Capítulo 3 - Retrato.

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Capítulo 3 — Retrato.

Era terça-feira e Carlos saía da academia após o seu expediente, já com um objetivo, procurar novamente Fernando. Estava determinado a encontrá-lo, então enquanto andava pelas calçadas, olhava tudo em volta, torcendo para que ele estivesse na mesma rua que das outras vezes.

O instrutor suspirou aliviado quando virou a esquina, vendo o andarilho sentado sobre alguns papelões, encolhido.

— Eu vim ontem e não te vi, pensei que tivesse ido embora daqui. — Carlos se aproximou, abaixando-se na altura dele.

Não quis confessar o medo que teve de não vê-lo, com receio de que tivesse acontecido alguma coisa, não era nenhuma novidade sobre todos os riscos que ele corria ao estar nas ruas, mas também não tinha coragem de entrar nesse assunto com ele.

— Eu só saio daqui para ir ao banheiro público na praça.

— Ah! — O instrutor coçou a nuca. — Eu devia ter esperado aqui.

— Foi você, não foi? Que deixou a comida aqui...

— Sim, eu já ia perguntar se você encontrou... Tava tudo gostoso?

— Por que está fazendo isso? — Fernando indagou, desconfiado.

— Hã? — Perguntou, sentando-se no chão ao lado dele. — Não entendi.

— Por que está perdendo o seu tempo comigo? Eu fui rude com você semana passada e agora você está aqui de novo.

— Eu já te disse, quero te ajudar, não precisa ficar na defensiva.

— Eu não estou na defensiva. — Encarou-o.

— Bom, eu vou comprar algo pra você comer então, o que você gosta?

— Não. — Tocou o seu ombro, quando Carlos fez menção em se levantar.

— O que foi?

— Não precisa. — Afirmou, seriamente. — Eu já sei que, no fim das contas, não terei condições de retribuir nada disso. E eu não quero nada que eu não possa pagar.

— Por favor, Fernando... Eu só quero poder te ajudar. — Carlos insistiu, suspirando. — Eu sei que naquele dia eu também me exaltei e fui embora bravo, mas não queria que fosse assim... Eu fiquei muito pensativo sobre tudo e também queria te pedir desculpas.

— Não tem que se desculpar por nada. — O andarilho apoiou as mãos sobre os joelhos.

— Mas então... Me fala mais sobre você, como era ser um artista nas horas vagas? O que você fazia?

— Não tinha nada de interessante, se quer tanto saber. — Ergueu os ombros, mal querendo recordar-se do passado. — Eu fazia de tudo, quadros com tinta a óleo, escultura com diversos materiais, nada demais.

— Nada demais?! — Carlos ergueu as sobrancelhas. — Eu queria não ser "nada demais" assim também! Como pode conseguir fazer tantas coisas? Eu mal lembro de todas as áreas que estudei na faculdade...

— Eu não era bom em tudo, mas estava sempre estudando e praticando, basicamente era o meu único passatempo. — Fernando abriu um sorriso sincero e doloroso.

— Eu adoraria ver mais do seu trabalho. — O instrutor o encarou por alguns segundos. — Você disse que pintava, então deve desenhar também.

— Eu tento...

— Olha, Fernando, eu já volto, está bem? Vou comprar um prato feito pra você e voltar aqui pra gente continuar conversando. — Carlos se levantou, ajeitando a roupa.

Indigente [COMPLETA]Where stories live. Discover now