'Ange'
Tranquei-me em um box abaixando a tampa do sanitário, me sentei e apertei minha cabeça entre minhas mãos fechando os olhos com força enquanto tentava respirar.
-Merda, merda... - eu sussurrava balançando a cabeça de um lado para o outro. Lance não está aqui para me ajudar, eu queria correr para a sala dele e me jogar em seus braços para que me abraçasse e me dissesse que ia ficar tudo bem, mesmo nem sabendo o que havia de errado! Mas tudo estava errado! Tudo!
O que estava acontecendo com a empresa, como uma pessoa podia ter a coragem de prejudicar essas duas famílias maravilhosas? Agora meu tio estava chegando a menos de cinco dias e eu nem ao menos sabia o que ele queria, e estava com medo... muito medo do que ele poderia fazer a mim a Chris e a Lance! Deus ele ainda podia ser um louco vingativo...
E ainda tem meus sentimentos por Davi e o que fizemos e como eu ao mesmo tempo gostava e então odiava que eu era fraca e que eu estava mesmo cedendo de todas as formas para um homem como Davi, ele é um chefe desprezível, um homem pior ainda e ainda sim... e agora Mike e sua mãe estão farejando que há algo entre nós e tudo pode ficar ainda pior!
Que imagem Maria vai ter de mim ao saber que estive fodendo com seu filho que é meu chefe?... isso é absolutamente antiético e nenhum pouco profissional, com certeza, ela falaria sobre isso com George e todo o orgulho que esse homem incrível sentia de mim acabaria, tudo ia acabar!
-Angela? - ouço Maria chamar do lado de fora, seu tom mostra o quão preocupada ela está e isso me faz gemer frustrada. Por que tinha que ser uma pessoa tão boa? - querida, você está bem... precisa de... alguma coisa? - pergunta e vejo seus pés em sapatos de grife de saltos debaixo da porta, sua pergunta me fez bufar, ela devia achar que estava a beira de um ataque, mas para a minha surpresa até eu estava lidando bem com a tensão e os tremores e conseguia mantê-los sobre controle assim como minha mente que nem dava sinais de voltar com as lembranças ruins.
-Não, eu estou bem Maria, obrigada por se preocupar... eu só precisava... de um pouco de ar eu acho! - digo num suspiro olhando em volta e vendo quão ridículo era tomar ar em um banheiro e ainda sem me levantar ou querer sair para encará-la.
-Eu realmente sinto muito por toda aquela... aquela... coisa em sua sala! Eu só queria dizer que seja o que for toda essa coisa, vocês se resolvam, eu amo muito vocês e não quero que nada de ruim aconteça! Sei que são adultos e espero que saiba o que estão fazendo por que... - ela se cala quando eu estava de pé abrindo a porta decida.
-Não há coisa alguma Maria! - digo mantendo minha voz firme decida a tornar real minha frase. Não há coisa alguma, ou pelo menos, não haverá mais! Davi e eu já fomos longe demais com isso e tenho que fazer isso acabar! Maria me observa com uma sobrancelha arqueada desconfiada, cética, mas eu mantendo minha postura e meu olhar firme que dão muito a entender que estou falando a verdade... ou uma meia verdade, não importa!
-Tem certeza? - pergunta inclinando a cabeça levemente, estreitando seus olhos azuis para mim por um segundo, só para suspirar e dar um passo para trás logo depois. - desculpe, estou pressionando você novamente! - diz me olhando com pesar e esse é um dos vários motivos porque escondo que tenho qualquer problema psicológico, ela nem ao menos sabe o que eu tenho e me olha como se eu fosse uma criancinha que acabou de perder os pais! Eu não gosto disso, não preciso disto! Olhe para mim, estou bem, sou bem sucedida... tinha uma vida ao menos tranquila há alguns dias, então não há necessidade de sentir pena ou medo ao falar qualquer coisa comigo!
-Tudo bem Maria, de verdade eu estou bem, não precisa se preocupar não é como se eu fosse surtar, por favor, relaxe eu não gosto de colocá-la numa situação tensa ou complicada só porque tem medo do que possa acontecer! Vai saber quando eu estiver com algum problema! - digo olhando de minhas mãos para ela me sentindo nervosa que tenha colocado tudo isso para fora e em um banheiro. Ela volta a suspirar e passa os dedos através de uma mexa de meu cabelo, eu sei que ela quer me abraçar e fico feliz que tenha se contido porque em se tratando de minha mente é melhor não arriscar!
