CAPÍTULO 1 - MARTHA KOVACH

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Martha e o menino choravam no quarto, nos fundos da casa, enquanto o pai golpeava violentamente a pesada cadeira em tudo o que encontrava na sala. Se deleitava ouvindo tudo quebrar. A cabeça da pobre moça era um turbilhão de pensamentos desencontrados. Sua vida inteira passava diante de seus olhos, enquanto aconchegava e tentava acalmar o filho em seus braços. O que fizera para ter tanta infelicidade e sofrimento na vida? Agradecia profundamente o homem não saber que o menino não era filho dele, as coisas com certeza seriam ainda piores. Após um instante de silêncio, e alguns passos pesados, a porta do quarto abriu-se violentamente com um estrondo.

- Onde está mulher? Urrou o homem num gorgolejo ensandecido.

- Pela dama da aurora Dhemen, já disse, não tenho mais dinheiro algum. As últimas díviras que possuía foram bebidas por vossa mercê na Taberna! Exclamou se encolhendo, e esperando a surra que viria em seguida.

O homem olhou-a com uma fúria demoníaca enquanto partia sobre ela. Para a surpresa de ambos o pequeno se levantou, e num grito ensurdecedor golpeou o homem com uma força descomunal na lateral do crânio. Usou um dos pés de cadeira que também quebrada, jazia em um dos cantos. Os olhos do homem foram da fúria animal para um vazio infinito, desses que só os que não estão mais nesse mundo possuem no olhar. Martha não teve tempo de reagir, apenas assistiu o corpo do marido desabar sem vida no chão.

Saíram apressados pela noite morna e sem luar, carregando somente o essencial e as economias que Martha escondera cuidadosamente do falecido. Tinham de ser suficientes, tinham que durar até se restabelecerem em algum lugar, bem longe dali.

Dois anos rápidos se passaram desde o acontecido, ainda assim, contra sua vontade, as amargas lembranças assaltavam Martha, vívidas como se fossem hoje

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Dois anos rápidos se passaram desde o acontecido, ainda assim, contra sua vontade, as amargas lembranças assaltavam Martha, vívidas como se fossem hoje. Sempre que isso acontecia, ela sacudia a cabeça com violência tentando dissipar as terríveis imagens que aqueles anos de sofrimento haviam entalhado em sua alma. Se pegou fazendo isso enquanto estendia as roupas no varal na frente da casa. Parou por alguns instantes para observar o garoto que brincava ao seu lado, e sorriu aliviada. Levavam uma vida serena agora, muito humilde, mas sem privações. Encontrara milagrosamente a cabana em que moravam, abandonada, mas relativamente bem conservada às margens do Rio Guber, quase na entrada da floresta de Alle. Da floresta tirava seu sustento, junto com suas hortas e suas cabras. Pensava nisso quando foi interrompida pelo som de uma carroça vindo da estrada, e com ele, uma cantoria alta e desafinada. Um leve sorriso se desenhou em sua boca fina e delicadamente emoldurada pelas sardas.

O jovem Aldo guiava a carroça com pressa pela estrada. Ia em direção ao seu melhor momento do dia, quiçá da semana. Cantarolava alto e feliz, enquanto as imagens da bela moça de cabelos vermelhos, tez branca e olhos de um verde escuro e profundo, dançavam em frente aos seus olhos.

Encontrou-a pela primeira vez na estrada de Vistotempil. Ao vê-la, freou imediatamente a carroça e ofereceu-se para levá-la. A moça trajava um vestido humilde e encardido, trazia ao seu lado uma grande cesta com frutas e geleias e um menino. Iria vendê-las no vilarejo contou ao homem. A moça recusou timidamente a carona, mas não a compra de alguns potes de sua inigualável geleia de framboesa e mirtilos.

Rayd e a lua do caçador Volume 2 - O NecromanteWhere stories live. Discover now