39° Um sinal...

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Marreco,

Depois da foda que dei com a Yanka, decidi sair pra tomar um ar. Na moral, fora as minas que comi enquanto estava puxando meus dias, não tinha pegado mais ninguém, só ela.... E foi estranho quando eu estava com a Yanka. Eu queria, queria foder com ela, senti tesão, meu pau ficou duro, mas na hora do bagulho, começou a me bater várias neuroses e comecei a me lembrar da Aline. Não tinha como, passei mó carão com a mina, brochei legal mesmo.

Pra não ficar na vergonha, consegui relaxar um pouco e compareci, fiz meu papel de sujeito homem. Tem nada pior pra homem do que brochar, meu parceiro. Mas na moral, o sexo não foi ruim, tá ligado? Mas também não foi aquelas fita... não sei explicar.

Tô agoniadão mesmo, saca? Precisando pensar, rever vários bagulhos, vários conceitos. Pego a XRE do Bico que estava na contenção, e digo que quero ficar sozinho, suave, pensar e relaxar. Quero dar um pião de moto, sentir o vento na cara, sem camisa, relembrando os velhos tempos. Ainda não descolei a minha, mas o que é dos irmãos é meu e o meu é deles. Geral tá ligado, fechamento cem por cento no meu bonde.

Ele e o Farinha estavam na contenção, mas dispenso os dois.

-Jaé, vamô bater uma sinuca no barzinho ali de cima então, patrão. -Farinha fala, animado.

-Vai lá, vai lá... Na paz! -Concordo e acelero  no talo, saindo voado.

Sinto a brisa bater e aliviar um pouco minha mente. Tiro o verdin do bolso da bermuda e paro num canto só pra acender. Quando volto a andar, decido ir bem de vagar, sentindo a onda da erva e curtindo o rolê pela quebrada onde nasci e cresci.

Por onde passo, tenho uma lembrança. Lembro dos amigos que se foram, lembro da minha avó, do meu pai, do meu irmão, da Aline...Conquistei o mundo, fiz meu nome, mas quem tá aqui do meu lado agora pra participar da minha vitória? Quem realmente foi importante na minha vida que permaneceu? Ninguém! Perdi tudo!

Pô, meus irmãos, meus crias, estão todos mortos, foram morrendo um  atrás do outro.- Enquanto piloto de segundinha com uma mão, com a outra vou fumando o back, entrando nos becos, imerso nos meus pensamentos.

Minha coroa se foi e eu sofri pra caralho, ela era minha segunda mãe. Meu pai se foi e eu sofri pra porra também. Perdi o contato com meu irmão e achei que tinha perdido a Aline; mas ela voltou. Parece que Deus me deu uma segunda chance e eu tô jogando tudo pro alto por causa de um orgulho besta do caralho!

A mina sofreu tanto quanto eu, ou mais, porque pra ela eu estava morto, o pai dela botou na cabeça dela que eu tinha morrido e ela cresceu revoltada, cresceu odiando o crime, odiando bandido. Fico pensando se fosse eu. Eu não fiquei louco, porque sabia que ela estava em algum canto, que tava viva, mas e se eu tivesse recebido a notícia de que ela tinha morrido? Eu iria aguentar? Certeza que eu tinha metido uma bala na minha cabeça.

Quando ela foi pra Rocinha não sabia quem eu era, mas quando descobriu, mesmo assim não parou, não me contou, não me chamou pra trocar uma ideia. Acho que se ela tivesse me chamado pra trocar ideia eu teria entendido, sei lá também...vai saber. Mas o que mais me deixou puto, foi ela não ter desistido. Eu passava dia e noite na tranca pensando nisso. Ela dizia que me amava tanto, mas não desistiu, continuou. Nem quando esmaguei a perna dela, ela contou quem era. Ela é foda...braba!

Só falou quando achou que ia morrer. E fiquei em choque, feliz em estar com ela ali, na minha frente, mais ao mesmo tempo bolado por descobrir o que ela fez. E tendo o peso de ela ser quem era, foi ainda pior. Ai, juntou o desespero de perder ela de novo. Mesmo depois de todos esses anos eu senti o mesmo desespero.

Porra, quantas vezes eu chorava igual criança a noite, olhando as fotos dela pregadas na parede do meu beliche. Ficava iluminando com a chama do isqueiro, pra não ter que acender a luz e acordar o Heliton. As vezes ele acordava com meu choro e me mandava calar a boca. Teve um dia que ele me abraçou --a gente não tinha essa coisa de melação, mas acho que naquele dia ele ficou com dó. Foi o dia em que rasguei todas as fotos dela. Porra, aquela merda doía na minha alma, tá ligado? Era como se alguém tivesse me queimando inteiro, mas sem fogo. Bagulho louco...

Love na Rocinha( DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now