Capítulo 62:

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Surgiu uma memória... Uma lembrança minha, observando a praia...

Absorvia a visão do mar, a luz do sol e as pessoas a correrem na areia. Sentia vontade de correr também, até que o Stefan retornou, entrando no carro, onde eu estava, observando a tal praia pela janela, enquanto esperava por ele. O Stefan entrou e levou-nos para casa.

(Que memória estranha... Porque é que comecei a pensar nisso?)

Outras imagens vieram à mente... Momentos em que observava a praia, mas o Stefan sempre me impedia de chegar lá. Lembrei-me das minhas pinturas de paisagens, mas também das obras mais sombrias que criei naquela época, retratando mulheres solitárias, com uma aura triste e vazia... (Eu via-me naquelas telas, como se representassem a minha alma naquela altura.)

Continuei a caminhar... e então, surgiram lembranças da minha depressão, quando o Stefan me deixou...

Revivi os momentos de solidão, de medo, de angústia, e senti receio de continuar, mas continuei... continuei a caminhar, e permiti-me continuar a imaginar...

Recordei os momentos em que olhava para o telemóvel, esperando que voltasse a funcionar, enquanto estava com o Afonso e o Daniel. Relembrei o meu esforço incansável para juntar dinheiro, enquanto trabalhava e estudava arduamente.

Relembrei os momentos em que caminhava sozinha, refletindo sobre a minha vida.

Costumava caminhar pela praia quando precisava de estar sozinha, então, imaginei-a. Era o lugar para onde queria ir... Era onde queria estar...

Parecia-me ouvir o eco das ondas, provavelmente provocado pela minha imaginação. Mentalmente, projetei a praia diante de mim e caminhei em direção ao mar... em direção à sensação de liberdade que senti quando emergi das águas e percebi que era livre... Foi então que senti a água fresca envolver os meus pés!...

Eu estava lá! Não conseguia ver, mas conseguia sentir! Não era mera imaginação, era real! Eu estava na praia, o lugar onde renasci!

Lágrimas de alegria escorriam dos meus olhos, ainda vendados, e um sorriso genuíno iluminava o meu rosto. Comecei a rir, recordando os momentos sob outra perspetiva...

Os momentos em que esperava que o telemóvel voltasse a funcionar, foram também os momentos em que conquistei autonomia, independência, força e liberdade!

O Tiago estava mesmo atrás de mim, orgulhoso por eu ter conseguido reconectar-me comigo mesma.

Inspirou profundamente e reuniu coragem para se juntar a mim, vendando também os próprios olhos e avançando.

No momento em que a água fresca alcançou os seus pés, o Tiago foi transportado de volta à sua infância.

Recordou os momentos mais felizes da sua vida, quando passeava pela praia com a mãe. Relembrou os momentos que compartilharam, correndo pela areia, brincando na água...

Apanhava as conchas mais belas e oferecia-as à mãe, que as transformava em colares, mantendo-as perto do coração.

Infelizmente, nos momentos de conflito com o seu pai, muitas partiram-se. Mesmo assim, o Tiago conseguiu guardar uma delas como lembrança, mantendo-a sempre junto ao peito. Essa concha, transformada em colar, permaneceu à volta do seu pescoço todos estes anos. Uma recordação constante da mãe que nunca esquecera, apesar de não ter tido oportunidade de fazer o luto por ela.

Ao reencontrá-la na sua mente, as lágrimas brotaram, acompanhadas por um sorriso de saudade. Finalmente, o Tiago estava a chorar pela saudade que sentia da mãe, após anos de emoções reprimidas.

Eu sentia a presença dele ao meu lado, mesmo sem vê-lo. Estendi a mão, procurando a dele.

Quando as nossas mãos se tocaram, ele sentiu o toque da mãe. Tomei a iniciativa de começarmos a correr e a rodopiar juntos, chapinhando na água e rindo em total harmonia.

Aquela brincadeira desencadeou mais memórias na mente do Tiago, onde se via a rodopiar e a brincar com a mãe na praia. Relembrou os momentos felizes que compartilharam, trazendo uma grande sensação de alegria por reencontrá-la e finalmente poder chorar pela saudade que sentia dela.

Agarrou-me ao colo, continuando a rodopiar, o que impulsionou ainda mais a minha imaginação, trazendo à tona momentos em que corria pela praia sozinha, desfrutando da minha própria companhia, rodopiando e rindo, completamente livre! Pude reconectar-me novamente comigo mesma!

No final, abraçámo-nos com carinho e paixão. O Tiago sentia que estava a abraçar a sua mãe, e eu sentia que estava a abraçar a minha própria essência, que se reprimira por tantos anos e finalmente se libertou (aí, entendi que não poderia sufocar essa parte de mim novamente, teria de deixá-la ser livre)!

Após um abraço repleto de ternura, o Tiago encarou a sua mãe com um sorriso profundo, podendo finalmente despedir-se dela. Ao mesmo tempo, eu sorri para mim mesma, como se estivesse a ver o meu reflexo, profundamente orgulhosa de tudo o que conquistei sozinha, feliz por ter trazido um sorriso genuíno ao meu rosto!

Por fim, a mãe do Tiago também se despediu dele com um sorriso carinhoso e um olhar cheio de ternura, retirando a sua venda, ao mesmo tempo que a minha versão liberta também retirava a minha.

Ao remover a venda, a imagem da sua mãe foi substituída pela minha. Eu segurava a sua venda, chorando de alegria, enquanto ele também retirava a minha. O meu reflexo foi substituído pelo rosto dele, que chorava de alegria comigo.

Sorrimos um para o outro, felizes por termos compartilhado um momento tão incrível, onde nos reconectámos com sentimentos que mantínhamos reprimidos.

Abraçámo-nos novamente, com uma intensidade de paixão, carinho e orgulho. 

CLÍMAX - vem(-te) comigoOnde histórias criam vida. Descubra agora