5 Papo de mãe

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Isa

Aquela sim era uma cena bizarra, agora dona Helena tinha voltado com as loucuras? Qual é? Aonde ela tinha encontrado aquele nanico com cara de seriado adolescente? E o pior... Por que ela havia trazido ele para casa? Aquilo já estava beirando o perigo!

Tirei finalmente aquela roupa desconfortável, entrei no closet e peguei uma bermuda até os joelhos e uma camisa de gola esgarçada para dormir. Entrei no banheiro deixando as roupas penduradas atrás da porta e entrei na banheira. Tudo o que eu precisava depois daquele dia, era tirar aquele cheiro nojento e particular de Alex do corpo.

Fechei os olhos, deixando meu celular no descanso, tocando kings of Leon em uma altura que abafasse meus pensamentos, mas que fosse confortável aos meus ouvidos.

Até ouvir batidas na porta, e minha paz ir para o ralo. — Posso falar com você? — sua voz estava calma, apesar do semblante preocupado.

— Sobre? — ergui as sobrancelhas, desligando a música.

— Quer se vestir? E aí nos...

— Não, pode falar, estou bem confortável aqui. — falei dando de ombros, esperando que ela desistisse.

Mas ela assentiu e se aproximou, sentando na borda da banheira.

— Eu não sei mais o que fazer Isabella, eu não sei, você passou outra noite fora, matou sua aula de espanhol, aula essa, que estou pagando para te ajudar a passar na escola...

Me sentei ereta na banheira — Eu sei o que vai dizer mãe, que só tenho dezessete anos e...

— Não... Não, eu vou dizer que você tem dezessete anos Isabella, vai fazer dezoito em poucos dias. Como você vê o futuro? O que vai fazer?

Eram exatamente as perguntas que eu me fazia todos os dias, mas ainda não sabia nenhuma resposta.

Baixei os olhos — Eu não sei... Tá tudo tão... Sei lá, mãe, nada tem graça, nada me satisfaz, nada tá bom, a escola é um saco, os "amigos" são um porre... Eu só queria sumir por uns tempos. Pensar no que fazer. Parece que eu estou a deriva, como um barco quebrado.

Ela apertou os lábios e puxou minha cabeça para um abraço, beijando minha testa.  — Ai meu amor, não sabe o quanto me dói ouvir isso. O quanto quero te ajudar, mas não sei como. Não sei o que fazer sem seu pai. Ele é quem tinha todas as respostas. Eu sei que quase não ficamos juntas, e eu acabo me distraindo de você, mas... Eu juro que isso vai mudar.

Fiquei tocada com o discurso, e sabia o que precisava fazer.

— Então me castigue mãe. Me dê um castigo pelo que eu ando fazendo, me ocupe com alguma coisa, porque eu sinceramente, não vejo nada de bom em mim. E sei que tem razão, eu só faço merda...

Sua mão afagou meu rosto — Castigar você? — sua cabeça balançou de um lado para o outro — Eu não desejo castigar você, só quero que entenda que as broncas e as tentativas de conversa são porque eu te amo. E não quero que nada de mal te aconteça, eu me preocupo, fico angustiada, e não gosto daquele seu namorado.

Sorri — Ex namorado. Não aturo mais aquele otário.

Vi seu suspiro aliviado, e não consegui não sorrir.

Me levantei da banheira me enrolando na toalha e puxei sua mão, levando-a até minha cama. Me vesti, e voltei para entregar uma escova de cabelo para ela.

— Ainda sabe pentear meu cabelo?

Seu sorriso foi acalentador, — Nunca me esqueceria, eram nossos melhores momentos quando era pequena.

Me sentei de costas para ela, jogando o cabelo para trás, — Você me fazia ir para a escola parecendo um globo de festa depois de pentear ele seco.

Ouvi sua risada — Era tudo novo para mim. Mas mesmo assim, você ficava linda.

Sorri fechando os olhos, sentindo a escova acariciar meu couro cabeludo, me deliciando com o carinho.

— Quem era o garoto lá embaixo? — perguntei distraidamente.

Ela parou de escovar por um segundo — O nome dele é Nickolas, ele me ajudou com o carro em frente ao LALEC hoje, e resolvi pagar um almoço para o garoto, no fim, percebi que podia fazer mais por ele. Vou deixar que ele trabalhe aqui.

Ergui a mão para trás, e segurei a escova, me virando para encará-la. — Mãe... Sabe o quanto isso é perigoso? Não pode continuar fazendo isso. Para de tentar compensar o passado. Segue em frente. Você deixou isso de lado por anos, por que voltar para isso agora?

Ela suspirou — Eu preciso ajudar as pessoas, filha. É assim que me sinto útil, que me sinto viva. Tenta entender. E além do mais, passei muito tempo com ele, e... Confio, ele é um bom garoto.

— Espero que esteja certa. Mas não se apegue a ele. Por favor, não se iluda, nós sabemos como isso termina. Já vimos esse filme várias vezes.

— Eu sei o que quer dizer, Isa, mas eu estou bem, te juro que não vou surtar. Só quero ajudar o garoto mesmo, e por favor, não implique com ele, já foi bem rude de sua parte, nem cumprimentá-lo.

Revirei os olhos — Sabe que não curto essas coisas, não vou ficar de sorrisinho pra coitado nenhum. Não confio nesse seu julgamento de que todo mundo é bonzinho, mãe. Em uma conversa, você não consegue conhecer uma pessoa de verdade.

— Ele é diferente. Você vai ver com o tempo, mas dê espaço a ele por enquanto, percebi que ele é bem tímido. Tem algo no olhar dele...

Balancei a cabeça negativamente. — Aí meus Deus, já começou... É o olhar, é algum jeito, é como ele fala... Você é um caso perdido mãe.

— Credo Isa. Do jeito que você fala parece que sou maluca. — ela riu voltando a pentear meus cabelos.

— Você não é... Mas quando se trata desse assunto, parece que toda a sua esperteza morre... — dei de ombros, aquela conversa não nos levaria a lugar algum —
Mas, mudando de assunto, e sobre meu castigo?

Ouvi sua respiração enquanto ela pensava, eu sabia que ela odiava aquela palavra, mas eu realmente precisava daquilo, precisava que ela assumisse o lugar como mãe, que botasse ordem nas coisas, não só por mim, mas por ela também.

— Que tal ajudar na limpeza com a Dália por uma semana depois da escola?

Sorri — Ótimo, e ajudo o Sil a lavar o carro.

Seus olhos se arregalaram para mim — Quem é você, e o que fez com a minha filha? — ela riu.

Sorri e a abracei — Obrigada mãe, não vou mais perder aulas, e... Obrigada pela conversa.

Ela assentiu limpando o rosto, e se levantou.

— Vai comigo à igreja amanhã?

Fiz careta e neguei — Não, essa parte, eu ainda passo.

— Tudo bem. Quando sentir no coração, você vai achar seu caminho para seguir.

— Ou caminho nenhum — sorri.

Ela se despediu com um beijo na minha testa, saiu do meu quarto, e só então, me soltei na cama. Precisava dormir, precisava descansar e esquecer até mesmo aquele dia com os desaforos de Antônio, mas, essa parte, não podia contar a minha mãe.

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