Capítulo 57

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Em algum lugar ao Sul de Al-Andalus — Primavera, Abril, Maio e Junho de 836 d.C.

Jamila ordenou que suas tropas se dispersassem usando a trilha de cabras que subia pelo fundo da ravina, fora surpreendida pela velocidade com que Jamal avançara com sua cavalaria deixando a infantaria para trás.

A entrada da ravina era estreita e ficava em meio a um bosque, um local perfeito para se defender. Por isso ela escolhera seus melhores guerreiros para formarem uma linha de defesa com o objetivo de atrasar o exército inimigo, possibilitando assim que o grosso de suas tropas escapasse.

Cavaram uma vala e fizeram uma barricada com madeira cortada das árvores em forma de espigões. Posicionaram-se então atrás dela para esperar pelos cavaleiros inimigos. Jamila colocara os arqueiros vários passos atrás da linha formada por Brunilde e suas escudeiras e guerreiros.

Ordenara para que Yusuf recuasse com os demais, mas ele teimosamente recusou e se colocou entre suas duas filhas, uma de sangue e outra de coração.

Perto do meio-dia ouviram o tropel de cavalos, logo eles emergiram por entre as árvores, mas pararam longe do alcance dos arqueiros.

Um cavaleiro se aproximou balançando um lenço branco acima da cabeça.

— Deixem-no se aproximar – ordenou Jamila.

— Meu senhor e comandante deseja parlamentar com Jamila, filha de Abd al-Ŷabbãr ben Zãqila! – gritou.

— Que ele venha! – gritou a jovem em resposta — Juro por Alá respeitar a trégua.

Isso pareceu satisfazer o emissário que retornou para suas linhas. Não demorou e cinco cavaleiros se aproximaram, todos usando elmos e cotas de malha, além de escudos redondos no braço esquerdo e cimitarras nas cinturas.

— Ŷamĩla bint Abd al-Ŷabbãr ibn Zãqila! – gritou o homem que parecia ser o comandante e ela reconheceu-o imediatamente.

— Jamal! – gritou enfurecida e foi impedida por Yusuf quando tentava saltar pela barricada.

— Lembre-se que você jurou por Alá – disse Yusuf.

— O que você quer maldito! – gritou ainda enfurecida segurando com força o cabo da cimitarra.

— Propor a trégua, não há motivos para você continuar com a rebelião – gritou com voz cordial — Seu irmão, Sheik do clã, pediu perdão para o Emir o qual generosamente concedeu.

— Mentes animal imundo! – gritou de volta.

— Se não acreditas, veja por si mesma – respondeu jogando dois pergaminhos que caíram antes da barricada.

Antes que Jamila saltasse, Brunilde tomou a frente e passou pelos espigões pegando as mensagens e voltando rapidamente.

Jamila recebeu-os e os observou atentamente, no primeiro havia um lacre de cera rompido, mas ela reconheceu como o mesmo que usara para enviar uma carta para Juan com seus filhos. Ao abrir constatou que era a letra irregular de seu irmão. A mensagem relatava que ele era aliado do rei cristão que lhe cedera um castelo na fronteira dos reinos, mas que desejava se aliar ao Emir para, juntos, se voltarem contra o Reino das Astúrias.

— Como ele pôde fazer isso? – disse incrédula para Yusuf que pegara o pergaminho para ler.

O segundo estava lacrado e ela reconheceu o selo do Emir, ao abrir havia uma mensagem curta avisando-a que ela e seus soldados haviam sido perdoados, em razão do acordo de paz que ele celebrara com Mahmud.

— Como vê, não há motivos para lutarmos, por isso deixarei este local para que você e sua tropa possam partir em paz – gritou e virou sua montaria para voltar à suas tropas.

— Volte e me enfrente maldito! – rugiu sentindo lágrimas de ódio e decepção aflorando em seus olhos.

— Talvez outro dia – gritou Jamal em meio a uma gargalhada sem se virar.

Quando ele desapareceu com seus cavaleiros ela olhou em volta, todos a encaravam com expectativa, sabia que podia contar com Brunilde, Yusuf e suas guerreiras, mas os demais soldados possuíam famílias em Mérida e Trujillo, a chance de paz era uma tentação grande demais.

— O que vamos fazer? – perguntou Yusuf.

— Disperse todos, que voltem para suas casas, eu irei até meu irmão para confrontá-lo – decidiu contraindo o maxilar e apertando com força o cabo da cimitarra até os nós de seus dedos ficarem brancos.

A GUERREIRA INDOMÁVELOnde as histórias ganham vida. Descobre agora