Capítulo 12 - parte 2 (em revisão)

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Igor corria em um trote intenso que poderia manter por horas a fio sem se cansar muito desde que recorresse aos seus poderes, como era o caso. Depois que a rainha das fadas lhe abriu a sensibilidade para ouvir a floresta, nada mais lhe escapava e, se não fosse a urgência da situação, ficaria embevecido com esse novo conhecimento, muito útil por ajudar a estender seus sentidos por quilômetros a fio. Ele imaginava como seria usar esse poder na floresta Amazônica onde os sentidos "ouviriam" tudo por milhares de quilômetros e decidiu que, oportunamente, experimentaria. Ao fim de quinze minutos, sentiu que estava próximo das criaturas e subiu em uma árvore, deslocando-se sobre ela para uma posição que lhe fosse favorável. Os homens-mola passariam por ali em breve e poderia atacar, pulando da árvore direto sobre o alvo. Igor já tinha notado que o conceito tridimensional deles era limitado e, de cima da árvore, não o encontrariam mesmo que berrasse feito um possesso. Não pôde deixar de pensar:

– "Agora vou virar um Tarzan de poderes mágicos." – Não resistiu à ideia e deu uma risadinha abafada.

Não precisou de aguardar muito quando a horda passou caminhando a passos largos e Igor calculou que fosse o equivalente da corrida deles. Para sua alegria, Shayla era carregada pelo último da fila, que devia ter ficado retardatário por causa do peso adicional. Pegou a espada e concentrou-se até que a lâmina começou a brilhar, emitindo um forte cheiro de ozônio e calor, mas o mago notou que sentiu alguma dificuldade pela proximidade com eles, talvez por causa do grande número de elementos. Ao mesmo tempo, alguns invasores pararam no mesmo ato, procurando a fonte de alimentação que deveria estar no meio deles.

Empunhou a arma de cima para baixo e pulou da árvore. A lâmina alcançou a nuca do adversário pelas costas e um cheiro forte de couro queimado surgiu no ar. Com a aceleração da queda mais os noventa quilos de peso do Igor, a criatura foi cortada ao meio, sem qualquer chance de defesa.

Igor soltou a espada e pegou Shayla, que caiu ao solo. Sem perder tempo, saiu a correr com ela no colo porque não conseguia se transportar, indo na direção oposta aos monstros e às fadas de modo a evitar que elas se tornassem um alvo, caso o perseguissem. Assim que saiu da vista deles, ergueu-se para cima de outra árvore e escondeu-se. Quatro dos muscolins voltaram para procurá-lo, mas, nesse momento, os pequeninos surgiram do outro lado e atacaram-nos, fugindo a seguir. Iludidos, os seres demoníacos foram no seu encalço, caindo no engodo.

– "Pode ir, irmão maior, que desviaremos a atenção" – disse um deles em pensamento.

– "Obrigado, irmão do bosque." – Igor não perdeu tempo, desceu da árvore e ergueu a mão, fazendo a espada retornar a si. Após, caminhou de volta porque, com ela inconsciente, era muito difícil correr e preferia poupar os dons, já que desconfiava que as coisas estavam bem longe do fim.

Andava com calma, mantendo a sua nova habilidade bem ativa, saboreando cada sensação que lhe chegava à mente. A mudança sutil que ocorreu perto dele não o pegou desprevenido porque sentiu um muscolin isolado, talvez retardatário ou ferido. Igor desejou fazer uma experiência e pousou a neta no chão, concentrando-se. Do nada, uma boleadeira surgiu na sua mão e ele começou a girá-la, primeiro devagar e depois acelerando bastante, esperando a criatura aparecer. Assim que a viu, arremessou a arma. A estrela formada pelas três cordas que giravam rápido por estarem presas a pesos nas extremidades formava um som baixo por causa da vibração do ar, mas a criatura não viu senão quando já era tarde demais para ela porque, usando os seus dons, as cordas aumentaram de forma gradativa e, quando alcançaram o inimigo, enrolaram-no, deixando-o bem amarrado. Imobilizado, o muscolin caiu ao solo e Igor aproximou-se, estudando a criatura.

Tentou focar a mente nela, mas só sentia uma onda de algo que lhe parecia ódio, contudo agora não estava tão certo de que fosse isso. Também sentiu o enfraquecimento que ele provocava nos magos e uma certa satisfação no monstro que parecia ser proporcional à perda da sua força, como se a criatura soubesse dela.

No fundo, ele desejava comunicar-se com as criaturas e ver se podiam chegar a um entendimento, só que não sabia como. Notou que eles se comportavam de forma organizada, mas, quando isolados, pareciam desprovidos de inteligência. Dando-se conta de que possuía um poder enorme à sua disposição, fez uma experiência simples: conectou-se a toda a floresta, concentrando-se naquela região. Sentiu de imediato que a sua sensibilidade era bastante incrementada e notou que, através da consciência coletiva do bosque, poderia alcançar a criatura porque ela só interferia nos humanos e no povo pequeno. De início, concentrou-se em ideias básicas.

– "Sou Igor" – disse –, "e você?"

– "Sou Muscolin."

– "Isso é o seu nome ou a sua espécie?" – perguntou por falta de melhor compreensão.

– "Tudo é Muscolin, sou Muscolin." – Foi a resposta, ainda mais confusa.

– "Por que nos atacam?" – perguntou. – "Não conseguem ver que sairão perdedores?"

Nesse momento, o pensamento dele tornou-se mais claro e definido, quase como se outra pessoa assumisse.

– "O que deseja?" – perguntou. – "Como se atreve a interferir em Muscolin?"

– "Sou Igor, e você?"

– "Sou Muscolin."

Igor concluiu que assim não chegaria a nenhum lugar.

– "Por que desejam invadir nosso mundo?"

– "Mundo? Isto é Musculin. Com se atreve a interferir?"

– "Vocês atacam e nós nos defendemos. O que querem?"

– "Quero comer." – A resposta era fria e sincera.

– "Será destruído" – advertiu Igor. – "Eu não permitirei."

– "Nada poderá fazer, alimento" – disse a criatura. – "Eu sou muitos, eu sou Muscolin. Quanto mais eu sou, mais forte fico e mais estável a porta, até que será permanente e vamos comer alimento."

– "Nesse caso, destruirei Muscolin" – disse, ameaçador. – "E vocês deixarão de existir. É isso que desejam?"

– "Muscolin é indestrutível."

Igor desconectou porque não adiantava nada argumentar. Ele já compreendera, devido à conexão mental, o que aquilo era e concluiu que se tornava imperativo destruir as criaturas o quanto antes. Se tomassem Avalon, poderiam alcançar a Terra e seria o fim da humanidade.

Decidiu abandonar a criatura à própria sorte e pegou a neta ao colo, retornando a caminhada para as fadas.

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Boleadeira – arma do sul do país usado para caçar nas pradarias ou capturar gado fugitivo. Consiste em três pesos presos a cabos (em geral cordas) que se juntam no outro extremo. O gaúcho ergue o instrumento, girando-o acima da cabeça e arremessa sobre o alvo. Os pesos vão girando e acabam prendendo a caça, como se amarrassem seus membros. N. A.

O Mago e a Sacerdotisa de AvalonWhere stories live. Discover now