Indigente [COMPLETA]

By OkayAutora

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Em meio à olhares tortos de reprovação vindo dos clientes, apenas um olhar era de compaixão quando um andaril... More

Capítulo 1 - R$ 1,45.
Capítulo 2 - Arte.
Capítulo 3 - Retrato.
Capítulo 4 - Trajes.
Capítulo 5 - Frio.
Capítulo 6 - Grãos.
Capítulo 7 - 38.
Capítulo 8 - Tempo.
Capítulo 9 - Humano.
Capítulo 10 - (Res)sentimento.
Capítulo 11 - Decisão.
Capítulo 12 - Recado.
Capítulo 13 - Rumos.
Capítulo 14 - Acolhimento.
Capítulo 15 - Insegurança.
Capítulo 16 - Recomeçando.
Capítulo 17 - Habituando.
Capítulo 18 - Provocação.
Capítulo 19 - Compensação.
Capítulo 20 - Aliviar-se.
Capítulo 21 - Despertar.
Capítulo 22 - Proteger.
Capítulo 23 - Início.
Capítulo 24 - Infância.
Capítulo 25 - Presente.
Capítulo 26 - Dilacerado.
Capítulo 27 - Arrependimento.
Capítulo 28 - Irremediável.
Capítulo 29 - Escolha.
Capítulo 30 - Distância.
Capítulo 31 - Inacessível.
Capítulo 32 - Flashback.
Capítulo 33 - Inconsistente.
Capítulo 34 - Esperança.
Capítulo 35 - Esperar.
Capítulo 36 - Conquista.
Capítulo 37 - Saudosista.
Capítulo 38 - Diálogo.
Capítulo 39 - Queda.
Capítulo 40 - Romantismo.
Capítulo 41 - Necessidade.
Capítulo 42 - Transparente.
Capítulo 43 - Solucionando.
Capítulo 44 - Festejando.
Capítulo 45 - Reivindicando.
Capítulo 46 - Cuidando.
Capítulo 47 - Retorno.
Capítulo 48 - Vínculo.
Capítulo 49 - Elo.
Capítulo 50 - Calúnia.
Capítulo 51 - Testemunha.
Capítulo 52 - Convite.
Capítulo 53 - Negócios.
Capítulo 54 - Coragem.
Capítulo 55 - Namorando.
Capítulo 57 - Comoção.
Capítulo 58 - Ciclos.
Capítulo 59 - Prestígio.

Capítulo 56 - Sociedade.

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Capítulo 56 — Sociedade.

Quarta-feira, 26 de outubro.

Carlos se levantava de manhã e vestia o robe do hotel. Encontrou-se com o seu artista saindo do banheiro e recebeu um beijo, ouvindo-o dizer:

— Bom dia, dormiu bem?

— Como um bebê. — O instrutor riu baixinho e retribuiu o beijo. — E você?

— Melhor impossível. Quer ir tomar café?

— Vou só me arrumar e aí já vamos.

Carlos terminou de ficar pronto, vestindo as roupas que Fernando tinha escolhido para ele. Nem sabia como o namorado poderia lhe conhecer tão bem, fazendo suas malas com tudo o que ele realmente usava e precisava.

— Tô pronto. — O instrutor afirmou, pegando seu celular no mesmo momento em que ele começava a tocar. — Espera um pouco, Nando. O Edu tá me ligando.

— Tudo bem, pode atender. — O artista sentou-se no sofá do quarto para esperá-lo.

— Alô? — Carlos aceitou a chamada, colocando-a no viva-voz.

— E aí, cara? Quer ouvir a novidade? — Eduardo falou, empolgado.

— É claro que sim! Você falou com o Samuel? — O instrutor falava ao celular enquanto andava, agora parando para se sentar ao lado do namorado.

— Ele aceitou nossas condições. É isso, a academia é nossa. — Eduardo falou, fazendo o coração do amigo acelerar.

— É sério?! — Carlos se empolgou, vendo que o namorado abria um sorriso ao ouvir aquilo.

— Ele vai segurar o primeiro aluguel pra gente poder dar entrada nos equipamentos e deixar as coisas prontas pra gente poder abrir. — O amigo explicou pela chamada, curioso para saber qual seria a expressão do outro agora.

— Eu nem acredito, nossa... — Carlos passou a mão pelos cabelos.

— Eu tô indo pegar a chave com ele e mais tarde a gente pode ir pra lá, o que acha?

— Já tá combinado. — O instrutor riu de animação.

— Parabéns, sócio. — Eduardo falou, em tom brincalhão. — Manda um abraço pro Fernando por mim.

— Ele tá aqui do lado. Fala "oi", Nando. — Carlos estendeu o celular para o namorado.

— Oi! — O artista disse. — Meus parabéns!

— Valeu! — Eduardo riu baixinho. — Te vejo mais tarde, hein!

— Até mais! — Fernando falou, feliz pelos dois.

Carlos terminou a chamada após alguns segundos e ainda olhava para o celular, completamente surpreso.

— É, agora não tem mais volta! — Riu empolgado.

— Eu tenho muito orgulho de você. — Fernando aproximou-se do instrutor, beijando-o na testa. — Parabéns, amor.

Carlos sentiu seus lábios tremerem ao abrir um sorriso emocionado e o abraçou com força, desengonçado por estar no sofá.

— E eu queria te falar uma coisa. — O artista interrompeu o abraço para olhar para ele.

— O que, Nando?

— Você se lembra de que te disse ontem que eu paguei todas as nossas contas?

— Sim. Mesmo você não precisando, porque eu já te disse que ia fazer isso quando recebesse a rescisão do contrato. — Carlos torceu o canto do lábio.

— Eu sei, eu sei. Mas eu também queria que você soubesse que ainda sobrou um bom dinheiro e eu vou deixar ele todo com você... — Fernando afirmou, vendo o olhar completamente surpreso do outro.

— Como assim? — O instrutor disse, ainda com os olhos arregalados.

— O meu dinheiro é seu. — Reforçou, sorridente. — E o que eu mais quero agora é te apoiar nos seus sonhos, assim como você me apoiou.

♢♦♢

Carlos parava de dirigir ao chegar no endereço do seu novo empreendimento. Eduardo havia avisado que já tinha chegado, então já podiam entrar.

— Aqui parece ser um ótimo espaço. — Fernando falou, descendo do carro.

— E é mesmo. Não é pequeno, mas também não é gigantesco, então acredito que vamos conseguir administrar bem. — Carlos alarmou o veículo, caminhando para a entrada.

O artista olhou melhor para o exterior. O nome antigo da academia já estava desbotado e as paredes de fora precisavam de uma boa pintura. As portas de vidro deram as boas-vindas para eles e conforme entravam, ele podia olhar melhor.

Passaram por um curto corredor, com uma pequena recepção em frente antes de seguirem para o amplo espaço. A academia tinha poucas paredes separando as categorias, um espaço para as esteiras e bicicletas, outra região um pouco mais livre à frente para treinos funcionais e outra região com as estações de musculação e outros equipamentos.

Eduardo estava próximo de um grande bebedouro e ao notar a presença do casal ali, parou o que fazia.

— Oi gente. — Andou até eles, mostrando o que segurava. — Já comecei a arrumação por aqui. Tô trocando os filtros velhos enquanto sigo um tutorial da internet, espero que dê certo. E aí, o que acharam do espaço?

— Eu já conhecia de antigamente, mas não tinha visto algumas das reformas que o Samuel fez aqui. — Carlos respondeu, sem deixar de sorrir.

— Eu também gostei, não precisa de muito trabalho. — O artista ainda olhava para os arredores.

— Eu só estava pensando se a gente deveria ou não mudar a disposição dos equipamentos. O que acham? — Eduardo quis saber, começando a andar com eles pelo ambiente.

— Pra começar eu acho que tá ótimo, com o tempo a gente vai descobrindo se precisamos fazer alterações. — Carlos analisou um pouco melhor. — Pelo menos, consigo me imaginar trabalhando aqui da forma que está.

— Eu também, pra ser sincero. — Eduardo também olhou para os equipamentos. — Não antes de uma bela limpeza, é claro...

— Mas e quanto ao nome? — Fernando perguntou, curioso. — Vocês já escolheram?

— Confesso que eu ando sem ideias. — Eduardo voltou a dizer. — A Mô também tentou ajudar, mas ela também tá sem criatividade.

— Olha, eu pensei em um... — Carlos se pronunciou, chamando a atenção deles. — O que vocês acham de: Academia Adônis?

— Adônis? Tipo o cara bonitão da mitologia? — O amigo quis confirmar, para ver se realmente se lembrava do que se tratava.

— Ele mesmo. — O outro confirmou.

— Eu gosto, viu... Acho legal essa pegada histórica. — Eduardo continuou, pensativo. — E de onde você tirou a ideia?

— Ah... O Nando. — Carlos respondeu, segurando a vontade de rir enquanto o namorado olhava para si.

— Eu achei criativo. — O amigo voltou a dizer, agora olhando para o acompanhante. — E se você topar ajudar a gente, Fernando, dá até pra planejar algum mural na parede com algumas figuras da mitologia.

— Eu vou adorar. — O artista aceitou, olhando por um segundo para o dono da ideia.

— Gente, eu já volto. Acho que a Mô acabou de chegar. — Eduardo olhou em direção da entrada, podendo ouvir um carro estacionando.

Carlos e Fernando ficaram sozinhos quando o amigo foi até a frente do estabelecimento. Nisso, o instrutor ainda percebia um olhar diferente do namorado e pôde ouvi-lo dizer:

— Eu te inspirei a escolher esse nome, então? — O artista abriu um sorriso debochado.

— O Edu não precisava saber dos detalhes, mas sim... Você me inspirou de muitas formas ontem. — Carlos abriu um sorriso sugestivo, ouvindo o outro rir baixinho.

— Então eu fico feliz de ter ajudado. — Fernando segurou de leve no quadril do outro por um instante, aproximando-o para um beijo rápido. — Eu posso te inspirar quantas vezes precisar...

— Eu gosto da ideia. — Acariciou-o no ombro, também beijando mais uma vez antes de receberem companhia.

— Aqui é muito maior do que parece pelas fotos! — A voz de Monique agora soava pelo ambiente.

A blogueira surgia acompanhada não apenas do namorado, como de seu irmão e sua melhor amiga. Murilo não disse muita coisa ao cumprimentá-los, enquanto Michele explorava tudo ao redor. Eduardo atualizava os recém-chegados sobre o possível novo nome do local e as ideias sobre mitologia grega, quando foi interrompido.

Deixou os amigos para trás quando foi chamado por Murilo, o cunhado parecia ter algo importante para lhe dizer em particular, então aceitou o convite para conversar. Monique observou-os indo para longe, mas voltou sua atenção aos outros.

— E então? — Eduardo indagou ao irmão da namorada. — O que você quer me falar?

— Eu sei que foi uma surpresa me ver por aqui hoje, mas eu pedi pra Monique me trazer... — O cunhado disse, em voz baixa. — Eu precisava me desculpar com você.

— Por essa eu não esperava. — Respondeu, arregalando os olhos e mantendo o interesse no assunto. — A Mô te obrigou de alguma forma?

— Não, não obrigou. — Murilo voltou a dizer, suspirando. — Eu sei que você provavelmente ainda tem raiva de eu ter mentido sobre tanta coisa... Mas eu queria que entendesse que eu só fiz isso porque eu achava que estava protegendo a minha irmã de alguma forma, o que não era verdade.

— Que bom que você entendeu isso. — Eduardo falou, cruzando os braços.

— Eu me arrependo de ter te julgado, mas ela também não tem um histórico de bons namorados e eu não pensei direito... — O cunhado ergueu os ombros, olhando agora para baixo. — Eu não percebi que eu tinha feito o efeito oposto do que eu queria. Eu sei que você já sabe sobre isso, mas... Eu nunca vi a minha irmã tão triste quando ela estava longe de você.

— Se quer saber, também fiquei arrasado. Foi um dos piores períodos da minha vida... — Eduardo franziu o cenho, tendo que descruzar os braços. — Você sabe que eu amo mesmo a sua irmã, não sabe? Eu não faria nada pra machucar ela, nunca a trataria mal, nunca a trairia, nem abandonaria...

— Eu achava que você tava interessado no dinheiro dela... Só soube depois que você nunca nem deixou ela pagar quando vocês saíam. — Falou, vendo o outro rir.

— Ela é a minha princesa, não poderia ser diferente. — Disse, olhando para a expressão constrangida do mais novo.

— E eu sei que talvez não tenha como consertar e a gente nunca se dê bem de verdade. Mas eu queria erguer uma bandeira branca... Pra gente viver em paz. — Murilo colocou as mãos dentro dos bolsos da calça, ainda tímido. — Quero estar presente se possível. Quero ser convidado para os aniversários e não ser um estorvo por isso.

— Só os aniversários? — Eduardo quis saber. — Eu não quero que esteja presente só nos aniversários... Você diz isso, mas eu sempre quis ser mais próximo de você, cara. Quero que possa vir em todas as reuniões de família e amigos. E mais ainda, que você goste de estar com a gente. O que você acha?

Murilo agora não sabia para onde olhar, mas seu sorriso exibia que estava satisfeito, agora precisando responder:

— Pode deixar.

— Ninguém mandou ser um metido a besta. Senão não precisaria estar aqui me pedindo desculpas agora. — Eduardo riu mais uma vez. — Mas relaxa, cara. Acho que a gente vai conseguir superar essa numa boa.

♢♦♢

Até o final da semana, os mais novos sócios da academia tinham feito uma boa limpeza com sua equipe de voluntários. Os dias pareciam voar enquanto planejavam a grande inauguração e, se tudo desse certo, em poucas semanas já estariam funcionando.

Carlos estava no quarto de hóspedes vendo seu artista quase finalizar a pintura que tinha feito de si. E enquanto conversavam, puderam ouvir a campainha. O instrutor deixou o namorado pintando e o cachorro seguro dentro de casa, indo até o portão para ver de quem se tratava já que não esperavam ninguém.

Não acreditou quando viu o rosto familiar esperando próximo de um carro de luxo. E seu sangue ferveu antes mesmo que ouvisse os motivos da visita.

— O que faz aqui? — Carlos olhou para o homem, que parecia completamente constrangido.

— Eu vim falar com o Fer... nando. — Natan não queria parecer abusado em chamar o ex pelo apelido, então completou sua fala. — Ele está?

— Depende. O que você quer com ele?

— Olha só, eu não vou mentir... fiquei sabendo de toda a história pelos meninos. A Ana acabou contando pra eles e eu só queria confirmar... Pra saber se foi verdade. — O homem engoliu em seco, olhando para os próprios pés por um segundo.

— Que o Nando foi parar nas ruas por sua causa? — Carlos quis saber, enfatizando suas últimas palavras.

— Olha... se eu fosse desejar que algo assim acontecesse com alguém, ele seria a última pessoa que... — Fez uma pausa para respirar. — Eu nunca faria mal nenhum a ele.

— Mas fez. — O instrutor respondeu, ríspido. — Por que tá aqui?

— Então é verdade, né? — Natan esfregou o próprio rosto, agora parando para olhar para o outro. — Nunca imaginei que algo assim teria acontecido... nem nos meus piores pesadelos. Eu...

— Vai embora. — Carlos estreitou os olhos, cruzando os braços.

— Eu preciso falar com ele, eu sei que ele tá aqui. Por favor, eu só...

— Antes que você pense que eu não quero deixar você falar com ele por algum lance de ciúme ou algo do tipo, nem pensa nisso. Eu não quero que você fale com ele porque ele ainda sente muita raiva. — Carlos falou, firmemente. — Ele fala de toda a situação com muito amargor porque você apunhalou ele pelas costas, você foi covarde e cruel... E qualquer pessoa que magoou a ele, magoou a mim também.

— Eu sei o que você fez por ele e eu também queria te agradecer... eu sei que pode ter ouvido coisas ruins sobre mim e eu entendo. — O recém-chegado quis tentar apaziguar a situação, se esforçando para convencê-lo.

— Não preciso que você me bajule. — O instrutor franziu o cenho.

— Quero que saiba a verdade. Eu fiz sim escolhas ruins no passado e eu me arrependo disso... É por isso que eu queria me desculpar com ele! — Natan insistiu, dizendo mais alto. — Eu me importo com ele mais do que qualquer outra pessoa! Eu me preocupo com ele, de verdade! Eu me sinto péssimo!

— Eu não sei nem se você mesmo acredita nisso que você tá dizendo... Fala sério, cara. Você ficou noivo de uma mulher! Você por acaso sofre de esquecimento?! Ou é só um babaca por que quer, mesmo?!

— Eu não queria que toda essa tragédia tivesse acontecido, eu teria movido montanhas se eu soubesse que ele tinha ido pra rua, é sério! Eu não consegui dormir desde que soube disso e eu me sinto muito mal!

— Conta outra, tá? Você nem tentou ir atrás dele, ele não tinha ninguém, ele tava completamente sozinho... — Descruzou os braços, tendo que controlar a vontade de estapeá-lo.

— O que você faria se estivesse tentando consertar um erro do passado e se redimir com alguém por um ano inteiro e não conseguisse? Como você se sentiria?! Se coloca no meu lugar! — Natan voltou a dizer, sentindo sua voz ficar prejudicada.

— Em primeiro lugar, eu nunca trairia ele. Eu nunca faria isso com ele, porque eu o amo de verdade... Fala sério, como alguém consegue ficar oito meses com alguém como o Nando e não querer sequer assumir o homem incrível que ele é?! — Carlos exclamou, vendo a expressão do homem à sua frente se fechar. — Eu estou com ele há só alguns meses e já não vejo a hora de casar com ele... Você é maluco, é isso! Não sabia a raridade que você tinha e agora que percebeu quer tentar resolver de alguma forma... Eu entendo você, de verdade. Mas é muito tarde pra isso.

— Eu não queria que você me entendesse mal, Carlos... eu não quero atrapalhar vocês. — Natan fez sua última tentativa, se esforçando para sua voz não embargar.

— O Fernando já me disse muitas vezes que não tá pronto pra perdoar isso e não gosto do fato de você continuar forçando essa aproximação. Só aceita que você fez uma coisa muito errada e que poderia ter acabado de uma forma muito pior... — O instrutor interrompeu sua frase, não querendo sequer pensar naquilo. — Seja responsável pelo menos uma vez na sua vida e deixe ele em paz.

Natan mudou completamente seu semblante ao desviar seu olhar, vendo que quem estava interessado em ver agora surgia atrás de Carlos.

— Fernando! — Exclamou, ignorando a presença do instrutor.

O artista manteve o semblante fechado e apenas ignorou a felicidade do homem. Se aproximando de Carlos e ficando ao lado dele.

— Você ouviu ele. — Fernando apenas disse.

— Mas eu só... — Natan insistiu, dando um passo para frente.

— Vai embora! — Carlos tomou a frente, não deixando o outro se aproximar, empurrando-o para afastá-lo do namorado. — Você ainda não entendeu?!

