Natureza Predatória

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Em um modo geral, o mês de janeiro foi excepcionalmente agitado. Se não bastasse minhas manhãs na companhia de Ginevra e Lovegood, minhas tardes na enfermaria com Mione, meu tempo padrão de estudos e prática de magia, meus treinamentos mentais com Snape de segunda à quinta-feira depois do jantar e minhas noites de sexta com Lagrum, é claro que mais coisas se juntaram a minha rotina nem um pouco já ocupada. Para começar por ordem cronológica, sem surpresa alguma meu estimado professor me deu uma detenção por sair de sua classe sem permissão.

— Como se passássemos pouco tempo juntos, não é mesmo, Gancho? — Chiei as palavras entre os lábios enquanto encarava o rosto pálido e prematuramente envelhecido de Severo. A absoluta falta de reação foi meu primeiro sinal de que não seria assim tão fácil.

— Não será comigo — sua voz chegou áspera até mim, mas seria demais dizer que não consegui sentir o prazer dela. — Filch te espera amanhã a noite, depois de sua aula.

Depois? Mas...! — Engoli as palavras junto com minha frustração, não deixaria que ele as tivesse. Era vingança mesquinha, eu sabia, e eu não lhe daria mais brechas para me sacanear.

— Atrapalhei alguma coisa, Mal? — O veneno fez a suavidade da sua voz se tornar pesada, como uma tonelada de neve caindo em cima de mim. Mantive minha boca fechada, mas garanti que lesse com clareza os nomes que gostaria de lhe atirar. Seus lábios se afinaram ainda mais, equilibrados como o fio de uma navalha e eu vi presas ali. — Você também perdeu quarenta pontos para a Sonserina, então sugiro que continue domando essa língua se não quiser prejudicar ainda mais sua Casa.

— Cujo você é diretor — as palavras escaparam por uma abertura mínima entre meus lábios, mas não fiz grande esforço para as recuar, nem aos meus olhos, pregados nos tuneis gelados e cruéis de Snape. Estava se divertindo, o imbecil. Senti meu sangue ferver, a lembrança física e mental que aqueles olhos traziam eram além da minha capacidade de bloqueio. Com esforço, obriguei meu próprio rosto a relaxar, rasgando os lábios em algo que sabia muito bem que não chegava aos olhos. — E, justamente por isso, sei que toma as melhores decisões em prol de nossa integridade.

Severo continuou com os olhos pregados em mim por mais alguns segundos, com certeza pesando que valia apenas aumentar minha detenção ou não. Por fim, decidiu que já era o suficiente. Observei-o dar as costas e jogar sua capa na minha cara. O esforço para conter a vontade de agarrar o maldito pano negro e enforca-lo com ele foi quase físico, me fazendo processar o veneno que queria ter feito ele se engasgar. Foi com pés pesados que me arrastei de volta para a mesa do almoço e passei pela luta de terminar minha refeição. Meu monstro, muito bem acordado por minhas emoções entaladas, não estava nada interessado em assado de carne e arroz. Ele queria sangue.

Eu tinha consciência que Gancho não faria vista grossa a ao fato de eu ter abandonado sua aula, mas menos quarenta pontos e uma detenção? Com o Filch?! Eu estava esperando que ele aumentasse o tempo de nossas aulas particulares, que a diversão de tentar rachar minha cabeça fosse bastante diversão para ele e punição para mim. Estava enganada. Percebi o quanto enquanto fazia da mastigação uma terapia para não ir atrás dele e estender minha detenção para o resto do ano, agora com bons motivos.

A única razão de Snape ter me dado um castigo tão exagerado foi ele saber que eu não achava que o faria. Era sua maneira sutil de dizer para que eu não esquecesse dos limites de nossa relação: ele até podia achar algum agrado na minha existência, mas não a ponto de passar a mão na minha cabeça por uma afronta pública.

Negar a escuridão dentro de mim sua necessidade de caos me custou caro. Ao decorrer das aulas vespertinas sentia meus ossos doerem e minha marca queimar, o que transformou o dia em algo muito mais longo do que eu estava disposta a enfrentar. Duas aulas de Transfiguração e uma de Feitiços depois, eu não estava com a melhor das caras quando, depois de ignorar o magnetismo da minha cama ao deixar minha mochila no dormitório, me sentei entre Fred e Jorge Weasley na mesa da Grifinória.

Corona IIOù les histoires vivent. Découvrez maintenant