6. aparição (parte 2)

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De repente, dentre a folhagem, surgiu seu primo. O primo chato, Thomas.

— O que você está fazendo aqui? — perguntou ela com raiva dele por estar espionando.

— Nada. O lugar é público. Posso estar aqui quando eu quiser — dizendo isso, ele tirou sua camisa, jogou na margem, tirou os chinelos e mergulhou.

O sangue de Porãsy ferveu com a resposta dele. Ela o achava muito chato, arrogante e prepotente, além de atrevido. Não o suportava, mas, ao mesmo tempo, não deixava de admirá-lo. Era muito bonito. Assim, ela estremeceu quando ele surgiu, depois do mergulho, e balançou a cabeça, retirando o excesso de água. Seus cabelos pretos, lisos e, agora úmidos, brilhando ao sol contrastavam com seu rosto moreno-vermelho, bastante bronzeado. O corpo dela reagiu de uma forma estranha à presença molhada do primo.

— O que foi, prima? Tá admirando a beleza do seu primo?

— Ah, vai! Que beleza? Onde tem beleza aí? — É claro que ela jamais admitiria o que sentiu de verdade. — Você é o primo mais ridículo que eu tenho.

— Sei. Não é o que seus olhos dizem — falou baixinho e com ar debochado.

Porãsy se irritou com as palavras, deixou-o nadando e foi para suas tarefas. Estava ali para lavar suas coisas e não seria ele, com sua presença insuportável, que lhe impediria.

As pessoas da casa de Porãsy tinham um lugar próprio para lavar suas roupas e recolher água – aliás, cada uma das famílias nucleares tinham o seu local específico. Ali tinha uma tábua, já lisa devido ao constante uso, que ficava parte fora e parte dentro das águas, e foi para este lugar que ela se dirigiu.

Depois de uns minutos em que estava concentrada no serviço, ouviu mais uma vez um barulho, este vindo do mato. De novo, era como se folhas secas estivessem sendo pisadas e partidas.

Porãsy parou o que fazia, aguçou o ouvido, olhou em meio à vegetação, na tentativa de ver o que se aproximava, pois, com certeza, tinha alguém ou algo ali. Concluiu que seria seu primo e não se preocupou mais. Sentiu raiva.

Mas o barulho continuou no mato e ninguém saiu dele. Chegou à conclusão de que ele a estava espionando. Já havia notado que ele ficava a observando algumas vezes. Não era só implicante; era também grudento, mas não queria que ele continuasse a espionando do mato.

— Sai daí! — gritou. — Vai caçar um serviço! Tem muito serviço na roça.

Estava zombando dele. Na verdade, não tinham tanto espaço, assim, para plantar. Plantavam em uma roça pequena e comunitária. Produziam alguma mandioca, batata, abóbora, feijão de corda, milho e algumas frutas. O resto da alimentação vinha da cesta básica e do trabalho dos pais em usinas ou lavouras dos fazendeiros da região, e das mães como domésticas ou diaristas na cidade.

Até nisso eram humilhados, se sujeitando a trabalhar para aqueles que tiraram tudo deles. Esse pensamento lhe causava revolta.

Porãsy ficou aguardando o primo, mas nada dele aparecer. De repente, um incômodo percorreu sua espinha, lhe arrepiando a pele. E se não fosse seu primo? E se fosse um dos capangas dos fazendeiros ou mesmo outra pessoa interessada em lhe fazer mal?

— Thomas! — gritou. — É você?

Então alguém surgiu no meio do mato. Mass não era ele... Era um rapaz mais ou menos da idade dele. Usava bermuda, camiseta, tênis e enfeites. Seus olhos eram pretos e lindos, assim como os cabelos. Era moreno e queimado do sol, como os outros rapazes de sua comunidade e etnia. No entanto, ela não o conhecia.

Porãsy e o estranho mundo das histórias de seu avô indígenaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora