#08 - Lar Ocupado

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"Haseid é um ogânter, mas não é dessas terras. Ele vem da temida terra do além-mar, onde magia nenhuma funciona. Uma terra muito distante onde vegetação é raridade. Um lugar coberto por areias, com risco de tempestades e de ataques dos dragões do deserto. Ou de saqueadores. Haseid era um desses, um saqueador. Seu bando se chamava Boca do Deserto. Um dia ele e seu pai encontraram um grupo perdido. Um grupo estrangeiro. Fizeram um acordo: lhes ajudariam a sobreviver e encontrar sua embarcação, mas em troca Haseid e seu pai seriam aceitos como parte desse bando. Um bando de piratas. E assim aconteceu, conforme as palavras do próprio Haseid. Desse jeito eles começaram suas aventuras em alto mar. Eles se enturmaram e tudo seguiu bem até o dia em que a embarcação foi atacada por um vorg."

Berros monstruosos vinham da floresta. Sharon e Neriom não faziam ideia de que feras poderia haver ali, mas ambos tinham certeza de que eram feras enormes e perigosas. Ainda assim eles seguiam, pois precisavam se afastar daquela mina.

– Você ouviu isso? – Neriom pergunta, espantado.

– Sim. Gritos. Alguma fera deve ter encontrado alguns fugitivos.

– Por Kreskajia, que ela não encontre nós!

O caminho seguiu até um ponto onde a floresta acabava. Sharon foi naquela direção. Havia um rio não muito largo. Na outra margem, podia-se ver quintais.

– Vamos acampar aqui.

– É seguro?

– Não tanto quanto eu gostaria, mas temos que esperar anoitecer.

– E o que faremos depois?

– Enquanto estamos aqui, vamos analisar esses quintais na outra margem. Pode haver alguma casa sem moradores.

– E se não tiver nenhuma?

– Vamos seguindo o rio analisando mais quintais. Foi o que eu quis dizer quando falei em acampar.

Neriom reclamava de fome e Sharon colheu frutas de um só tipo, dizendo "Vi várias dessas comidas pelo chão. Não devem ser venenosas." Felizmente, estava certa.

Quando a noite chegou, eles já tinham um alvo. Atravessaram o rio nadando com um cipó de segurança. Na outra margem, já sem movimentação nenhuma de pessoas, andaram um pouco e pularam a cerca.

– Que bom que achamos a casa. Como a gente entra?

– Fale baixo. Há casas vizinhas. – A elfa recomenda antes de responder. – E eu tenho meus métodos.

Ela passa um bom tempo na frente da porta, usando qualquer pequeno objeto que encontre ali pelo chão. Testa com um, com outro, até que finalmente a destranca. Com cuidado, após gesticular para o Neriom pedindo silêncio, ela abre a porta bem devagar.

– Vazia como pensei. Vamos.

Os dois entram e encontram aquele pequeno lar com poucos móveis. Um armário baixo na cozinha com alguns copos, vasilhas e tigelas. O único quarto tinha um colchão grande.

– Talvez os moradores estejam em viagem. Essa casa vai servir bem. Neriom! Nada de se deitar no colchão. Estamos molhados. Vamos deixar as roupas secando nas cadeiras da cozinha. Ah, e você vai dormir por lá.

– Vou dormir pelado?!

– Não, toma. Encontrei esses lençóis velhos, mas só tem dois. São grandes. Use uma parte para enxugar e outra para forrar a mesa e se cobrir.

– Tudo bem... – O gnomo responde, pensativo.

– Tá triste, pequeno? Não queria liberdade? Ou está com saudades da Grilda?

– Ha, ha! Não! Estou pensando quanto a liberdade vai durar.

– Confie em mim. Vai durar muito. O suficiente. Boa noite, vou pra sala.

– Boa noite... Gigante!

– Neriom...

O gnomo faz uma cara engraçada de criança travessa enquanto Sharon sai da cozinha levando uma cadeira. A elfa sorri e se deita, após se secar, já pensando nos próximos passos.

A noite passa. Neriom dorme bem como há muito tempo não dormia. O punhado de mato que ele arrumou pra colocar sob o lençol, como um travesseiro, ajudou um pouco. Desperta e vê Sharon ali na cozinha, em uma cadeira, comendo algumas frutas.

– Bom dia, Sharon.

– Bom dia, pequeno. Conseguiu dormir bem?

– Sim, dormi. Muito melhor que naquela prisão.

– Vou sair. Fique por aqui.

– Vai pra onde? – Neriom pergunta e só então nota que ela não está vestindo os farrapos da mina e sim um manto amarelado.

– Confie em mim. Volto em algumas horas, antes do almoço.

– Tá... – O gnomo olha para ela preocupado, pensando se sua nova amiga seria capaz de deixá-lo ali para escapar sozinha.

Sem falar mais nada, ela vai em direção à porta da frente, abre uma pequena fresta para olhar o movimento da rua. Satisfeita, simplesmente sai.

Andando por aquela terra estranha, a elfa busca uma feira. Sorri quando finalmente encontra uma perto da praia, e começa a andar por ali à procura de alguém com dinheiro descuidado, de preferência alguém que lhe pareça uma má pessoa.

Encontra sua presa e, sem muita dificuldade, alivia o sujeito de um saquinho de moedas. Imediatamente, muda a direção e se mistura entre as outras pessoas.

Cumprida essa parte, tinha que agir rápido. A elfa conta por alto as moedas e vai a uma banca de roupas.

Menos de duas horas depois de ter saído, conforme prometeu, lá está Sharon voltando para a casa ocupada.

– Sharon? Você voltou?

– Claro, pequeno. – Ela entra na cozinha usando um vestido curto verde escuro. – Trouxe umas coisas.

Neriom olha o cesto que ela acabou de colocar na mesa e encontra um pão grande, uma barra de sabão e uma roupa pequena, verde também.

– Isso é meu? – Ele pergunta, medindo a roupa, mas vê Sharon se dirigindo ao quintal. – Vai pra onde?

– Preciso devolver isso aqui. – Ela mostra a roupa amarelada na mão e sai.

As Sementes do Mundo InferiorOnde as histórias ganham vida. Descobre agora