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Killua Zoldyck...

Meus olhos parecem pesar, está cada vez mais difícil mantê-los abertos, meus cílios batem em meu rosto, e demoram a levantar cada vez mais, não consigo mais resistir e acabo cedendo.
- O que você vê? - a voz aveludada e um pouco grave em seu âmago chega aos meus ouvidos.
- Não vejo nada- respondo em um tom baixo, quase como se estivesse sonolento.
- Não vê nada?
- Está escuro.
  
Escuto o som da ponta da caneta riscando o papel continuamente. Prendo a respiração e solto.
- Vamos tentar de novo Killua... respira fundo e se mantenha alheio - faço o que me foi dito - A partir de agora não falarei nada, apenas me diga o que está vendo.
 
Não respondo, e me concentro em minha própria mente deturpada e lenta, no som de minha própria respiração, no tilintar de meu próprio peito.
- Parece que tem algo cobrindo meu rosto... pois está escuro, mas se olho para baixo consigo ver uma luz fraca, como se estivesse dançando- minha voz está mais lenta que o normal, suave porém meio rouca - Cheira a mofo e... terra molhada, como quando chove e saímos para uma área não pavimentada... Está frio, tem algo escorrendo pelo meu corpo, mas a substância é quente e tem um cheiro metálico... minha garganta está seca, mas minha boca está repleta de saliva... não consigo fecha-la.... algo me impede de juntar meus lábios... doi...
  
A medida que falo, meu corpo parece sentir todas essas coisas ditas. Sinto um frio que me faz arrepiar e atravessa o fino tecido de minhas roupas, minha boca parece um rio denso de saliva, mas no meio parece ter o gosto de sangue. Meus braços...
- Não consigo mexe-los, meus braços parecem estar presos, pendendo para cima. Algo gelado e pesado cerca meu pulso, o aperta cada vez que tento me soltar... escuto passos se aproximando de mim...

- Como está?
 
Mexo minhas mãos mas a corrente grossa a puxa de volta com agressividade, causando uma ardência nas marcas gravadas em minha pele pálida. Uma voz tão familiar ri.
- Kill... você não estaria aqui se não tivesse saído sem permissão. Sabe, você está causando muitos problemas ultimamente.
 
Os passos param, meu coração está acelerado, tento gritar por ajuda, mas a mordaça em minha boca me impede se sequer juntar os lábios, e meus esforços machucam minha boca, fazendo o sangue escorrer pelo meu queixo.
 
Silêncio... Uma gota cai no chão... isso é suor? Não... é quente... muito quente... É meu sangue.
 
Um zumbido corta o ar, meu corpo se curva quando a dura fita de couro cortada em várias linhas atinge minhas costas. O sangue parece sair cada vez mais. O ar se prende em meu peito, a respiração quase nula, o coração acelerado, a vontade de fugir me domina  mas não tenho a habilidade para isso... quero gritar mas só o que sai é um gemido sôfrego e cortado, como se minha voz tivesse me abandonado assim como a esperança...
  
Antes que eu possa me recuperar, sou atingido novamente no peito... A dor arde incansavelmente, seguida por outra investida em minha perna, que cede, caio de joelhos e as correntes puxam meu braço para cima. Grito. Mas nenhum som sai. As lágrimas molham o pano que cobre meus olhos.
- Está chorando? - uma risada soa. Suas mãos vão até o pano e tira.  Encaro sua cara pálida e os pertubadores olhos negros me perfuram. - Sabe Kill... você tem que entender cedo ou tarde quem você é.  Não adianta tentar mudar- seus dedos batem em minha cabeça- Você quer ser como eles? Ter amigos? - um sorriso toma seus lábios- Você terá eles até que os instintos te dominem...
  
Me mexo para sair mais um tapa é desferido em meu rosto, o estalo arde. Vejo ele se afastar e pegar uma lâmina.
 
Quanto mais se aproxima meu coração se acelera, o ar se vai. O pânico me domina. Rezo para que eu morra antes que ele chegue até mim... eu quero sair. Eu tento pedir ajuda mas minha voz ainda se recusa a sair. Fecho os olhos e sinto a lâmina fria em meu abdômen...

- Killua. Killua - as mãos finas da mulher me despertam do transe. Meu peito está doendo, meu coração acelerado. Levanto bruscamente o que me causa certa dor nas costelas, mas não sinto, pois estou mais preocupado em tentar repirar.
 
Ela segura meu rosto.
- Olha para mim Killua... respira devagar, prende a respiração e solta- faço o que ela diz, enquanto lágrimas descem por minha pele.
 
Não sei quanto tempo se passou até que volto ao menos um pouco ao meu estado natural. Preciso sair daqui. Me levanto rapidamente.
- Não vou mais fazer essa merda - pego minha blusa de frio.
- Você não pode sair- ela me diz. Nem ao menos olho para trás e saio da sala.
  
Corro pelo corredor, passando por pacientes e médicos do local, mas não dando visão a nenhum. Quando a porta automática se abre e saio do prédio, meus pés continuam em frente, meu coração ainda apertado, a mente tentando esquecer... esquecer... eu preciso esquecer...
 
Saio da calçada e dou alguns passos, não vejo o carro vindo em minha direção, ele freia perto de mim com vários sons de buzina. Olho assustado e o motorista parece estar me xingando, mas não escuto.Tem um zumbido alto ecoando em minha mente, escondendo o mundo ao meu redor em seu próprio terror. Levanto a as mãos por uns segundos e sigo andando. Encaro a lanchonete na minha frente, quando a porta da mesma se abre e ele me encara.
- O que aconteceu... - corro para seus braços, fecho os olhos fortemente, uma lágrima cai desajeitadamente... aperto sua cintura com meus braços enquanto os dele me rodeia.
 
Respiro fundo e foco no som de seu coração, aos poucos o zumbido para. Minha respiração se acalma.
- Kill... O que aconteceu?
- Eu não quero voltar lá- dou uns passos para trás- Eu não quero lembrar Gon... eu não quero lembrar-minhas unhas cravam em minha pele, enquanto lágrimas escorrem.
 
O esverdeado se aproxima e passa os dedos pelo meu rosto.
- Eu quero ir para casa... podemos ir para casa?
 
Olho em seus olhos em busca de uma resposta, ele apenas me puxa para um abraço.
- Vamos para casa Kill.

A Luz da Minha Escuridão *Killugon* Where stories live. Discover now