Parece que foi ontem

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Olá. Esqueci de falar que teríamos dois capítulos essa semana. XD

Boa leitura. Abraços!

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Certa vez, os seres humanos resolveram criar um aparelho denominado relógio. A função desse apetrecho é determinar o tempo através de ponteiros, eles são vendidos nos mais variados tamanhos e podem ser comprados em qualquer lugar. O relógio foi construído para que as pessoas pudessem controlar as horas em prol das próprias necessidades individuais. No entanto, o Deus onipresente chamado Tempo continuará o seu caminho interminável independente dos brinquedos humanos.

O relógio na parede do laboratório da Tropa de Exploração estava duas horas atrasado desde a queda da muralha Maria. Hange podia arrumá-lo com dois ou três movimentos, mas achava mais fácil aumentar os números mentalmente do que colocar os ponteiros na posição certa. Portanto, sempre que punha alguma substância para ferver, a cientista contava as horas de acordo com o relógio errado, enquanto o tempo linear do crescimento agia sob a criança trancada no cercadinho, já que quando solta, engatinhava sem parar. E se ninguém estivesse olhando, enfiava sujeira na boca, puxava as toalhas das mesas e o sobretudo dos adultos.

Leona começou a dar os primeiros passos aos nove meses. Como mãe, Hange a alentava... um pouco demais, para ser honesto. Segurava as mãos da filha e a colocava na frente das canelas, ambas andando em ritmo de tartaruga. A garotinha levantava as pernas desajeitadas uma atrás da outra pelos longos corredores do quartel-general. Hange a fazia percorre-los de cabo a rabo, e quando Leona cansava, a comandante a obrigava a ficar em pé e dar mais uma volta, com encorajamento impaciente:

— Anda, sua lerda.

Então, num dia qualquer, a menina conseguiu ficar apoiada nas duas pernas sem ajuda. Hange havia acabado de chegar da Capital quando o fato inédito aconteceu. Leona ficou em pé só de vê-la passar pela porta, como se tivesse passado os dois últimos dias a esperando para mostrar a nova habilidade em sua presença. A babá – substituta da ama de leite – tão surpresa quanto todos, deu certeza de que a menina só engatinhou enquanto Hange esteve fora.

A partir daquele dia, Hange colocava Leona em pé no começo dos corredores e saia despreocupada, assobiando. As perninhas curtas a seguiam pela distância que a falha coordenação permitia. Ao desanimar, Leona punha as mãos no chão, mas Hange, não querendo isso, voltava e a fazia ficar ereta.

— Vamos, você consegue.

E isso se repetiu até a garotinha entender que estava proibido engatinhar. No entanto, ela tinha só dez meses, andar era difícil e as roupas de inverno não ajudavam. Então, ficava sentada no chão frio com as mãos apoiadas no espaço entre as pernas, ouvindo o som apático das botas prosseguindo pelo imenso corredor xadrez iluminado por dez janelas.

À Leona restava mirar o símbolo da Tropa de Exploração cada vez menor conforme a mãe se afastava em linha reta. O coração da garotinha era aterrorizado pelo medo natural de ser esquecida, abandonada naquele corredor longo. E nisso, Leona corria atrás de Hange, porém, as perninhas quase sempre tropeçavam, e ela caia sentada ou de peito. Nesse ponto, Leona estendia os braços para a figura distante e soluçava a sílaba usada para referir-se àquela pessoa, temendo que o choro não fosse mais alto do que o barulho torturante das botas levando sua mãe para longe.

Hange sabia diferenciar os resmungos infantis – reconhecia direitinho fome, carência, desconforto e medo - e aquele pranto geralmente significava "não faça isso", ou, como Hange gostava de chamar, "você passou dos limites". As lágrimas cessavam quando a comandante voltava. Uma vez no alto, Leona agarrava-se ao pescoço da cientista, balbuciando "mã" sem parar. Hange geralmente zumbia ao ouvido da menina, a embalando enquanto atravessava os quadrados cor de vinho.

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