Prólogo

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Quem sou eu? Não sei!

Talvez eu seja uma menina de 15 anos que sonha em fazer algo que ninguém da minha idade gostaria de fazer, pois caminho pelos corredores da escola em que estudo com minhas roupas simples e pretas, calça larga e moletom cinza. Fugindo das "tradicionais" vestimentas de meninas inglesas da minha idade e que convivem comigo todos os dias, de segunda a sexta-feira em uma sala de aula, cantina ou dormitórios, com suas peças escandalosas e coloridas, sapatos rosados e madeixas brilhando.

Não! Não sou essa garota!

Enquanto muitas sonham em ser ricas como os próprios pais (empresários, médicos, contadores e milionários por pura sorte, graças a heranças de família), casar-se com jovens de boa classe e que de brinde, também sejam ricos, viver em mansões ou palácios e nunca precisar trabalhar para comprar e manter seus luxos. Eu sou a ovelha negra da sala com muito orgulho. Orgulho de onde eu vim e quem me trouxe ao mundo.

Filha de uma vendedora de livros no centro da Inglaterra que ganha um valor aleatório, já que depende de cada dia. Toca piano de caudas em bares clássicos como renda extra para que pudesse me manter em uma escola de patricinhas, porque acredita firmemente que uma boa educação me levará ao topo do que ela nunca conseguiu ser.

Confesso que minha permanência na mesma não é a mais calma, mas também não é a mais cruel.

Sempre foquei no trabalho que minha mãe possui para me manter no Brighton College, uma boarding school (ou apenas internato para jovens de 11 até 16 anos) e não ligo para o que meus colegas de sala e quarto pensam.

Talvez essa seja a razão pela qual sempre fiquei quieta e não criei amizades desnecessárias com garotas mimadas que são acostumadas a chegar em carros de luxo e nariz empinado, menosprezando quem ali estava, se achando superiores. Algo que não eram!

Nesse momento me vejo olhando para cerca de 40 pessoas em apenas um espaço, usando casaco de grife, moletom caros, sapatos importados e personalizados, além de feições irritantes de superioridade. E por quê? Simples! Vou me apresentar depois de ouvir coisas como:

"Meu nome é Clare. Sou filha de um empresário do ramo de petróleo e dono de uma das maiores fortunas da Inglaterra.

Meu sonho é se casar com um príncipe e morar em um castelo. Viver em palácios e esquiar na neve"

"Meu nome é Sofia. Sou filha de um médico famoso por cuidar de celebridades como Lady Gaga e Rihanna.

Meu sonho é ser milionária aos 22 anos e viajar pelo mundo"

"Meu nome é Mary. Filha de condes da Finlândia, e meu sonho é ser Rainha"

Meus ouvidos, todos os dias, eram "acostumados" a ouvir essas coisas irritantes de como tal menina queria seu futuro, de como elas queriam ser ainda mais ricas do que já eram por parte dos pais, como queria continuar vivendo a vida perfeita aos seus pés. E no fundo, nunca fiz amizade graças a isso, e nunca, nunca agradeci tanto pelo meu lado introvertido e calado.

Eu estava usando meu moletom preto e com ilustrações de caveira favorito, enquanto por baixo existia o uniforme da escola. Algo tradicional e até que bonito com sua saia quadriculada na altura dos joelhos, camisa social branca e existe um blazer preto, mas o meu estava no quarto, enquanto eu estava ali parada e olhando cada pessoa, além da professora olhar em minha direção e dizer:

- Preparada?

- Sim! - falo enquanto respiro e sorrio ao falar o que eu queria ser.

"Meu nome é Christine Waller, tenho 15 anos e sou filha de uma vendedora de livros.

Não tenho pai, porque ele esqueceu que eu existo!

Não sou rica e muito menos quero namorar um menino perfeito e viver em um castelo cheio de regalias. Porque sei que tenho braços e pernas perfeitas para arrumar uma gaveta de roupas e fazer meu próprio alimento.

Meu sonho é ser vendedora de livros como a minha mãe, porque o trabalho dela somado às noites em que toca piano de caudas em lugares clássicos da cidade, me mantém nesta escola até hoje!

Passamos por momentos difíceis sim! Mas isso nunca nos afastou uma da outra. E sempre estamos juntas e felizes.

Uso roupas simples e que não pagam um apartamento no centro da cidade.

Ando de Skate e amo artes.

Toco piano e violão, além de falar Francês, Italiano, Espanhol e Português, e não me gabo por isso, porque minha mãe fez questão de pagar cada curso e eu fiz questão de me esforçar todos os dias para aprender e lhe dar orgulho, já que eu cheguei aonde ela nunca chegou.

Minha mãe nunca frequentou uma escola. Não fez faculdade e o que hoje ela sabe, aprendeu com os livros que vende para pessoas aleatórias que entram em sua loja todos os dias.

Cuido de animais quando volto para casa nos fins de semana, para ganhar um dinheiro extra e ajudar minha mãe nas contas de luz e comprar o que ela adora comer, para cozinhar para ela.

Amo arrumar a casa inteira! É algo relaxante ouvir a água sendo espalhada pelo chão, pegar uma vassoura e começar a esfregar.

Essa é a vida de Christine Waller. Uma menina que não quer e nem sonha em ter a regalia que muitas pessoas sonham.

Obrigada!"

Foi algo libertador minhas palavras sendo narradas, confesso, pois consegui ver na expressão de cada menina, um misto de nojo, desprezo e indiferença, como se eu não fosse importante. E isso me abalou? Não! Porque todos sabem que apenas uma pessoa é importante, e ela estava trabalhando no centro da cidade e na venda de livros de vários gêneros e formatos.

Caminho até minha cadeira e me sento com calma, sem medo dos olhares, pois o da autoridade maior (A professora), brilhavam de orgulho e emoção pelo meu discurso sobre como e o que eu gostaria de ser na vida. Fugindo da hierarquia gritante de pessoas ricas que ali existia.

Ela me olhava e aplaudia, enquanto outros alunos não se manifestaram e permaneceram em silêncio para a chegada de outro colega e seu trabalho.

Era algo divertido de se ouvir e ver, pois todos os discursos eram quase os mesmos. Tirando os dos meninos. Esses eram de:

"Quero me casar com uma mulher bonita e chamar a atenção pela minha beleza, além de continuar minhas aulas de esgrima e esqui"

Meus olhos tremiam com cada palavra falada, mas esqueci um pouco meus colegas de classe quando sinto meu celular vibrando no bolso de meu moletom. E assim que olho o visor, percebo ser minha mãe, e ela jamais me mandava mensagem em horário de aula.

Me levanto e caminho até a professora, mostrando para ela o que estava acontecendo e que eu precisava sair por alguns segundos, e prontamente permite.

Abro a porta e fico em um enorme corredor, porém, completamente vazio, abrindo imediatamente a mensagem de minha mãe e lendo:

"Desculpe atrapalhar, minha menina?

Estou mandando esta mensagem para avisar que estou bem, depois de ir ao hospital com muitas dores na cabeça e na região do estômago.

A Princesa de Gales me levou. Acredita? Me senti importante quando a vi entrando na loja sozinha.

Bom dia e estou morrendo de saudades da minha menina.

Te amo"

- Dores de cabeça e na região do estômago?

Os sintomas de minha mãe, foram as únicas coisas que realmente me importam naquela mensagem.

A Vendedora de Livros - Vol. 1Where stories live. Discover now