{19} BEIJO SOB AS ÁGUAS

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Os próximos dias foram de calmaria. Lia ia aos poucos esquecendo o que tinha ido fazer ali. Caçar Kraj começava a ser menos importante, enquanto, pouco a pouco, ela e Erik iam ficando mais íntimos.

Ela o ajudava na cozinha com os pães - ou pelo menos tentava -, o acompanhava na limpeza dos quartos. Quando não estava fazendo essas tarefas, divertia-se com as crianças em volta da aldeia, elas sempre pediam que a Niffj destruísse alguma coisa. Mas pela primeira vez em muito tempo, Lia não se sentia mais na necessidade de usar sua aura para nada. Estava vivendo uma vida normal desde que tinha deixado os pais. Havia dado mais sorrisos nos últimos quatro dias do que nos últimos vinte anos. Estava realmente feliz.

Certa manhã, ela foi até Erik com duas peças de prata e colocou-as sobre o balcão.

- Aqui - disse ela - fiquei mais do que pretendia, então tenho que pagar.

Erik encarou as peças depois o rosto de Lia. Empurrou o dinheiro de volta.

- Não precisa me pagar, Liana. Você tem me ajudado tanto aqui, não seria certo cobrar as diárias - explicou o rapaz.

- Você não está me cobrando, sou eu quem estou te dando o dinheiro - Lia insistiu.

- Não posso aceitar. Sua presença aqui deixou esse lugar tão mais alegre. Se eu for pago por isso não me sentiria bem. Você entende?

Lia suspirou, sorriu e pegou as peças de prata de cima do balcão.

- A única coisa que eu entendo é que você é um péssimo administrador - brincou, dando um soco de leve em seu ombro. - Sou sua única hóspede em meses e você ainda recusa o dinheiro.

- Vale a pena - disse simplesmente. Os dois riram e ficaram em silêncio por um tempo, até Lia voltar a falar:

- Escuta, Erik, você pode me chamar só de Lia se quiser. Não precisa me chamar o tempo todo de Liana.

- Mas eu gosto de Liana, é um nome forte, imponente. Como o nome de uma princesa deve ser.

Ela se encolheu institivamente, tocando o bracelete em seu pulso.

- Você sabia?

- Nunca fui para o Reino do Norte, mas já li sobre a linhagem dos Elenor. - Ele abaixou a cabeça, enquanto cutucava com o dedo uma mancha na madeira do balcão. - Só não quis tocar nesse assunto por que sei que é difícil pra você. Ter seu lar... destruído.

Lia deixou escapar o ar que tinha segurado até agora sem perceber. Erik sabia o tempo todo quem era ela, mesmo assim não a assaltou com perguntas. Estranhamente isso a fez se sentir na obrigação de lhe dar algumas respostas, não seria justo manter segredo sobre o motivo de ter ido ali.

- Obrigado, Erik - disse ela. - É mesmo muito difícil para mim. No dia em que eu cheguei, você me perguntou se eu tinha vindo pra cá por causa de um Espectro. Bem... a resposta é sim. Estou há dois anos caçando o Espectro que matou meus pais e destruiu meu lar. Foi por isso que vim. A última pista que tive dele indicava essa região. Só que eu não sei mais para onde ele possa ter ido.

- E você tem certeza que foi ele quem matou seus pais? - Erik perguntou, sério. - Você o viu?

- Eu nunca vi seu rosto, mas conheço bem sua aura, ela estava impregnada nas paredes do castelo, junto com o sangue dos soldados que o defendiam. Ele ajudou os Bárbaros a invadirem o Reino do Norte, Erik. Claro que foi ele! - Ela havia levantado a voz sem querer. - Me desculpe, é que falar dele me deixa assim.

- Então não vamos mais falar dele, combinado? - Ele segurou a mão dela entre as suas. - Você é bonita demais para ficar pensando em vingança o tempo todo.

𝑨́𝒖𝒓𝒆𝒐𝒔 - 𝑺𝒆𝒈𝒖𝒏𝒅𝒂 𝑮𝒖𝒆𝒓𝒓𝒂Where stories live. Discover now