Sua expressão muda com o que digo. Acho que a seriedade em minha voz demonstra que não estou para brincadeiras. E do jeito que me encara, creio que saiba exatamente do que iremos falar. 

– Venha. Entre. – ele diz.

Abre espaço ao dar um passo para o lado e eu entro. Como imaginei, seu apartamento é amplo, nem se compara com o lugar onde vivo. O tamanho da sua sala de estar equivale praticamente ao meu sobrado inteiro. 

Caminho até o sofá e não me contenho em dar mais uma analisada ao redor. De canto de olho, no entanto, observo Lamar circular e parar do outro lado da mesinha de centro.

– Eu te ofereceria uma bebida, mas só tenho chá e cerveja. Pelo o que presumo, chá não deve ser muito do seu gosto, e com certeza não vou contribuir para que fique bêbado de novo.

– Não se preocupe. Posso apenas tomar um copo com água?

Ele abre o pequeno frigobar próximo a um estante e me lança uma garrafa com água gelada, a qual pego no ar. Até que os meus reflexos não estão de todo o ruim.

– Obrigado.

Observo-o se aproximar enquanto bebo um longo gole direto do gargalo, e estamos um diante o outro novamente. Lamar me convida a sentar. Afundo no sofá de couro branco atrás de mim, tão macio que toma a forma da minha bunda em segundos. 

Móveis de qualidade são outra coisa.

Um silêncio profundo se instala entre nós. Mesmo que eu esteja aqui com um propósito, não é fácil para mim. De jeito nenhum.

Estar ao lado do cara que todo mundo considera o namorado da minha Any, que já teve a audácia de beijá-la e uma audácia maior ainda de continuar desejando-a, de longe, é algo que estou realmente pronto para enfrentar.

Acho que os monges tibetanos se orgulhariam do esforço que estou fazendo para me manter calmo agora. A situação me obriga e um motivo maior também. Embora eu não goste e nem queira admitir.

– Antes de começarmos essa conversa. – eu digo, tomando a dianteira – Quero deixar claro que não estou nem um pouco feliz de estar aqui ou prestes a dizer o que direi, mas acho que você já sabe que tenho uma boa razão para engolir o meu orgulho e... 

– É a Any, não é?!

Bebo mais água, engolindo a irritação que sobe pela garganta. Ouvir o nome dela sair da sua boca com tanta intimidade me parte ao meio de tanto ciúme. Não posso conter.

– Se isso tem a ver com o tal rumor...

– Pare! – lanço lhe um olhar enraivecido – Não vim falar sobre essa droga de rumor. Ainda que, lá no fundo, eu queira muito tirar satisfações por causa disso.

Torço a tampa da garrafa com força ao fechá-la e ponho no chão.

– A Any me contou tudo, disse que você sabe sobre nós. Mesmo que tenha feito para ajudá-la e eu seja grato, sou um homem e saber que outro cara se passa por namorado da minha namorada, não me agrada nada. Principalmente porque eu não posso desmentir sem nos colocar em risco. Mas, tudo bem. Apesar de eu detestar a ideia, sou maduro o suficiente para aceitá-la. Faço qualquer coisa para proteger a mulher que eu amo, então posso lidar com essa palhaçada também.

Lamar me observa atentamente, quase como se não acreditasse em minhas palavras. Ok, até eu estou surpreso com esse meu posicionamento. Se fosse em outra época, certeza que a história seria outra. Mas assim como acabo de lhe dizer: eu amo a Any e faço o que for para protegê-la.

De novo, caímos no silêncio. Tudo o que ouço é o som de um ou outro carro que passa na rua lá em baixo e do meu pé batendo nervosamente contra o piso. Dentro da minha cabeça, esse cenário pareceu bem mais simples. Admito. 

𝑰𝒓𝒓𝒆𝒔𝒊𝒔𝒕𝒊́𝒗𝒆𝒍 𝒆 𝑰𝒏𝒆𝒗𝒊𝒕𝒂́𝒗𝒆𝒍 ❃ Noany ❃Onde as histórias ganham vida. Descobre agora