Natan engoliu em seco, olhando para os olhos frios castanhos de Fernando sem nada conseguir dizer. Não gostaria de continuar se humilhando em vão, apenas tendo que finalmente aceitar. Carlos recebeu um olhar torto e viu a visita indesejada finalmente desistir e dar alguns passos para trás.

O instrutor permaneceu em silêncio enquanto voltavam para dentro. Fernando encostou o portão e Carlos olhou para baixo, ficando imóvel por alguns segundos, até tomar coragem de começar a falar.

— Nando, me desculpa... eu não queria ter me exaltado. — O instrutor passou a mão pelos cabelos.

O artista apenas tomou o namorado nos braços, sentia que não precisava dizer nada ao envolvê-lo em um abraço. Fernando fungou o perfume dele, se confortando ao ter o corpo dele próximo ao seu.

— Obrigado. — Apenas disse, ainda sem soltá-lo. — Por me defender.

Carlos subiu suas mãos pelas costas do outro, sentindo a respiração pesada do artista. Não deixou de abrir um pequeno sorriso, sorrindo por saber que ele se sentia seguro consigo.

♢♦♢

Três semanas depois, quinta-feira, 17 de novembro.

Os dias passavam e continuavam a trabalhar em seus projetos pessoais. A inauguração da academia mexia com todos os nervos de Carlos, ao mesmo tempo que precisava organizar sua agenda para o início do trabalho, já tendo alguns alunos interessados.

Tinha que também ajudar Fernando com suas páginas nas redes sociais, porque o artista agora recebia cada vez mais pessoas interessadas em seu trabalho e o perfil pessoal já não era mais suficiente para comportar todas aquelas pessoas.

Fernando precisou formalizar e agora tinha um perfil profissional e também estudava para saber como continuar crescendo na mídia. Praticamente toda semana era convidado para dar alguma palestra e novas encomendas surgiam. Era até mesmo necessário trabalhar paralelamente em projetos pequenos e outros relevantemente maiores.

— Que saco, eu esqueci de comprar o presente de aniversário do Edu e a festa dele já é amanhã. — Carlos suspirou, passando a mão pela testa.

— Você quer que eu vá na loja pra você? — Fernando deixou seu celular ao lado no sofá e encarou o namorado.

— Deixa que eu vou, eu sei que você também tá cheio de coisa pra fazer... — O instrutor fechou o notebook que estava em seu colo.

— E se a gente fosse amanhã cedinho? Faz tempo que não vamos fazer compras juntos... — Fernando sugeriu, recebendo um sorriso do outro.

— Eu gosto da ideia. Mas não me deixe esquecer que eu tenho que pegar o bolo que dona Cléo encomendou pro Edu. Ela não quer que ele desconfie de nada. — Carlos descruzou as pernas, sentando-se de frente para o outro.

— A gente vai chegar mais cedo na casa dela e vai dar tempo da gente arrumar tudo... Relaxa. — O artista acariciou o ombro do namorado, entendendo que sua preocupação não era apenas com a festa surpresa do amigo. — Esses últimos dias têm sido muito estressantes, mas a gente vai conseguir passar por tudo isso, eu sei.

— Eu só espero que todo esse trabalho que estamos tendo compense. — Carlos forçou um sorriso.

— Vem cá. Deita aqui. — Puxou-o para um abraço, fazendo com que ele pousasse a cabeça em seu ombro. — Eu já te conheço bem demais pra saber que você não é de ficar com a cara amarrada sem um bom motivo.

— Às vezes eu fico meio preocupado com o ritmo tão rápido que as coisas estão acontecendo... — O instrutor precisou suspirar, começando a sentir toques em seu cabelo. — Eu tô me sentindo muito pressionado pra fazer tudo dar certo com a academia, principalmente porque o Edu também depende disso e eu não quero desapontar ele.

