Capítulo 75 :

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Não processei o doutor Brawn nem ninguém da clínica, mesmo estando grávida e expulsa de casa, perdendo tudo o que conhecia e tinha. Eles não tinham culpa se fui tola e aceitei tudo o que me empurraram no dia do exame, sem questionar ou me interessar pelos detalhes. Foram bons comigo, quiseram me ajudar... O que fiz? Apeguei-me a última esperança... Felipe. Quando voltou fomos direto para o tal motel e lá tudo começou... A certeza de que me aceitaria e criaria meu filho como seu era tudo o que me restava para ter aquele bebê inocente perto de mim... Porém, não foi bem assim que aconteceu.

Antes de fazermos qualquer coisa contei a Felipe sobre a gravidez. Nunca poderei esquecer a expressão de fúria que vi em seus olhos, irado! Mostrou-se mais preocupado em saber com quem perdi a virgindade do que como me encontrava naquele momento... Quando neguei, quando lhe contei tudo, riu de mim e me bateu. Disse que eu não passava de uma mentirosa e que estava querendo lhe dar um golpe. Gritou que o filho não era dele e que fui uma vagabunda por ter me entregado a outros homens... Acusou-me de coisas terríveis e quando tentei me retirar... Fez coisas horríveis comigo. Não me lembro nitidamente, já que bati a cabeça logo no início, apenas tenho certeza que não chegou a me estuprar porque um funcionário do motel ouviu algo suspeito e foi lá para checar. A partir daí comecei a odiar os homens apenas pelas lembranças borradas que tenho de Felipe me tocando. Foi um trauma grande ver quem mais confiava me maltratando, me batendo e me desrespeitando mesmo sabendo de minhas condições... Eu estava grávida!

Agora grávida, sem casa, sem dinheiro... Sozinha. Minha mãe me ajudava como podia. Enviou-me para a casa de minha avó, mas fiquei ciente de que deveria sair de lá até que a criança nascesse. Desconsiderei o aborto na primeira vez que o doutor Brawn me mostrou o bebê no ultrassom. Aquele borrãozinho... O som forte do coração que batia dentro de mim... Tudo me deu forças, mesmo banhada por traumas. Comecei a pensar em dar o bebê para a mãe que deveria ter sido dele. Descobri que era uma mulher casada, rica, diretora de uma empresa de moda e muito influente. Quando ouvi aquele perfil desejei ser como ela... Desejei ser rica e influente para poder criar o bebê, algo que estava além de minhas atuais condições. A tal Carla comprara o espermatozoide por uma quantia a perder de vista, uma vez que o doador foi um homem muito dotado de beleza e saudável, além de possuir atributos físicos parecidos com os do marido dela, que era estéreo. Mas meus planos começaram a mudar... Carla não estava disposta a ficar com a criança porque queria gerar por ela mesma, então tive que descartá-la. Minhas opções eram poucas... Ficar com ele para mim ou arrumar uma família que o criasse. Doutor Brawn me arranjou um jeito de sair dessa, e talvez essa possível solução tenha sido a mais decepcionante de toda minha vida.

O pai biológico. O doador. Aquele que apenas precisou de uma playboy e um frasquinho para contribuir significativamente em minha vida. A ideia era explicar tudo a ele e pedir que nos ajudasse, que pelo menos se sensibilizasse com a história e me desse uma luz, certa ajuda, que se dispusesse a me acolher de algum jeito. Era ridículo, mas era uma opção. Talvez a última opção! Por que fui considerar essa hipótese? O cara me desprezou totalmente na única carta que escrevi para ele explicando a história... Mandou-me uma resposta imunda e devo dizer que aquilo doeu mais do que a rejeição de meu pai, que os abusos físicos de Felipe... Disse que não tinha nada a ver com minha situação e que sua parte estava cumprida. Claro, disse coisas mais que não valem a pena serem lembradas... Como um homem pôde ser tão frio? Aquela dor, aquelas palavras, ecoaram em mim por muitos meses, refletindo até mesmo na criança. Por isso decidir lutar... Por mim e por minha filha. Quando a vi praticamente formada e descobri que era mesmo uma menina, aceitei tudo. Aceitei a proposta da clinica de doutor Brawn de me ajudar a finalizar meus estudos e com dinheiro, aceitei prosseguir e aceitei minha filha. Minha Maria Clara.

Tão logo ela nasceu. Era linda, pequena e tinha lá minhas semelhanças... Mas sempre percebi que nela havia mais daquele ser horrível do pai biológico do que de mim. A menina de olhos verdes fora meu maior presente... Ela mudou minha vida, me faz sentir muita dor física e emocional, mas valera cada segundo ao lado dela. Estudei moda, administração e trabalhei duro para me tornar rica e importante, tão influente como a tal Carla. Consegui o que sempre quis... Dar tudo a Maria Clara sem a ajuda de ninguém. Nem de Felipe tão pouco do horrendo que nunca conheci e nem sequer sei seu nome. Tudo o que sei é do ódio que sempre carreguei de ambos e que acabo de vencer agora, com alguém chamado Arthur, alguém que para mim representa uma nova forma de encher meu mundo, o meu caminho.

Por que Arthur não me olhou nos olhos após ter ouvido toda minha história?

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