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Gon Freecss...

Olho pela última vez a pessoa dormindo na cama, o rosto delicado coberto pela metade com a coberta. Sorrio. Ele está bem. Fecho a porta e vou para a cozinha, é o horário de descanso do Kurapika, então o mesmo está aqui em cima almoçando. Quando me vê entrando ele me encara e faz um sinal apontando para a direção do quarto.
- Como ele está?
 
Respiro fundo e puxo uma cadeira para me sentar.
- Consegui fazer com que ele durma -  passo a mão em meu rosto - Você tinha que ver como ele estava quando saiu do consultório... O olhar dele, as palavras... O jeito com que ele me segurou, como se tivesse visto uma coisa horrível. Ele estava sofrendo Kura... com medo...
  
Ele dá uns tapinhas no meu ombro para me confortar.
- Ele conversou com você no caminho? - nego.
- Estava abraçado comigo no carro, mas não disse nem mesmo uma palavra... As mãos dele estavam tremendo... Sabe, estou curioso para saber o que ele viu, o que ele lembrou... Mas não acho que o certo seja perguntar, não quero fazer ele se remoer. Lembrar de coisas ruins.
 
Encaro o loiro.
- Eu não sei como ajudar ele.
- Você já está ajudando, estando com ele. Você saiu da escola e foi direto encontrá-lo para dar apoio na consulta. Ajudar nem sempre é fazer a pessoa esquecer as coisas ruins, por mais difícil que seja o Killua terá que enfrentar as coisas que aconteceram no passado... caso contrário ele não vai conseguir acreditar no futuro dele. Entende? É como se uma parte dele, sempre fosse estar presa ali, no que o machuca, uma tortura particular. Vai ser difícil, mas ele tem que enfrentar a raiz dos problemas que ele tem. E você- ele aponta para mim- Está dando todo o apoio que ele precisa para isso, ele não vai cair, pois seus braços sempre vão aparar a queda.
  
Sorrio e mexo em uma mecha do cabelo do Kurapika.
- Você sempre sabe o que dizer - ele sorri.
- Aliás Gon, eu sei que você vai pensar coisas melancólicas sobre isso. Se sentir mal por não ter estado ali quando ele precisava. Mas entende que você nem ao menos sabia da existência dele...
  
Assinto.
- Eu sei que não teria como eu ter ajudado, mas sabe, uma parte de mim sofre com ele. Como se eu sentisse as coisas que ele deve ter passado, mesmo sem saber em detalhes... A dor, o desamparado, raiva, tristeza...
- Mas você não deve ficar se torturando com isso.
- Eu sei... Mas quando amamos alguém não é só a felicidade que compartilhamos não é?
- É... - o kura aperta minhas mãos - Estar com o Killua está te fazendo crescer espiritualmente Gon.
 
Ele levanta com a embalagem de comida na mão para jogar no lixo.
- Como assim? - ele dá de ombros.
- Você não é mais a pessoa ingenuamente boa de um tempo atrás, não acha que à vida é só flores... você está aprendendo a lidar com a dor sem ignora-la... você está crescendo - sorrio.
- Uma hora isso tinha que acontecer - ele ri.
- Que bom que está sendo de forma construtiva - seus dedos bagunçam meu cabelo - Tenho que descer, não esquece que daqui a pouco a Mito vai no centro.
- Pode deixar. Vou só dar uma olhada no Kill e já estou descendo.
- Ok.
 
Seus passos se afastam cada vez mais, até que escuto o barulho da porta se abrindo e fechando em seguida. Levanto e pego um copo de água, tomo o mesmo rapidamente, desde que peguei o carro com o Killua estava com sede, mas com tanta coisa na minha cabeça nem ao menos me lembrei de tomar água quando cheguei, só queria deixar ele bem... acalma-lo... apenas isso.
 
Deixo o copo na pia e ando a passos leves até o quarto para não fazer barulho. Paro a mão por um tempo na maçaneta, antes de girar e abrir a porta silenciosamente.
 
Assim que entro sou recebido pela imagem do Killua extremamente torto na cama, seus cabelos desgrenhados. Sorrio. Ele deve ter se mexido muito. Caminho sob o tapete até chegar na cama. Sento e arrumo seu braço que estava embaixo do corpo, colocando o mesmo em uma posição confortável, para que ele não tenha dores ou formigamento. Antes do albino dormir, eu havia colocado um edredom na cama e algumas almofadas, para que não haja risco dele acordar com dor nas costelas danificadas...
  
Sorrio sem mostrar os dentes e levo uma mão até seu rosto, tirando uns fios de cabelo que estavam caídos em seus olhos... seus longos cílios fazem sombra em sua pele pálida. Se me aproximar bem posso ver as marcas das lágrimas que haviam caído anteriormente.
- O que você lembrou? - sussurro.
  
Eu gostaria de ter a capacidade de fazer ele esquecer, mas sinto que assim que o fizesse, o Killua não seria o mesmo, e não teria sentido se não fosse ele, exatamente como é hoje. É seu passado que o faz forte, ao mesmo tempo que o faz frágil, é todos os momentos que faz ele ser quem é, não há nada que eu mudaria.
 
Mas irei tirar a dor dele... sei que ele não vai querer voltar ao consultório novamente, mas é preciso... mesmo que eu insista por muito tempo, tenho que fazer ele cuidar se si mesmo, encarar os medos e angústias... relembrar a dor para nunca mais senti-la de novo. É para seu próprio bem...
  
Me abaixo levemente para perto de seu rosto... Ele está tão lindo, como um diamante translúcido... Olho para seus lábios e imagino seu sorriso... quanta dor está por trás dele?
 
Não importa o quão obscuro seja seu passado, suas memórias... estou disposto a estar ao seu lado no processo, secar cada lágrima, dizer coisas que o conforte, ou apenas ficar em silêncio... mas estar ali... Vou ser o que ele precisa, pois não tem nada que eu precise além dele.
 
Me abaixo mais ainda e beijo delicamente sua testa.
-Vou para o café... durma bem... te amo Kill.
 
Sei que ele não está escutando, mas falo mesmo assim. Com um sorriso me levanto e saio do quarto.

A Luz da Minha Escuridão *Killugon* Onde histórias criam vida. Descubra agora