CAPÍTULO 49 - O EXÉRCITO VERMELHO

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Corri em sua direção e amparei-a. Ela tremia e me olhava em choque.

- O.......o......que era aquilo! Falou atônita.

- Um demônio meu amor, conjurado das profundezas do inferno, segundo Zorn nos contou. Mas deixemos isso para depois, o importante agora é nos defendermos e cuidarmos de vosso pai, a batalha ainda não acabou!

- Mas antes, posso ver essas flechas?

Ela me passou a aljava e retirei uma delas. Saquei minha adaga e coloquei-as lado a lado. Sem entender como, minhas suspeitas se confirmaram, eram feitas do mesmo material. Mais um mistério dentre os muitos que cercavam o retorno de Marielle.

Recolhemos o general sob os cuidados de Marielle e Zorn na enfermaria do primeiro andar. De relance assisti condoído, Nohra Marie em um canto, chorando convulsivamente a morte trágica do pai. Eu, Gudruk, Zatik e os gêmeos fomos de encontro aos soldados restantes na beira da colina. De lá, assistimos por um instante, as valorosas tropas prussianas e o que restara dos lagartos na luta inglória de salvar o Capítulo e sobreviver. Não havia chance, estavam aprisionados por centenas de teutões numa barreira de escudos e lanças. Não consegui esperar, desci como um louco na direção da batalha, com as espadas em punho, que já não emitiam brilho algum. O restante me seguiu e mergulhamos todos naquela tempestade de espadas, machados e escudos. Por um tempo sem fim, lutamos sem pensar em nossa absurda desvantagem numérica. O esgotamento foi nos invadindo, tornando nossos movimentos lentos e nossos golpes leves. Respirava fundo tentando recuperar o fôlego enquanto olhava triste os amigos caindo um a um. O sangue, o suor e as cinzas desenharam uma máscara de sofrimento em nossas faces. Gritei desesperado buscando por Gudruk e Zatik,mas não os encontrei. Ao longe pude acompanhar os últimos momentos de Von Reynes. Cercado por vários inimigos, foi empalado várias vezes por lanças e espadas. Os Caninos e os Carcaju haviam sumido naquela massa soldados. Minha esperança sumiu junto com eles. Lutando cegamente, cercado por dezenas de teutônicos pensava no triste fim de todos nós. Seria injusto, seria desumano, seria tudo em vão. Perdido nesse turbilhão de pensamentos sombrios, não notei o teutão alucinado que corria em minha direção. Girei o corpo a tempo de receber apenas parte do golpe na lateral do abdômen. Amparei a região atingida enlaçando e cortando a lança na investida. O homem ainda tentou me acertar com o que sobrara do cabo partido, mas não teve chance, abri sua garganta com um único golpe. Sucumbido pela dor e pelo cansaço, olhei para os céus que já recebiam a aurora e implorei ao universo num grito de fúria, por auxílio e proteção. Sabia que não haveria resposta, mas, nada mais me restava.

E então uma trompa de timbre desconhecido se fez ouvir. Mais precisamente na entrada da passagem sul do vale. Levantei-me amparando a ferida e pude ver com clareza nas primeiras luzes da manhã, milhares de cavaleiros adentrando o vale dos acampados. À frente deles em sua armadura de guerra, brilhante e entremeada por cordões vermelhos vinha o rei Casemiro. Ao seu lado, dois cavaleiros traziam os estandartes do exército vermelho e de sua dinastia. O grande Reino da Polônia inacreditavelmente atendera nosso chamado.

Os lanceiros tomaram a frente do rei, e trespassavam todos os teutônicos que estivessem no seu caminho. Pelotões de arqueiros montados disparavam flechas certeiras que desfaziam lentamente o cerco de escudos em que fomos encurralados. Como que movido por um novo fôlego, parti para a luta. O ataque dos poloneses foi preciso e fulminante. Superavam em muito os teutões, tanto em número quanto em estratégia. Em algumas horas, as trompas teutônicas tocaram ao longe convocando a retirada das tropas e o retorno para a cidadela. Nossos homens vibravam enlouquecidos assistindo à retirada do exército inimigo. Caí de joelhos aliviado, sentia o sangue quente escorrer sob meu traje, mas estranhamente não havia dor. Um alívio que durou pouco, inexplicavelmente e num lampejo, tia Martha veio à minha mente. Ela chorava em um sofrimento indizível, o sorriso amplo e confortador dera lugar a um ricto de agonia sem fim. Tentei em vão dissipar aquela imagem pois a morte de tio Aldo me mostrara de modo inconteste, que essas visões eram de alguma forma verdadeiras. Eram revelações do porvir. De nada adiantou.

Rayd e a lua do caçador Volume 2 - O NecromanteOnde histórias criam vida. Descubra agora