-Tudo bem, eu sei como posso ser intrometida às vezes, sinto muito de verdade! Mas tem certeza mesmo? - pergunta ela me encarando nos olhos com toda a atenção do mundo, eu suspiro também e tento não desviar meus olhos dos seus quando respondo.
-Sim tenho, não há coisa alguma! - digo tentando não vacilar na voz ou no olhar, Maria me olha em silêncio por alguns segundos buscando alguma coisa em meu rosto, parecendo convencida de algo ela abre um pequeno sorriso que me pareceu bem triste, mas antes que eu dissesse qualquer coisa ela deu mais um passo para longe olhando em seu relógio de pulso.
-Bom, então eu te espero para o almoço no mesmo restaurante! - diz mudando completamente a postura e parecendo outra vez animada sendo esquecido toda a tensão anterior, eu abro um sorriso tentando parecer tão animada quanto ela.
-Claro, estarei lá!
***
Voltei para minha sala evitando falar com Lucy pelo menos por enquanto, eu tinha muita coisa para fazer e não queria me distrair com qualquer outra coisa que não fosse trabalho!
Maria ficou com Mike e Davi na sala dele por mais alguns minutos enquanto eu me concentrava na agenda pessoal de Davi. Maria se despediu com um até logo ao passar mais uma vez por minha sala e Mike recebeu dois olhares fulminante, o meu e de Davi, quando ele abria a boca, por isso ele apenas se encolheu e saiu da minha sala com um baixo 'desculpe' e voltou a sua própria sala e então ficamos somente Davi e eu.
-Está tudo bem? - pergunta Davi depois de um minuto tenso de silêncio, ergo meu olhar do computador para vê-lo cruzando os braços me olhando com as sobrancelhas levemente franzidas.
-Sim! - respondo soando um tanto seca, voltando a olhar para meu computador verificando para que pessoas ligar para reagendar tudo o que fosse possível. Eu queria manter minha palavra dessa vez, de não ceder a qualquer coisa em relação a Davi e manter distância e depois de toda a merda que quase aconteceu com Mike e a mãe, nenhum olhar quente de Davi estava me fazendo mudar de ideia sobre isso!
-Está mesmo bem? - insiste Davi, eu respiro fundo e fecho os olhos antes de abri-los para voltar a encará-lo, ele agora arqueou a sobrancelha e me olha um pouco confuso, acho. Eu só quero que saia! Não suporto olhar para seu rosto, é como se eu fosse um daqueles cachorrinhos que ficam na porta do açougue vendo o frango girar enquanto é assado e sabe que jamais vai ter um pedaço daquele maldito frango! É frustrante, irritante, decepcionante e todos os 'antes' existentes! Eu só quero um descanso dele e do que sua presença faz comigo!
-Sim, senhor Collins eu estou ótima! - digo irritada erguendo as mãos exasperada antes de batê-las contra a mesa, Davi ergue as sobrancelhas um pouco surpreso.
-Por que esse tom? - pergunta fechando gradualmente sua expressão até tê-la completamente carrancuda e ainda mais sexy. Gemo interiormente com esse pensamento.
-Que tom? - pergunto cada vez mais irritada por ele ainda estar aqui me atormentando em todos os sentidos possíveis.
-Esse! - diz apontando para meu rosto.
-Não sei do que está falando! - digo fria voltando a olhar para o monitor tentando manter o controle dos meus batimentos cardíacos, mas claro que era impossível eu fazê-lo desacelerar... e odeio essa falta de controle!
-Angela... - seu tom parece pedir alguma coisa, mas eu apenas dirijo meu olhar indiferente e apagado a ele novamente.
-Collins! - digo sem qualquer emoção, Davi suspira irritado e aparentemente frustrado e passando as mãos no cabelo do lado da cabeça se vira para sair finalmente de minha sala e meu suspiro de alívio, foi alto suficiente para que me lançasse um último olhar e engoli em seco ao ver um pouco de tristeza neles, como se tivesse de algum jeito o magoado, um nó se forma em minha garganta e mil e uma palavras vem a minha mente para pedir desculpas, mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa bate a porta com força ao entrar em sua sala.
Minha pose indiferente desaba e eu caio contra o encosto de minha cadeira com um suspiro junto de um gemido e uma estranha vontade de chorar e nem sei por quê! Talvez o olhar no rosto de Davi... eu não sei também porque ele se magoaria com minha atitude, ele faria o mesmo comigo sem pensar duas vezes e também não é como se fossemos nos tratar diferente só pelo que aconteceu entre nós! Ele sabe que não é assim tão simples, ele viu o quão perto chegou de sermos pegos e se isso acontecesse seria um escândalo horrível e as coisas com a empresa só piorariam... estaríamos expostos e não precisávamos de mais essa merda para lidar... Davi com certeza sabia de tudo isso, ele entenderia... ele vai entender que não podemos mais continuar com qualquer coisa que tínhamos, porque não houve e não há coisa alguma!
Depois que Davi saiu de minha sala só falei com ele por telefone e para avisá-lo porque Lance não havia vindo ao trabalho, ele foi grosso comigo como se eu tivesse culpa pelo que aconteceu a Chris... bom nós discutimos sobre isso e, por fim, ele desligou na minha cara e eu voltei bufando para meu trabalho.
O almoço com Maria foi tranquilo, ela graças a Deus, agia como se nada tivesse acontecido e fiquei feliz ao saber o tema que ela escolheu para o baile beneficente.
-Eu particularmente gosto da década de cinquenta, gosto da ideia das roupas e tudo mais... mas não sei o que meus quadros terão a ver, quero dizer é um baile e não um leilão ou uma exposição de arte! - digo enquanto mexia minha comida quase toda intocada no prato, Maria arqueou a sobrancelha para mim e sorriu sarcástica.
-Um baile ou um leilão tanto faz! Eu quero expor seus quadros, você tem algumas pinturas lindas da cidade a noite que eu compraria com certeza... mas pensei que já havíamos discutido sobre isso! - diz ela me olhando significativamente, eu suspiro derrotada.
-Tudo bem, desculpe ter voltado com essa discussão! Só estou um pouco nervosa!
-Não se preocupe Ange - diz ela sorrindo abertamente bebendo seu vinho branco logo depois, a forma como disse meu apelido e me lançou um olhar de esguelha como se quisesse observar minha reação me deixou curiosa e confusa, até eu me lembrar de que foi como Davi havia me chamado quando sai correndo de minha sala e pensar nisso me fez sentir um estranho aperto no peito e um incomodo no estômago principalmente quando me lembrei do olhar que ele me deu antes de sair... como se fosse doloroso para ele também ter que aceitar nos afastar, porque eu querendo ou não doía como bater em algum lugar, você não escolhe se bater o cotovelo contra o registro do chuveiro vai doer ou não, a dor é simplesmente inevitável! E tudo fica ainda pior ao me sentir assim, porque só dá uma certeza maior que realmente sinto algo pelo cretino do Davi. - de qualquer forma, amanhã terá que sair mais cedo do trabalho, assim como na quinta e na sexta claro, já falei com Davi e depois de muita insistência consegui que cedesse! - diz me oferecendo uma piscadela, eu abri um sorriso surpreso já que Davi é tão cabeça dura, mas o que Maria não era capaz de conseguir?
-Um brinde a isso! - digo erguendo minha própria taça de vinho e ela choca a sua com a minha e sorrimos enquanto bebemos.
Depois do almoço liguei para Lance para saber como ia tudo e fiquei feliz em saber que Chris e o bebê estavam bem e já estavam voltando pra casa, não conversamos por muito tempo, primeiro porque ele parecia ocupado com alguma coisa que fazia Chris soltar risinhos ridículos e eu apenas revirava os olhos e sorria sem conseguir me segurar, estava absurdamente feliz por eles... claro que ainda tinham muitas coisas para resolver e brigariam como cão e gato para o resto da vida, porque é assim que eles são, é assim que conseguem por o amor deles para fora é como dizem "Eu te amo", é louco e meio deprimente se for pensar bem, mas é como funciona para eles então estou feliz!
Segundo porque Davi estava sendo um completo cretino comigo como sempre foi, só que com o dobro de cretinice, se é que essa palavra existe. Eu não sei exatamente porque ele está tão bravo e vingativo comigo! Afinal quantas mulheres ele tratou da mesma maneira que eu fiz? Quantas ele foi um ogro rude porque elas insistiam em falar com ele e encontrá-lo? Eu não estava fazendo isso, não estava insistindo nem querendo ter algum relacionamento só porque tivemos sexo, não criei nenhuma esperança, menos ainda depois de tudo o que aconteceu quando recebi aquelas mensagens... sei que cedi a ele ontem na minha sala e disse que conversaríamos, mas ainda sim não seria para aceitar qualquer proposta sua...
"Não é você o desafio Angela... é um desafio autoimposto! Eu vou me testar provar a mim mesmo que sou capaz de ser 'um bom moço' e ai estarei pronto!". - as palavras de Davi inundam minha mente me fazendo parar de digitar e voltar a me encostar contra a cadeira, cenho franzido mordendo nervosamente o lábio inferior tentando entender que merda estava acontecendo!
