto fosse aceito como a língua principal para a comunicação entre diferentes culturas."


O grupo adota sua configuração própria para incursões em florestas. Sharon e Haseid vâo à frente, como batedores. Todos os outros, incluindo Neriom, vão muito atrás.

-- Onde você acha que fica o castelo? -- Haseid pergunta, enquanto anda abrindo um pouco o caminho.

-- Certamente em algum lugar por aqui. Se é que existe.

-- Haha! Como assim? Aquela muralha toda não ia proteger nada?!

-- Sei lá... O castelo também pode não ser bem um castelo. Pode ser subterrâneo.

-- Isso é verdade. Talvez tenhamos que cavar. Ei, você sabe quem é essa Grugbar? Já viu?

-- Não, nunca vi. Acredito que seja uma oganter. Afinal, é o que mais tem por aqui. -- Ela nota o olhar sério do colega e completa. -- Sem ofensa, claro!

-- Relaxe.

A conversa se encerra e os dois focam no trabalho: abrir caminho antevendo qualquer perigo que possa haver por ali. Para isso é fundamental ser discreto, o máximo possível.

Mais atrás, seus aliados seguem um pouco menos cautelosos.

-- Talvez a gente não precise derrubar a rainha. -- Ezelius solta, de repente.

-- Como assim? -- All Thorn se vira pra ele, visivelmente contrariado, como se o feiticeiro tivesse dito a maior besteira do mundo. -- Fizemos um acordo com o tritão, está lembrado?

-- Claro, mas uma coisa é o que ele pediu e outra é o que ele precisa ou o que ele quer.

-- O que você quer dizer?

-- Veja: qual é o problema do Roarxorrarncrarkvac? Ele é prisioneiro. Se nós encontrarmos o artefato que bloqueia sua saída da água e sua mudança pra forma de dragão, é o que ele precisa! Assim ninguém precisa morrer.

-- Mas temos um acordo com ele.

Ezelius ergue as mãos e fala, com um sorriso.

-- Eu tentei. Você é que manda!

Aquela floresta em muito se parecia com a floresta em frente às minas de orichalcum e por trás das casas que Sharon e Neriom visitaram ao fugir delas. O gnomo continuava olhando ao redor espantado com aquele ambiente tão cheio de verde. Vez ou outra encarava algum besouro pelo caminho, com curiosidade.

--De que é que vocês estão falando? -- Wolfgar chega mais perto dos dois que conversavam. -- Está com medo, feiticeiro? Quem tem que estar com medo aqui é essa tal rainha!

-- Que medo o quê?! -- Ele chega mais perto do anão e fala em seu ouvido. -- Tou só brincando com o paladino. Botando um dilema moral na cabeça dele.

-- Ah tá! Entendi, eu acho...

-- Eu sei do que você estão falando. -- All Thorn fala olhando para trás, enquanto se aproxima de Ild. Então se volta para o monge. -- Estamos no caminho certo?

-- Estamos sim.

-- Ótimo. Não quero perder horas a mais procurando o restante do grupo.

Lá atrás Wolfgar desabafa:

-- Estou aliviado que isso era só uma brincadeira sua. Aquela luta no mar nem teve graça, num instante acabou! Não vejo a hora de dar umas marteladas em alguém.

-- Meu amigo anão, eu entendo você. Só consegui lançar uma bola de fogo! E os relâmpagos são muito mais divertidos. Nem deu tempo de usar um!

-- Daqui a pouco a gente desconta, esquenta não. E cá pra nós, o paladino deve estar sentindo isso também. Ele não fez quase nada lá no mar.

O feiticeiro confirma com um aceno breve. Lá na frente, Ild comenta baixo para o paladino:

-- Parece que estão falando de você.

-- Deixe falarem, pelo menos se distraem.

-- Você viu o gnomo?

-- Eita! -- All Thorn se vira pra trás e não vê o pequeno clérigo. -- Neriom?!

Os dois que conversavam percebem a preocupação e olham ao redor.

-- Está ali! -- Wolfgar fala, pra tranquilidade do colega.

O gnomo vinha correndo de lá de trás.

-- O que houve?

-- Sei lá! -- Ezelius responde. -- O paladino que lhe chamou, preocupado. Vai lá falar com ele!

Após ajeitar o chapéu, ele vai mais para a frente da comitiva. Passa pelo Teraaz e chega onde estão os outros dois.

-- O que foi?

-- Neriom, você não está acostumado com florestas. Não devia ficar longe da gente ou pode se perder.

-- Eu já sou adulto.

-- Eu sei. Quer saber? Vá com Teraaz que eu fico mais tranquilo. E você ainda ganha uma vista melhor. O que acha?

-- Pode ser.

-- Venha. -- Com facilidade, o paladino coloca o gnomo nas costas de Teraaz e volta para perto de Ild, que comenta.

-- É, você é um bom amigo, que gosta de botar os amigos pra cima.

All Thorn sorri com o comentário, mas sua atenção é presa lá na frente. Haseid e Sharon estão parados, esperando por eles. 

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