— Você já se esqueceu de que, até agora, todas as coisas que aconteceram foram assim? Tudo sempre foi rápido com a gente. Parece anos, mas só nos conhecemos há pouco mais de três meses. — O artista continuou a afagar os cabelos compridos do namorado. — Então não vai ser diferente agora... E você não tem com o que se preocupar, porque você tá indo muito bem, eu já te disse isso.

— Você sempre foi uma certeza, Nando. Então com você era mais fácil. — Carlos levantou a cabeça do ombro dele o suficiente para encará-lo. — Agora em relação à academia, ainda tenho muito medo. A inauguração é daqui uns dias e o pessoal tá ansioso demais por isso... Não quero estragar tudo.

— Sua ansiedade te fez chegar até aqui, mas não deixe que ela te paralise. — Esfregou os ombros fortes do instrutor, conseguindo roubar um sorriso dele.

— E eu tenho medo de tudo isso separar a gente... Eu não quero que esse seja o preço a se pagar. — Carlos voltou a dizer, soltando outro longo suspiro. — Eu tô sentindo que a gente tá um pouco mais afastado que antes... Eu sei que é devido ao trabalho e tantas coisas que estamos lidando agora, mas eu não quero te perder.

— Eu duvido muito que isso vai acontecer. Mas se for te deixar mais tranquilo, poderíamos definir o quanto de tempo livre vamos tirar pra nós dois... — Fernando iniciou, recebendo um olhar curioso do outro. — Eu sei que a gente quer trabalhar um pouco mais para se planejar para comprar outra casa já que essa tá ficando pequena, mas podemos criar uma rotina pra ficar mais tempo juntos.

— Eu gostaria muito. — Carlos se aconchegou mais uma vez nos braços dele. — Mas se for pra te afastar, eu prefiro ficar nessa casa pequena mesmo. O dinheiro nem sempre traz felicidade.

— Nossas contas estão indo muito bem e o nosso relacionamento também. Não vai acontecer nada com a gente. — Fernando beijou o topo da cabeça do namorado, sem deixar de acariciar seus braços. — Tira isso da cabeça por enquanto, pensa que você vai ficar milionário e não precisar mais trabalhar.

— Milionário? — Carlos riu com ele, voltando a levantar sua cabeça.

— Exatamente. — O artista abriu um sorriso brincalhão. — O que você faria se ficasse rico agora?

— Rico quanto? Porque eu já tô achando que a gente tá bem endinheirado agora. — Carlos falou, brincalhão.

— Não, rico de verdade.

— Ah... Eu já falei com o Edu sobre isso uma vez. — Carlos sorriu, ligeiramente tímido em contar aquilo. — Eu queria fundar a minha própria instituição de caridade. Eu sempre vi o trabalho das ONGs de perto, sempre tentei ajudar algumas... Mas poder fazer parte disso de forma tão significativa seria meu sonho.

— Isso é mesmo a sua cara. — Fernando riu baixinho. — Eu admiro isso em você... Eu sou mais egoísta nesse sentido.

— O que você faria, Nando?

— Eu usaria o dinheiro pra investir em uma cerimônia de casamento super pomposa no Palácio de Versalhes. E uma lua de mel mais luxuosa ainda. — O artista respondeu, ouvindo o outro rir. — Também adotaria uns dois ou três pivetes e uma casa grande pra nós e pra eles... isso se você quiser filhos, é claro. Senão a gente dá alguns irmãozinhos de quatro patas para o Kid.

— Eu gosto da ideia de crianças. — Carlos não deixava de sorrir, vendo-o retribuir. — E também gostaria de ter mais cachorros, quero uma casa lotada... Só não faço questão da cerimônia pomposa.

— Eu sei disso, é que, pra mim, é o mínimo que você merece. — Fernando agora trazia a mão do namorado para perto de seus lábios, olhando para os dedos dele antes de depositar um beijo ali. — Sabe de uma coisa que eu acabei de perceber?