Davi disse tudo aquilo por alguma razão que eu não consigo entender qual... eu nem deveria estar pensando nisso agora, devia focar no meu trabalho e me esquecer, pelo menos, por enquanto o que aconteceu, mas eu não consigo! Toda aquela conversa com Davi no meu apartamento soava tão maluca na hora quanto soa agora e eu não tinha parado para pensar nela claramente, talvez porque aconteceram coisas muito mais loucas depois, mas ele realmente se sentia daquela forma? 'Não realizado!?'.
Realmente acreditava que eu poderia mudar alguma coisa? Ele sentia mesmo algo por mim a ponto de assumir um relacionamento abrindo mão de todas aquelas mulheres gostosas com quem ele sai? Qual era ou é o objetivo de Davi Collins? Ele queria mesmo estar pronto para um relacionamento comigo?
Mas então vai tudo por água abaixo depois que mexeu em meu celular... mas a raiva de Davi não parecia somente porque acreditava que eu estava roubando seu banco e sua família, era uma raiva violenta demais... Ele suspeitava que B era meu amante... estaria Davi com ciúmes? Ou só com medo de um homem estar por trás de minhas suspeitas ações? É tudo tão confuso!
Ou eu só estou procurando mais desculpas para afastá-lo?! Ele não parecia estar brincando, nem fazendo algum jogo comigo quando disse todas aquelas coisas tanto domingo de manhã, quanto a noite! Ele estava sendo sincero... e mesmo depois das mensagens de meu tio, a forma como parecia tão magoado que estava furioso me dizendo todas aquelas coisas horríveis me fez acreditar que tudo estava mesmo acabado, mas... ele então sussurrou contra minha orelha que eu era dele, mas o que isso significava para ele? Ele realmente me queria para ser dele? Queria dizer que não importava a ele se 'B', era meu amante, que lutaria por mim? Bom ele tem lutado muito bem... com muita força e eficácia...
Mas eu queria ser dele? Uma grande parte gritava SIM, mas mesmo que a outra seja menor, ela gritava mais alto e histericamente, tinha pupilas tão dilatadas que você não era capaz de saber a cor real de seus olhos, você só via a escuridão da insanidade, só via a dor, medo... loucura... e ela gritava NÃO!
Gritava que eu não era capaz de amar, que ninguém nunca me amaria por completo... ninguém merecia conhecer essa parte de mim! Eu ainda não era louca como minha mãe, só tinha alguns intensos ataques de pânico... eu me lembro de como minha mãe mudava de uma mulher cantarolando na cozinha fazendo bolo para uma mulher furiosa quebrando a cozinha toda.
A intensidade da doença dela era diferente das mais conhecidas, ela não ficava extremamente depressiva de uma hora para outra, ela ficava com raiva, ela ficava violenta e perdia o controle de si mesma... eu me lembro de ter sete anos e dizer que eu tinha duas mães, porque ela, quando voltava do surto não conseguia se lembrar bem do que ela havia feito e pedia desculpas e voltava a ser a mulher amorosa e carinhosa que eu amava, mas então no momento seguinte ela era a megera, a madrasta má que eu odiava...
Eu ainda não sou assim, os médicos disseram que eu tenho o gene capaz de desenvolvê-lo no entanto eu ainda não o desenvolvi... ainda, mesmo depois do que passei o que seria gatilho suficiente para desencadear o transtorno, mas talvez porque meu cérebro está ocupado demais com meus ataques de pânico! Talvez esses ataques é que mantém longe da completa insanidade... talvez...
De qualquer forma eu não posso arriscar ter qualquer tipo de relacionamento, menos ainda com alguém como Davi, como ele poderia entender? Como EU poderia fazer com ele o que minha mãe fez com meu pai? É só uma questão de tempo até eu ter meu primeiro surto realmente bipolar e eu não quero fazer ninguém sofrer como eu vi meu pai sofrer, como eu e Josh sofremos...
Por isso, mesmo que Davi seja capaz de ser tornar um 'bom moço' jamais seriamos um casal, e se ele, mesmo que remotamente, não estava falando a verdade, podia até doer um pouco pensar que ele estava me enganando e iludindo, mas a dor era amenizada pelo fato de ele não estar afim de alguém como eu, tornando mais fácil e seguro dizer não!
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[N/A: Deixei esse cap. com os pensamentos da Ange pra ficar claro porque ela quer se afastar, porque ela sente que não pode e não deve ficar com Davi, dito isso, todas as outras partes sobre esses sentimentos vão ser excluídos, porque todo mundo já entendeu!]