Isabel García - Há doze anos

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Córdoba, há doze anos.

Isabel García

— O que aconteceu com o seu cabelo, cariño? — Meu padrasto perguntou no segundo que cheguei próximo na nossa pequena mesa de refeição.

Hoje havia leite e pão, um verdadeiro banquete.

— Um amigo meu o cortou. — Dei um pulo em direção a cadeira ansiosa por comer. — Não estás bravo comigo, papá?

José gostava de escutar tal designação correr para fora dos meus lábios, mas rara eram as vezes que o chamava de papá.

— Não. Fiquei apenas surpreso, Isabel. — Ele encheu um copo com o líquido branco que me fez salivar e o meu estômago vazio soltou um barulho alto. — Coma. Aquela sua consulta foi remarcada para hoje, lembra-te?

Mordisquei um pedaço de pão com apreço a afirmar positivamente com a cabeça sobre a consulta. Tentei comer devagar para aproveitar o máximo daquela que seria minha única refeição.

Quarenta e dois minutos depois de uma caminhada árdua estávamos num consultório muito escuro. As únicas pessoas no local era nós os dois.

— Passarei um tratamento para micose — O médico com um rosto inchado polvilhado por uma barba com múltiplos defeitos ditou para meu padrasto. — Isabel possui alguma alergia medicamentosa?

— Não sei informar, doutor. — José coçou a nuca a tentar misteriosamente saber de alguma informação que mamãe lhe confidenciou antes de nos deixar.

— Iniciaremos um tratamento a base de Fluconazol. Caso as lesões vermelhas e descamativas não desaparecerem em um mês, retorne ao meu consultório. — Assinou a receita sem ditar mais uma única palavra.

Fitei uma pequena mancha que surgiu na minha mão nos últimos dias, não poderia classificá-la como vermelha e descamativa, talvez aquele doutor tivesse que realizar uma consulta com um oftalmologista.

— Vamos, Isa. — José apanhou a receita médica, tinha a certeza que ele não tinha o dinheiro suficiente para pagar pela medicação.

No futuro, um diagnóstico preciso anularia o diagnóstico de micose, saberia que era portadora de vitiligo universal. Em outras palavras, setenta por cento da minha pele seria despigmentada.

— Quer um gelado de morango? — Mal poderia acreditar naquilo que ouvia.

— Não quero que gastes o seu dinheiro com...

— Consegui um bom trabalho, hija. Não faltará nada para ti, prometo. — Apertou ligeiramente os seus dedos entre os meus. — Morango ou chocolate?

Pensei nos deliciosos morangos que provei com as panquecas americanas no O Bistrô, salivei.

— Morango, papá.

José sorriu satisfeito.

Em Córdoba não há flores - Filhos Do Cartel Do Sul 1 Where stories live. Discover now