35. Uma espera angustiante (parte 2)

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Por fim, Monhãi voltou com os outros irmãos, inclusive Aô-Aô.

No momento em que chegaram, a luz do sol foi interrompida na entrada da caverna. Os sons de passos fortes ecoaram pelas paredes de pedra e o cheiro de algo podre e seco entrou no lugar.

Então, de repente, um trote desenfreado ressoou. Era Aô-Aô. A fera tinha a forma de uma queixada de uns quatro metros, robusta e deformada. Sua cabeça era desproporcional e se afunilava num grande focinho. Os dentes, retorcidos e amarelados, irrompiam ameaçadores de sua boca. As patas, que eram altas — o que lhe dava um aspecto desengonçado —, terminava em garras afiadas. Seu urro era o som de seu nome: Ahô Ahô!

Logo atrás deles, olhando desconfiados, estavam Mbói Tui e Huixon. Mbói Tui tinha a forma de serpente, como Monhãy, porém possuía uma cabeça de papagaio. Plumas enfeitavam sua cabeça, e um par de asas em branco, rubro e preto lhe enfeitavam os lados. A pele era amarelada, e, no final de sua cauda, ele possuía um artefato metálico, como uma joia cuidadosamente trabalhada, coberto com rubelita. Porãsy sabia que não podia enfrentar seu olhar, pois ele implantava horrores em suas vítimas.

Huixon era uma mistura horripilante de ser humano e lobo. Do tamanho de um homem, com olhos em vermelho vivo, carregava um corpo canino esbelto, com focinho e orelhas de lobo e dentes afiados como uma serra. Ele chegou correndo sobre as quatro patas, mas, assim que entrou na caverna, se colocou de pé. Aspirou o ar em direção a Porãsy e gostou de seu cheiro fresco e jovem.

Mas Porãsy não conseguia tirar os olhos de Aô-Aô. Os sons roucos que saíam de sua boca de fera a faziam estremecer, e ela tinha razão em temê-lo. Asssim que a avistou, Aô-Aô foi tomado por seu lado animal e uma fúria incontrolável o dominou, impelindo-o para cima dela. A garota, no entanto, como fora orientada, usava sua armadura feita a partir da palmeira pindó: as roupas, colete, braçadeiras, tornozeleiras e até ornamentos. Ainda assim, ela cogitou sair correndo em direção à palmeira pindó que havia em frente à caverna, mas não foi necessário. A garota viu, de forma nítida, que algo impedia o monstro de se aproximar dela. Uma barreira invisível, mas muito poderosa. Ele tentou várias vezes, até que, confuso, se aquietou. Ao perceberem isso, os irmãos ficaram aliviados e felizes. Todos eles.

Porãsy sabia que a hora estava chegando e que sua performance deveria ser totalmente convincente. Ela pedia insistentemente a Deus que Thomas e os outros chegassem a tempo, pois, ante seus olhos, como ninguém jamais vira, estavam os sete irmãos: Kurupi, Jasy Jaterê, Monhãi, Teju Jagua, Mbói Tui, Huixon e Aô-Aô. A visão mais terrível de todas e de todos os tempos vividos por ela.

A partir daquele momento, Monhãi não saiu mais de perto dela, que, por sua vez, passou a apreciar sua companhia. Porãsy não mais temia tocá-lo e não sentia mais asco com relação a ele. Se tornaram amigos.

Mas, então, passou a temer por Monhãi e pelos outros, porque um plano de destruição e morte estava em andamento. Ela sabia que tinha de fugir dali antes do dia do casamento e falar com os outros da sua etnia, da sua aldeia. Tinha de encontrar Thomas, suas amigas, o resto da tribo e dissuadi-los de destruírem os monstros lendários. Afinal, descobrira, no convívio com os irmãos, que eles não eram monstros. Só tinham aparências assustadoras. 

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Estamos chegando ao final do livro. 

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Porãsy e o estranho mundo das histórias de seu avô indígenaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora