{25} O MAPA DO VÉU

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O vento que circulava tanto no alto das copas como rente ao chão, eriçando as folhas secas, finalmente sessou. Apenas por um instante a floresta mergulhou no silêncio total. Kraj, então, pegou-se encarando uma pétala branca flutuando no ar, rodopiando sem rumo. Outra surgiu de lugar nenhum, depois outra, e mais outra. Logo uma pequena nuvem de pétalas delicadas se movia como um enxame de abelhas. Kraj soube naquele momento em que parte do mundo dos espíritos havia ido parar.

O enxame de pétalas foi para trás de um tronco grosso, espalhando pelo ar o aroma suave de flores. Logo depois, um rosto hesitante espiou por detrás da árvore, um olhar colorido estudava Kraj tanto como receio como curiosidade.

- Está tudo bem - ele tranquilizou-a. - Pode sair. Não vou te machucar.

A entidade pareceu medir as palavras do estranho visitante vestido de preto. Por um longo momento não se moveu, até o olhar colorido baixar para a lâmina afiada nas mãos de Kraj. Sem dizer palavra, um braço delicado surgiu atrás da árvore, sem expor o corpo. A mão de dedos finos e perfeitos apontou para a arma e logo voltou a se esconder. Kraj entendeu o recado.

- Quer que eu guarde isso? - disse e devolveu Mahiban para a bainha em sua cintura. Ergueu as mãos em um sinal amistoso. - Pronto. Viu só, não sou perigoso.

Satisfeita, a entidade deixou seu esconderijo com passos tão suaves que não perturbavam o solo sob seus pés. Uma jovem de cabelos verdes como grama encarava Kraj com um par de olhos que mudavam de cor conforme a luz do sol os iluminava.

Dywaz, pensou Kraj, constatando que estava certo. Estou na Floresta Eterna!

A Floresta Eterna a subdimensão que abrigava os espíritos da natureza. Relatada apenas por um único Soma de Yvrim, Túlio Naz, que havia conseguido visitá-la com sua aura. Em seus escritos ele havia relatado as belezas das terras infinitas de plantas que nunca morriam e criaturas tão belas que não podiam ser resumidas em palavras. E era exatamente isso que Kraj tinha diante de si a beleza.

Dywaz era a palavra do antigo dialeto para beleza. Fora isso que Túlio escrevera em seus relatos sobre a Floresta Eterna, Il siw u perfta'dywaz. Eu vi a beleza perfeita. E assim batizou aqueles espíritos femininos que agora cercavam Kraj.

As Dywaz, assim como as ninfas, eram entidades da natureza, herdeiras da essência pura da aura verde. E manipulam suas forças no mundo espiritual como os Nahin fazem no mundo físico. Túlio, Kraj imaginou, não exagerava nem um pouco ao descrever aquelas entidades como a encarnação da beleza perfeita, com a licença poética de usar o termo encarnação já que se tratavam de espíritos.

Agora encorajadas, outras pequenas nuvens de pétalas dançaram no ar antes de dar forma aos corpos esguios das outras Dywaz. Algumas materializaram-se em galhos altos; outras tímidas, atrás de plantas baixas. As mais ousadas surgiram bem próximo de Kraj. Todas estavam completamente nuas, apenas os seios eram eventualmente cobertos pelos cabelos compridos que iam até a cintura. As madeixas sedosas iam do tom verde-grama da Dywaz na frente de Kraj, passando pelo rosa-salmão, até o vermelho-fogo. Cada uma com sua beleza peculiar.

- Preciso passar pela floresta de vocês - ele dirigiu-se em tom calmo às entidades que o observava. - Não precisam se preocupar comigo, não farei nada a vocês ou a esse lugar.

As Dywas se entreolharam com expressões confusas. É claro que elas não me entendem. São espíritos, Kraj repreendeu-se. Uma das jovens, de cabelo azulado, chegou ainda mais perto e ergueu a mão para tocar seu rosto. Kraj se afastou com um passo para trás.

- Nah - falou ele no antigo dialeto. - Não.

Não queria ser tocado, sua aura negra poderia agredi-la, mesmo que fraca. Mas a jovem insistiu e aproximou-se ainda mais. Kraj cedeu, não queria irritá-las. Dywaz poderiam ser lindas, mas eram também muito poderosas. A última coisa que ele queria era provocar a fúria daqueles espíritos.

𝑨́𝒖𝒓𝒆𝒐𝒔 - 𝑺𝒆𝒈𝒖𝒏𝒅𝒂 𝑮𝒖𝒆𝒓𝒓𝒂Where stories live. Discover now