Setor 7 | 13 ºC
Contagem regressiva: 13 dias
"Onde existe gentileza existe bondade. E onde existe bondade existe magia."
(Cinderela, 2015)
— Apressem-se! Ela já está a caminho — a voz da Anna não me tranquiliza nem um pouco.
Quando os meus olhos se habituam à luz que invade a parte de trás do carro onde estamos, vejo a parede do prédio em um tom de salmão desbotado e reconheço o lugar onde a mãe do Lucas sempre trabalhou.
Só neste momento, sinto uma onda de alívio passar por mim.
Lucas pede para o Vitor ficar no carro e ele não contesta. Embora tenha sido o Nathan a pedir para que ele nos acompanhasse, Vitor sabe que o Lucas precisa de privacidade.
Saímos do carro que estava posicionado próximo a uma porta aberta e Lucas segura a minha mão enquanto avançamos para dentro do prédio seguindo a Anna pelo que parece ser uma entrada de serviço. Andamos um pouco pelo corredor estreito, e Anna entra em uma pequena enfermaria pouco iluminada e com cheiro de éter.
Reparo na porta fechada do outro lado que deve dar acesso à fábrica. Clairy provavelmente virá de lá e sinto meu coração se apertar com a proximidade desse encontro.
— Vocês têm dez minutos — Anna avisa, evitando olhar para mim. — Fiquem aqui atrás por precaução. — Andamos para o outro lado do biombo que divide a enfermaria. Encosto-me na maca e observo Lucas não conseguir ficar parado e se distanciar um pouco de mim. Alguns segundos depois ouvimos alguém bater na porta.
— Com licença. — Ouço a voz da Clairy confusa e surpresa, que me traz tantas lembranças e uma sensação de segurança que só sentia com a minha mãe.
— Eu sou a enfermeira Anna. — Como precisa se apresentar, descubro que o Lucas não chegou a fazer isso.
Ouço a porta se fechar e a chave rodar na fechadura.
— O que está acontecendo? — Clairy pergunta assustada.
— Não se preocupe. Eu sou amiga do Lucas... — ela se apressa a dizer pra tranquilizá-la.
— Aconteceu alguma coisa com o meu filho? — ouço todo o nervosismo na voz dela.
— Mãe — Lucas a chama depois de dar um longo suspiro. Antes parecia difícil, mas agora eu realmente tenho noção da dor que isso vai causar nele.
— Dez minutos, Lucas — Anna volta a avisar antes de nos deixar sozinhos.
Clairy vem na direção dele que ficou paralisado.
Ela o abraça.
A aparência dela está abatida. Noto as olheiras embaixo dos olhos castanhos e o cabelo escuro liso e sem brilho emoldurando um rosto pálido. Clairy parece ter envelhecido uns dez anos desde a última vez que a vi, e tenho certeza que isso aconteceu nos últimos dias ao ver o Lucas acusado de traição.
— Meu filho — diz com as lágrimas escorrendo pelo rosto enquanto o abraça. Não consigo segurar o choro. Por mais que eu tenha perdido meus pais muito cedo, é algo mais natural que perder um filho. E nesse momento, essa é a única certeza que ela tem, que vai perdê-lo. É a única certeza que eu tenho. Então ela se afasta um pouco e coloca as mãos no rosto dele que devolve o olhar. Eu imagino a dor que ele deve estar sentindo ao vê-la desesperada desse jeito e não poder fazer nada.
— Por favor, não chore, mãe! — pede enxugando as lágrimas dela.
— Por que você não se entrega? Eles talvez perdoem você... — a esperança dela dói em mim. Eles nunca perdoariam o Lucas. A Matriz nunca mostrou misericórdia.
— Eles não vão... Mas não tem problema, mãe! Estou bem e você precisa ficar bem também — ele pede o impossível.
— Como eu posso ficar bem, Lucas? Eu não mereço ficar bem. Eu não fiz nada, eu nunca fiz nada — Clairy entra num choro compulsivo que parte o meu coração. — Me perdoa, meu filho, por nunca ter feito nada para você viver em um mundo melhor.
— Você fez, mãe! — diz enxugando as lágrimas dela. — Você me ensinou a nunca ignorar o sofrimento de outra pessoa. Você me fez ver sempre além, me ensinou a não ficar de braços cruzados. Você começou uma revolução, mesmo que não se dê conta disso.
— Não foi suficiente — ela diz com um tom de derrota.
— Foi um começo. — Consigo ver o brilho nos olhos dele mesmo de longe.
— Não quero perder você. — A voz sai embargada com todos os tipos de súplica e dor que eu reconheço em mim quando penso a mesma coisa.
— É por uma causa maior do que eu, maior do que nós.
Respiro fundo para não desabar com as coisas que o Lucas diz, mas não consigo.
— Não aceito que esta é a última vez que vou ver você... — O desespero nos olhos do Lucas por ver a mãe tão destruída me avisa que é hora de eu intervir. Ele quer parecer forte, mas sei que ele está despedaçado por dentro.
—Nós não desistimos — digo, insegura, fazendo Clairy olharpara mim pela primeira vez.
— Emily! — Ela me abraça, e meu suspiro de alívio ecoa pela sala. — Achava que ele estava sozinho. Não suportava a ideia de ele estar sozinho — confessa, com a voz tremendo, mas mais contida. — Torci tanto para vocês se encontrarem. Sei o quanto ele precisa de você, o quanto ele ama você.
