4° mais essa agora? (Degustação)

741 78 7
                                    

Aline,

— Muito bem, Aline! Está percebendo o quanto a cada dia você melhora mais? Não vai demorar para sua perna estar boa novamente. — Mônica, minha fisioterapeuta, diz otimista.

Graças a Deus, minha perna está voltando a ser a mesma de sempre. Ainda manco um pouco, mas a fisioterapia tem ajudado muito. E como a Mônica disse, daqui a uns dias vou conseguir andar normalmente, mesmo tendo que usar os malditos pinos pelo resto da vida. Tudo bem, não posso reclamar. Poderia ter sido bem pior... eu poderia nem estar viva ou nem ter uma perna para tratar.

— Ainda bem, Mônica, não vejo a hora de voltar a trabalhar. É um saco ficar em casa... — me seguro nas barras de ferro, que ficam uma de cada lado meu, para me dar apoio na hora dos exercícios, pousando meu peso na perna boa e descansando.

— Te garanto que em mais alguns meses você estará de volta a ativa! — seu sorriso de grandes dentes retos é reconfortante.

Mônica é o mais próximo de amiga que tenho nos últimos meses, considerando que só tenho amigos homens do trabalho. Como estou temporariamente afastada, por motivos óbvios, quase não os vejo. Com exceção de quando vão me visitar ou quando me buscam para alguma reuniãozinha na casa de algum deles.

A companhia da minha mãe tem me ajudado bastante também, embora eu preveja a solidão assoladora quando ela voltar para o Paraná, o que não vai demorar a acontecer. Quer dizer, sozinha, sozinha, não estarei, Ramires e o Osvaldo sempre me fazem companhia. Mas eles têm suas vidas, não quero ser um fardo que eles se sintam obrigados a carregar.

— Por hoje vamos encerrar, Aline. Não esqueça de praticar em casa com a faixa, ok?

— Pode deixar. Estou fazendo o dever de casa direitinho. Acha que não? Doida para voltar a correr e retomar meus treinos... — Brinco.

— Ah, que bom! — ela se aproxima da barra. — Aproveitando, Aline, queria te convidar para ir ao culto comigo… Gostaria muito que você fosse. Deus tem me incomodado há dias para eu insistir com você sobre isso. Creio que vá te fazer bem. O que acha? Depois podemos ir a uma pizzaria. — seu olhar preocupado me deixa sem equilíbrio. Preciso usar a perna ainda dolorida e travada para me sustentar melhor.

Tanto anos que não entro numa igreja...

Mônica sempre me convida, e sempre digo que vou, mas sem firmar compromisso, me esgueirando para fugir. Fugir exatamente do quê? De Deus? Sera por isso que ele tem insistido tanto através dela?

Talvez, após tantos acontecimentos catastróficos, eu deva escutar seu chamado e aceitar de verdade o convite, sem desculpas em cima da hora. 

— Tá bom, eu vou.  — afinal, o que eu teria de melhor para fazer? Ficar em casa, pensando merda? Porque é o que mais tenho feito ultimamente.

— Que benção! Meu marido vai adorar te conhecer! — junta as mãos em frente ao rosto, satisfeita.

— Só me manda uma mensagem antes, me lembrando. Minha memória é péssima! — manco por entre as barras, para fazer a volta e ir até ela, que acompanha meus passos mais precisos com um olhar orgulhoso.

— Farei questão de te lembrar, e não aceito nenhuma desculpa dessa vez, hein! — ela diz quando a abraço. — Vai com Deus!

— Amém! — seco meu rosto dos esforços com a toalhinha que trago no ombro, testando mais uma vez a perna até o armário. A cada dia se torna mais fácil andar novamente. Foram meses de adaptação, até me sentir confiante de novo.

Penduro minha bolsa no ombro e reflito sobre o convite da Mônica até o estacionamento da clínica.

Ela me fala muito sobre o marido pastor, quer me apresentar a ele. Acredito que tem a ver com sua ideia fixa de que preciso voltar para Jesus; pensa que o marido pode me evangelizar com mais eficácia.

Love na Rocinha( DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora