Capítulo 69:

25 13 1
                                    

Passados poucos dias, o Tiago despertou no hospital, visivelmente confuso, tentando reunir os fragmentos das lembranças daquela noite.

Uma enfermeira estava presente, pronta para responder às suas perguntas.

— Como é que vim parar aqui?

— Foi ela que te salvou!...

A enfermeira apontou na minha direção. Eu estava numa cadeira, ao lado da maca, dormindo, com a mão dele entre as minhas.

Ele observou-me com ternura, enquanto eu ressonava.

— Ela passou a noite aqui? — perguntou, enquanto acariciava o meu rosto.

— A noite? Passou a semana inteira! — A enfermeira riu levemente antes de sair, deixando-nos sozinhos.

Ele acordou-me delicadamente.

Ao despertar, uma onda de pura felicidade invadiu-me ao vê-lo consciente, abraçando-o com todas as minhas forças!

— Tiago, estás bem? Como te sentes? Tens dores?

— Calma, Clara, eu estou bem!... E tu... estás diferente...

— Pois... eu sei... eu... — baixei um pouco a cabeça, constrangida. Com certeza, ele reparou no estado do meu cabelo.

Sempre tive receio de que, ao cortá-lo, perdesse um pouco da minha feminilidade. Tinha medo de que isso me fizesse parecer menos mulher... Temia o que ele fosse dizer...

O Tiago finalmente comentou:

— O teu sorriso... está diferente! Voltou a ser belo e genuíno!

Comecei a corar, surpreendida com o comentário. Não esperava que, com o meu cabelo naquele estado, ele olhasse para o meu sorriso...

— Pensei que irias reparar no meu cabelo...

— Ah, e reparei! Pareces uma esfregona... — comentou ele, tentando conter o riso, denunciando que estava apenas a meter-se comigo. Percebendo isso, levei o comentário na brincadeira, percebendo que ele não olharia para mim de maneira diferente por causa do meu cabelo.

— Sabes, com esse penteado, pareces a minha primeira namorada...

— Então? Já tiveste uma namorada?

— Mais ou menos... Quando era pequeno, treinava as minhas cantadas sedutoras, usando uma esfregona como mulher, então, lembras-me a minha primeira namorada imaginária!

Não consegui conter uma grande gargalhada. Nem sabia se ele estava a elogiar ou a insultar, mas comecei a olhar para o estado do meu cabelo de uma maneira mais descontraída.

— Não te lembro algo mais fofinho do que uma esfregona?

— Talvez... Como é que se chamam aqueles cães com um pelo peculiar?

— Um Maltês, um Poodle, ou um Bichon Frisé?

— Humm... estava a pensar mais num Cão de Crista Chinês, um Puli, ou um Papillon...

(Ok, chega de falar de cães, e do meu cabelo...)

— Clara, o que aconteceu naquela noite?

— Coloquei um fim a tudo... — respondi, referindo-me ao Stefan.

— E ele aceitou?

— Bem... Não. Ele deu a entender que não conseguiria viver sem mim... e que eu não seria ninguém sem ele...

— Típico... — comentou o Tiago.

Compartilhei o que estava a sentir, depois de tudo o que passei:

— Durante anos, acreditei que poderia salvá-lo do seu lado violento... Pensei que ele só precisava da pessoa certa para o salvar... Mas, depois compreendi... que eu não sou mãe dele, nem psicóloga, e já tenho a minha própria vida para cuidar! Se ele quer ajuda, que procure um profissional. Eu não tenho nenhuma responsabilidade de cuidar dos problemas psicológicos dele, colocando o meu próprio psicológico em risco!

O Tiago riu-se da minha confissão.

Aproveitei o momento para esclarecer outra questão:

— E tu? Foste tu que chamaste a polícia, não foste? Como é que sabias que eu precisava de ajuda?

— Recebi uma mensagem do teu telemóvel, dizendo que ias casar com o Stefan, que o amavas... que era o teu sonho...
— Tiago, não... não fui eu!

— Eu sei!... Foi assim que percebi que algo não estava certo.

Acedi às definições do meu telemóvel e percebi que tinha mais uma impressão digital registada, além da minha.

Parece que o Stefan já tinha registado a sua impressão digital, antes mesmo de eu adicionar a minha. Agora entendo porque é que ele se ofereceu para configurar o telemóvel por mim. Disse que era para me ajudar, mas, na realidade, era para eu não perceber que a sua impressão digital já estava registada.

— Como é que sabias que não era eu? — perguntei.

— Simples!... Eu sei que casar nunca foi o teu sonho! Tu sonhavas com um vestido deslumbrante e uma festa... e apenas isso... Sonhavas poder usar um vestido de noiva, sem ter a obrigação de ser uma... sem ter a obrigação de casar, de mudar o teu sobrenome, de pertencer a alguém...

Era verdade... O Tiago conhecia-me melhor do que eu imaginava, mesmo estando comigo apenas há alguns meses, ao contrário do Stefan, que esteve comigo durante anos, e nunca me conheceu de verdade...

— E o que vais fazer em relação ao Stefan? — perguntou, preocupado.

— Eu... não tive coragem de falar com a polícia. Tive receio de que não acreditassem em mim...

— Mas não vais desistir, pois não? Precisas de denunciar aquele tipo, para que outras mulheres não passem pelo mesmo!

— Não sei se a justiça irá ajudar-me... Muitas pessoas passam a vida em processos, e nada...
— Mas não podes deixar que isso te impeça de tentar! A única forma de um dia haver justiça de verdade, é se continuarem a lutar! E eu vou estar ao teu lado nessa luta! Vou ajudar-te em tudo o que puder!

— Sério? Tanta dedicação, porquê?

— Porque quero redimir-me de todo o mal que fiz às mulheres a minha vida toda, e... porque eu também te amo!...

Olhei para ele, perplexa com o que acabei de ouvir!

Ele mantinha um sorriso sereno.

— "Também"?... Mas... eu nunca disse essas palavras!...

— Disseste sim! Eu ouvi-te, naquela noite... Estava muito mal, quase inconsciente, mas... antes de apagar por completo, consegui ouvir a tua voz... Apesar de não conseguir reagir, conseguia ouvir-te, e lembro-me de cada palavra!

Ele aproximou o seu rosto do meu e disse-o novamente:

— Eu amo-te, Clara!

Sorri, emocionada, juntando coragem para também expressar o que sentia:

— Eu também te amo, Tiago!

Demos um grande abraço, um doce beijo... e o que fizemos depois, só as enfermeiras que escutaram pela porta sabem... 

CLÍMAX - vem(-te) comigoOnde histórias criam vida. Descubra agora