EPÍLOGO

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Dimensão Yvrim
Três anos depois

O palácio estava tomando forma de novo. A restauração levava tempo mesmo com a ajuda dos gigantes, mas, aos poucos, paredes iam sendo erguidas, telhados reconstruídos e o piso limpo. Era um trabalho duro que Lia se sentia bem em fazer.

Foi uma surpresa para os outros três reinos quando souberam que as duas princesas do Norte estavam vivas, que haviam retornado para levantar o trono caído do pai. As antigas terras nunca foram invadidas, o respeito pelos Elenor mantivera-se intacto e a ajuda para a reconstrução veio rápido dos aliados do Oeste e do Leste. Um dinheiro que Liana devolveria com o tempo, quando o comércio começasse a andar com as próprias pernas de novo.

Os agricultores da região, que haviam partido para outras terras depois da queda do Norte, voltaram para a prosperidade de suas antigas fazendas ao redor do palácio que só crescia. Ainda levaria anos até que o maior dos reinos de Yvrim recuperasse a força e influência que um dia tivera. Anos até que as aldeias fossem povoadas de novo. Enquanto isso a rainha Liana, que herdara o trono, já que a irmã mais velha ocupara o posto de líder do Palácio da Luz, restaurava com cautela cada canto de seu antigo lar.

— O jardim ficou lindo, não acha, minha rainha? – perguntou Melina, uma das serviçais que fitava as plantas coloridas pela janela do quarto. O quarto que um dia fora de Deaneira.

Liana se equilibrava sobre uma escada pendurando um retrato de seus pais que havia sobrevivido à destruição milagrosamente. Ela dispensava os vestidos longos que uma rainha deveria usar, exceto em eventos oficiais, preferia as roupas leves de linho e blusas sem mangas. Deixara o cabelo crescer novamente e agora os fios loiros derramavam-se sobre os ombros nus.

— Ah, sim – disse ela sorrindo – trabalho de Nahins muito habilidosos. – Apontou para o quadro. – Está torto, Melina?

— Está perfeito, minha rainha. – Ela segurou a escada enquanto Lia descia, temendo que a rainha perdesse o equilíbrio. – Por que não me deixa fazer isso? Esse é meu trabalho.

Os protestos de Melina eram cada vez mais insistentes, admirava a nobreza da rainha, mas às vezes ela passava dos limites. Quase surtou quando a encontrou com um esfregão na mão limpando a cozinha enquanto ria com os cozinheiros no dia anterior.

— Acho que posso pendurar um quadro sozinha – Lia retrucou e jogou-se sobre a cama coberta de lençóis de seda. – O dia hoje foi cansativo. Os grãos do Oeste já chegaram?

— Ainda não, minha rainha. Deveriam ter chegado ontem. São essas estradas velhas, as carruagens vivem quebrando.

Lia murmurou uma resposta desinteressada e rolou de bruços sobre o travesseiro de penas.

— Algo lhe incomoda? – Melina indagou, ainda de pé ao lado da janela. – Parece triste. Quer que eu prepare um chá?

— Não, Melina, estou bem. Só um pouco cansada.

— Se me permite dar um conselho, é melhor adiar a viajem para Djaí na próxima semana. Tire um tempo para descansar, a senhora quase não dorme.

— Não posso. Preciso ver como andam as coisas em Djaí...

Batidas na porta a interromperam e a voz de um dos guardas soou do corredor:

— Minha rainha, tem alguém para vê-la.

— São os mercadores com os grãos? – Melina antecipou-se. – Diga que ela está indisposta e peça para deixarem o carregamento no deposito.

— Não. Eu vou recebê-los. – Lia deslizou para fora da cama com um suspiro. – Quero saber se tiveram algum problema na estrada. Além dos buracos, temos que nos preocupar com ladrões de carga.

Melina tentou usar o argumento de que aquilo não era uma tarefa com a qual uma rainha deveria se preocupar, mas Liana já havia saído. Ao chegar no corredor encontrou o guarda que a acompanhou até o salão do trono com a mão na espada.

— Não são os mercadores, minha rainha – informou ele sem parar de andar. – É um rapaz que diz conhecê-la. Ele não quis dizer seu nome. Ele insistiu em vê-la, disse ser um assunto urgente.

Lia ouviu tudo com atenção, imaginou quem seria tão arrogante a ponto de bater sua porta e exigir vê-la sem nem ao menos se apresentar. Ela desceu as escadas sobre o carpete escarlate e viu o visitante cercado por guardas com espadas e lanças. O visitante cujo rosto não era possível ver daquele ângulo graças ao escudo de um dos soldados, mantinha as mãos guardadas casualmente nos bolsos da calça.

— Primeiro de tudo me diga seu nome – exigiu Lia descendo o último degrau e caminhando para seu trono modesto. – Não falarei com um estranho que vem até mim dessa forma.

Os guardas se afastaram e deixaram que ela visse o rosto do rapaz. Lia perdeu a respiração no mesmo instante, arregalando os olhos cor de mel. Suas pernas bambearam e ela desabou no trono.

— Você, Liana é uma das poucas que sabe meu nome. – Disse o visitante, fazendo uma leve reverência. – Longa vida ao grande Reino do Norte. Longa vida a minha Sereia.

Os olhos azuis profundos, os cabelos escuros caindo-lhe sobre a testa e o sorriso branco. Lia encarou todos aqueles detalhes de seu rosto, olhou-o de cima a baixo e piscou várias vezes como se testando a realidade diante de si. Quando recuperou a fala conseguiu chamar o nome do visitante, um nome que achou que nunca mais pronunciaria:

— Erik?

FIM

𝑨́𝒖𝒓𝒆𝒐𝒔 - 𝑺𝒆𝒈𝒖𝒏𝒅𝒂 𝑮𝒖𝒆𝒓𝒓𝒂Where stories live. Discover now