— Eu o amotambém — respondo com a voz embargada pelo choro. — Você me perdoa, Clairy? — Tenhomedo da resposta, mas pergunto sem conseguir conter os soluços agora.
— Minha menina — ela me solta limpa as lágrimas do meu rosto, então se afasta um pouco e me olha nos olhos. — Você não deveria estar passando por isso. Nenhum de vocês dois. Eu não faço ideia do que aconteceu na Matriz, mas tenho certeza que a sua intenção nunca foi machucá-lo. Eu sei o amor que você tem pelo meu filho. Só quero te pedir uma coisa, eu o conheço e sei o quanto pode ser teimoso. Apenas não o deixe desistir — pede baixinho para ele não ouvir.
— Eu nunca deixaria — digo me lembrando do quanto isso é difícil. Mas eu nunca vou deixá-lo desistir.
Clairy sorri de forma triste.
— Você se lembra do que a Ellie costumava dizer para você? — pergunta e as lágrimas enchem os meus olhos de novo. — "Tenha coragem e seja gentil" — ela cita a frase da história que a minha mãe costumava contar para mim. — Vocês estão arriscando a própria vida para libertar milhares de pessoas, o coração de vocês transborda bondade. E eu acredito que a bondade sempre vence.
— Vou tentar me lembrar disso — digo, apesar detantas situações játerem me provado ocontrário.
— Não é uma boa hora para perder a esperança, Emily. Você é forte. Foi assim que sua mãe criou você, para enfrentar os desafios. Ela estaria orgulhosa de você, querida.
— Mãe, você tem que ir — Lucas diz, aproximando-se denós duas, fazendo Clairy sevirar e pegar a mão dele.
Ela se vira e pega na mão dele.
— Não sabia onde você estava, achava que você estava sozinho, mas ver vocês dois juntos fez uma esperança surgir em mim. Não tenho dúvida que vão passar por isso e que vamos nos reencontrar. — Ela pega a minha mão e coloca embaixo da mão dele. — Eu amo vocês.
— Também amo você —Lucas e eu dizemos ao mesmo tempo e nos abraçamos.
— Como o Mike está? — Lucas pergunta.
— Ele sempre diz que você é o herói dele. — Quando ela fala sinto o Lucas apertar a minha mão.
— Diga para ele... — A voz dele não sai. Sinto como se uma faca estivesse entrando lentamente no meu coração. A dor dele é mais do que eu posso suportar.
— Ele sabe que você o ama. — Clairy diz quando vê que ele não consegue continuar. — Eu tenho orgulho de você, meu filho.
— Você tem que ir — ele diz com lágrimas brilhando nos olhos dele. — Amo você!
Ela nos abraça ao mesmo tempo e se vira chorando.
— Não sabia onde você estava, achava que você estava sozinho, mas ver vocês dois juntos fez uma esperança surgir em mim. Não tenho dúvida que vão passar por isso e que vamos nos reencontrar. — Ela pega a minha mão e coloca embaixo da mão dele. — Eu amo vocês.
— Também amo você —Lucas e eu dizemos ao mesmo tempo e nos abraçamos.
Ver a Clairy faz com que eu me lembre de tudo o que passamos juntos. De todas as vezes que o Lucas me ajudou, de todas as vezes que ele me salvou. Toda a nossa história passa diante de mim.
— Tem momentos em que eu odeio ser essa pessoa da qual ela diz sentir orgulho. A única coisa que eu faço é machucar as pessoas à minha volta.
— Isso não é verdade, Lucas. Você é a melhor pessoa que eu conheço — afirmo enquanto ele abre os olhos e me encara com aquela imensidão castanha que eu tanto amo e então os desvia de mim.
Toco no rosto dele e o forço a me encarar de novo, mas Lucas apenas fecha os olhos e encosta a testa na minha enquanto me puxa pela cintura e me abraça.
Apesar da intensidade pungente desse reencontro com a Clairy, estar nos braços do Lucas é como se tudo não tivesse passado de um sonho ruim. A dor vai se distanciando e dando lugar para esse sentimento infinito que nos une.
Lucas beija a minha testa enquanto a mão dele desliza de forma lenta e suave para a minha nuca, fazendo-me erguer o rosto. Ele olha para a minha boca algumas vezes, mas não me beija.
Em vez disso, sinto ele respirar fundo e soltar a respiração devagar, enquanto os olhos dele, antes nublados pelo desejo, parecem despertar do momento extasiante em que nos encontrávamos.
— Tudo o que eu queria era tempo. — Sinto os braços do Lucas me abandonarem lenta e dolorosamente enquanto pronuncia essas palavras com calma. — Tempo para dedicar a você, para amar você. Mas sou uma bomba-relógio, Em.
Antes que eu possa dizer alguma coisa, ouço a porta abrir. Apesar disso, Lucas não desvia os olhos dos meus, hipnotizando-me nesse abismo de medo e incerteza sem fim.
— Me desculpem, mas precisamos ir — Anna diz.
Lucas suspira, pega a minha mão e voltamos para o carro.
I want to say I lived each day until I die
And know that I had something in somebody's life
The hearts that I have touched will be the proof that I leave
That I made a difference, and this world will see
I was here
Eu quero dizer que vou viver cada dia até eu morrer
Sabendo que eu fiz algo na vida de alguém
Os corações que toquei serão a prova que eu deixo
De que fiz a diferença e este mundo saberá
Que eu estive aqui
(I Was Here | Beyoncé)
Assistam ao vídeo, é MARAVILHOSO.
Então, qual é a diferença que vocês estão fazendo no mundo?
(É para refletir, não para responder rs)