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[ 19 de fevereiro, sábado ] 



  Sinto que estou andando nas nuvens durante todo o caminho de volta, mas isso acaba quando chego em casa. Sou atraída para a cozinha por uma discussão alta. Espio discretamente; mamãe está sentada à mesa, Ariane e papai estão em pé, parados a pouca distância um do outro, e Castiel está escorado no armário com os braços cruzados e uma expressão dura no rosto. Meu Deus, o que está havendo? Sinto que não é uma boa interromper, então me escondo e apenas ouço. 

  — Ariane, já chega, não tem conversa — papai determina. — Você não vai morar com esse garoto. Sabe quanto custa um apartamento ou uma casa? Vou te dizer: mais do que podem pagar. Como vão se sustentar? Já pensaram nisso? 

  — Pai, eu tenho um emprego — minha irmã rebate. — E Castiel vai arranjar um também. Caramba, qual é o grande problema? Você e a mamãe se casaram cedo e deu tudo certo. 

  — Quem está falando sobre casamento?! — mamãe questiona com um tom de desespero. — Vocês não têm a menor estrutura para se casarem. 

  — A gente não vai casar! E não precisam se preocupar, nós já temos um lugar para morar. O apartamento do Castiel.

  — Sei, e vai sair da casa dos seus pais para viver na casa dos pais de outra pessoa? Pelo amor de Deus, minha filha. 

  — Não vou morar com os pais de ninguém. Castiel vive sozinho. 

  — Como é que é?!

  — Emancipado desde os dezesseis anos — Castiel informa.
 
  — E por que nós não sabíamos disso? 

  — Porque nunca perguntaram. Fala sério, vocês não tem um pingo de interesse pelo meu namorado. Nem gostam dele.
 
  — Isso não vem ao caso, Ariane. Seu namorado ser emancipado é uma coisa que nós deveríamos saber. Significa que estavam sozinhos todas as vezes em que foi até lá. 

  — E que diferença isso faz? Eu não sou mais virgem, grande novidade! 

  — Eu não quero nem saber desse assunto agora — papai declara. — Acha que seu trabalho de garçonete vai ser o bastante para o aluguel? 

  — Castiel não paga aluguel, o apartamento é comprado. Mais alguma coisa? 

  — Você só tem dezoito anos. 

  — E vou pra faculdade. Pai, a maioria dos jovens saem de casa nessa idade. Que diferença faz se vou para um dormitório ou pra casa do meu namorado? 

  — Você poderia só ficar aqui

  — Só que eu quero crescer! Pai, eu te amo e amo a mamãe, só que vou ter que viver minha vida uma hora. Não vou morar aqui pra sempre, a Ana também não. E tudo bem, talvez morarmos juntos não seja uma boa ideia, mas não podemos saber sem tentar. Não podem nos dar um voto de confiança? 

  — Posso falar? — Castiel pede, e suponho que ele se dirige a ambos os meus pais quando diz: — Eu amo sua filha. Reconheço que talvez não esteja a altura dela, mas farei todo o possível para estar. Não me imagino com mais ninguém nessa vida. Nós fazemos um ao outro feliz. A condição para namorarmos era não sairmos da linha. Pois bem, não saímos. 
 
  — Não acha que é jovem demais para saber o que é amor? 

  — Não. O que eu acho é que esse problema é pessoal. Aposto um milhão de dólares que não tentariam empatar se eu fosse o senhor perfeito Lysandre Frey, não é? 

  — Sugiro que abaixe o tom. 

  — Diga que estou errado — Castiel desafia. — O problema são minhas tatuagens? Os piercings? É por que me visto assim? Pois fiquem sabendo que aquele mauricinho metido a besta não é melhor que eu. Já disse uma vez e vou repetir: eu amo a sua filha. E pro inferno se não gostam de mim, vou continuar por perto enquanto ela me quiser.
 
  — Quem você acha que é para falar conosco assim?! 

  — Castiel Chase, muito prazer — o ruivo retruca, e quase posso ver o sorriso sarcástico. — A verdade é que estão me condenando por nada. Eu nunca fui preso, não estou envolvido com drogas, não a trato mal, não estou atolado em dívidas. Não quebrei nenhuma regra que nos impuseram. Então, por favor, me expliquem por que sou tão mau. 

  Silêncio. Um silêncio longo e carregado. Então papai o quebra. 

  — Continuaremos essa conversa depois.

  — Eu já me decidi, pai — a voz da minha irmã soa chorosa. — Depois da formatura, vou morar com o Castiel. Gostaria que me entendessem e me apoiassem, mas se não o fizerem... Só posso lamentar. 

  Ninguém diz mais nada depois disso. Meu coração fica apertado. Ouço passos se aproximarem, então corro o mais rápida e silenciosamente possível para não ser pega bisbilhotando. 

                                        °

  Assim que seus pais saem da cozinha, Greene começa a soluçar. Sinto meu sangue borbulhar de raiva. Sei que deveria tentar me entender com o senhor e a senhora Greene, embora não faça a menor questão, mas não consigo sentir qualquer simpatia pelos dois quando deixam a própria filha nesse estado. A envolvo em um abraço protetor, deixando que chore em meu peito. 

  Isso dura por vários minutos. Não importa o quanto eu beije sua cabeça, acaricie seu cabelo ou diga coisas gentis, nada ajuda. Eu odeio vê-la chateada assim. E pode ser errado, mas eu adoraria bater no pai dela agora. Em um certo momento, a outra Greene aparece. Ela vem até nós com um olhar de pena e compaixão. Não sei quando ela chegou, mas algo me diz que ouviu a coisa toda — ou pelo menos uma boa parte. 

  — Ari? — chama suavemente. 

  A garota em meus braços se vira, mas não se afasta do meu toque. Ainda bem, pois sinto a necessidade de ficar junto a ela no momento. 

  — Eu sinto muito — Ariana diz e se aproxima mais, fazendo com que fiquemos em um abraço triplo estranho. Ela se afasta alguns segundos depois e afasta o cabelo do rosto da irmã. — Ouvi a discussão. Eu te apóio, tá bom? É corajoso da sua parte ir morar com seu namorado. É uma nova fase e pode ser assustadora, mas estarei aqui o tempo todo. E sei que nossos pais também estarão. 

  — Obrigada — Greene responde com a voz falhada, fungando. — Amo você. 

  Ariana sorri e seca as lágrimas da irmã com as mãos. Nós trocamos um olhar enquanto Ariane volta a se virar em meus braços, e eu a agradeço silenciosamente. Então somos deixamos a sós novamente. 

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