— O quê? — O instrutor perguntou, curioso ao ver que ele ainda olhava para seus dedos.

— Que eu cometi um grande pecado. — Afirmou, atiçando a curiosidade do outro.

— Ah, é? Qual? — Carlos perguntou.

— Que até hoje eu não te dei uma aliança de namoro... — Falou finalmente, fazendo o outro voltar a rir.

— Tá tudo bem... isso é pra adolescentes. — Carlos depositou um selinho nos lábios dele.

— Agora eu preciso corrigir esse erro... Acho que, pra isso, vou ter que te pedir em casamento e te dar uma aliança de ouro.

— Ah, isso é verdade. — O instrutor aceitou, fazendo o outro rir.

— Então é isso...

— Eu não vejo a hora, sabia? — Carlos murmurou, sem tirar os olhos do outro.

— Eu também mal posso esperar. — Fernando deu outro beijo sobre as costas da mão dele. — Quero muito me casar com você.

— Então pede... — Carlos apenas disse baixinho, sabendo que seus olhos estariam brilhando agora, quase implorando. — Só me pede.

— No momento certo. — O artista não deixou de dizer, sentindo seu coração aos pulos.

Carlos apenas retribuiu o sorriso gracioso que recebeu do namorado. Adorava aquelas demonstrações de afeto e sabia o quanto era amado, mesmo assim, às vezes ficava impaciente. Fernando queria esperar um momento certo que poderia ainda estar longe e o instrutor tinha pressa.

Carlos queria ser o marido daquele homem a qualquer momento, tinha certeza de que caso o artista pedisse para irem à um cartório naquele instante, deixaria tudo o que estava fazendo de lado e se casaria com ele sem nem pensar duas vezes.

Não entendia bem de onde aquela impaciência vinha, mas só sabia que o amava tanto, que seu peito queimava de amor a cada vez que estavam juntos. Nunca na sua vida teve uma certeza tão plena quanto aquela e foi só assim que foi capaz de entender muitas coisas.

Com seus antigos namorados, não queria acelerar o rumo natural das coisas. E nem mesmo toda a carência de André foi capaz de ganhar seu coração do jeito que Fernando fez.

Carlos também sabia que poderia muito bem tomar a iniciativa e o pedir em casamento, mas já havia deixado claro para Fernando que queria que ele o pedisse, então esperaria. Sentia-se um pouco mimado por aquilo, mas até mesmo aquilo era culpa do artista. Ninguém mandou que ele o paparicasse todos os dias, porque agora não esperava menos do que aquilo.

Seu coração se enchia de orgulho por Fernando estar conquistando de volta seu espaço no mundo e fazendo sua fama. E o artista gostava de se sentir importante, era nítida a mudança nele naquelas últimas semanas. E Carlos também sabia que agora o namorado não era mais dependente de si para todas as coisas como antes.

E a cada vez que o instrutor pensava naquilo, outro medo vinha em mente. Não sabia se esse seu desejo de oficializar o relacionamento com Fernando vinha do receio de ser abandonado ou se seus desejos eram puros.

Sabia que o artista conseguiria ter o que quisesse e agora Carlos poderia descobrir se o que tinham era forte o bastante para mantê-lo no mesmo lugar. Fernando gostava de viajar e tinha apreço pelas coisas refinadas da vida. Coisas essas que, mesmo que o instrutor se esforçasse, não conseguiria entender totalmente.

Tinha medo de que tudo o que tinham construído no relacionamento pudesse se esfriar agora que ambos estavam ocupados e seu coração se enchia de preocupação. Não queria perder Fernando, ao mesmo tempo que não queria impedi-lo de crescer.

Carlos ainda devia aquilo a ele e não poderia deixar seu egoísmo ficar no meio do caminho. Precisava apenas confiar nos olhos castanhos que sempre lhe passavam tanta calma. O amava tanto que, mesmo se Fernando precisasse de espaço, sairia do caminho dele. 

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