Não fuja.

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Eu nunca fui ligada a nada espiritual, cresci em um lar católico, mas acabei me desvinculando com a religião na medida em que fui envelhecendo. Não desacredito de Deus e nem de entidades, mas também não os sigo, vivo minha vida quieta e quando morrer, talvez só fique debaixo da terra... Não me importa o que vem depois.

Imagino que por esse motivo, sou aberta a muitas opiniões diferentes e presto atenção em tudo, independente de qual crença você tenha, se quiser me falar dela, escutarei. Axé pra quem é de axé, amém pra quem é de amém e entre inúmeras coisas que as outras pessoas dizem na intenção de lhe "abençoar" de alguma maneira.

Já recorri em algumas casas de religião de matriz africana, outras que não eram também. Já vi minha menina sendo batizada, já vi pessoas tentando exorcizá-la, já vi orando na cabeça dela e todos com uma promessa de que trariam Madalena de volta.

A resposta sempre foi a mesma, absolutamente nada de reação, ela nem sequer demonstrava sentir algo com o que eles estavam fazendo... No final, eu ficava frustrada porque enchia meu corpo de esperança, mas nada vinha em troca.

Só que Madalena teve algumas convulsões que me deixavam severamente apavorada. Convulsões já são um aviso do corpo para algo que está acontecendo de errado dentro dele, mas eu nunca tinha visto uma onde o sangue é colocado para fora como se fossem fluídos que são normais de sair do nosso corpo... Não é normal sangue sair do nosso corpo de uma maneira "natural". O primeiro episódio assim foi apenas um aviso para crises piores, minha neta passou a chorar sangue toda vez em que tinha alguma crise e eu preocupada, a levei no médico porque imaginei que eles teriam alguma justificativa. Mas como sempre, ninguém tem nenhuma resposta a me dar e isso me assusta.

Fizemos o check-up total, eu desembolsei dinheiro até de onde não tinha, mas não havia nenhuma área comprometida, não haviam machucados internos e nem externos, não havia doença, não havia corpo estranho, não tinha nada que explicasse o porquê que ela tinha aquelas convulsões. Passou um mês internada em observação, mas magicamente elas sumiram, o que abriu brechas para que eu desconfiasse que talvez o problema dela não fosse físico mesmo e passasse a desconfiar do que eu tinha certeza, eu comecei a acreditar no mundo espiritual.

Muito li, confesso, já cheguei até a pensar que talvez minha menina pudesse ter sido alguém ruim em alguma vida passada e tivesse pagando esse preço, ou talvez até eu, talvez eu pudesse ter maltratado ela e agora me deram uma lição que é cuidá-la para o resto da minha vida. Mas não é novidade, eu também não descobri respostas sobre isso... Me diziam que o caso dela era complicado, ninguém queria mexer porque já haviam feito muito por ela.

No final só pedi ajuda ao médico em relação a o que fazer quando ela tiver esses episódios, apenas aprendi a manejar e a mantê-la hidratada, bem alimentada, porque nem os anti-convulsivos funcionavam... Afinal não era o corpo dela quem causava aquilo, não era a carcaça, era algo bem mais interno.

Coloquei minha menina no carro e para o meu azar ou sorte, bati ele no da frente. Na hora foi um momento estressante, eu me praguejei tanto por estar com a cabeça nas nuvens e não no trânsito, porque poderia ter acontecido algo de pior.

Uma loira com um seblante nada simpático desceu do carro, revoltada, resmungava consigo apertando a chave do automóvel na mão e eu já vi que tinha me metido em um problema grande. Ela vinha com gosto de gás, pronta para arrumar confusão, parecia até que havia tido um dia péssimo e aquele foi o motivo, a gota de água, que fez ela surtar... Havia achado um poço para despejar seu estresse. Mas eu tava tão mal naquele dia e após ouvir suas batidas na minha janela, eu abaixei com paciência e exatamente na hora em que ela ia falar, desabei em um choro tão copioso que até Elizabeth, irritadinha, se comoveu.

Em Outra Realidade - Romance Lésbico. (CONCLUÍDO)Όπου ζουν οι ιστορίες. Ανακάλυψε τώρα