10. Benito vs Ágata

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BENITO

Como toda quinta-feira, Ana Carolina parou o carro em frente à academia de kickboxing. Benito desceu do carro e esperou a mãe sair com o veículo para caminhar até o prédio de tijolinhos vermelhos que ficava ao lado da academia.

Apertou o interfone e logo a porta de vidro escuro foi aberta. Entrou e sorriu para a recepcionista, sempre muito envergonhado por estar ali.

— Benito Becchio — ele soltou baixinho. Não precisava entrar em maiores detalhes, afinal, frequentava o local há um ano.

Um ano que mentia para as irmãs sobre o que realmente fazia nas quintas-feiras. Sentia-se envergonhado em muitos momentos, mas sabia, principalmente, que elas não entenderiam o motivo que o levou até ali. Elas nunca iriam entender.

— Benito, que bom que veio! — Ágata comentou assim que entrou na sala de espera. — Vamos?

Ele assentiu e acompanhou a mulher. Ágata estava na faixa dos quarenta anos, era gordinha, morena, tinha os olhos castanhos mais bonitos que Benito já havia visto e ela usava um colar grande e colorido no pescoço.

Entraram na sala de sempre e Benito sentou-se no sofá marrom com almofadas coloridas.

— Me diga, como passou a semana? — ela questionou com um sorriso largo no rosto. Ágata era sempre muito simpática e às vezes passava uma aura maternal muito agradável para o garoto.

— Foi um pouco estranha — confessou antes de morder o lábio inferior. — Helena e Lívia estão com uma ideia de encontrar um amor para a nossa mãe.

— E como você se sente sobre isso? — a mulher perguntou atenta.

— Eu não gosto da ideia. Não por achar que a nossa mãe não mereça algo legal, mas porque... — parou abruptamente o pensamento e engoliu em seco. Não conseguia verbalizar a verdade aterradora.

Benito já havia conseguido identificar o que o prendia, já sabia dar nome para aquilo. Entretanto, não conseguia fazer com que o sentimento sumisse ou atrapalhasse menos.

Sua personalidade mais reservada e por vezes ranzinza era só um escudo para se proteger dos próprios sentimentos. No caso, um sentimento em específico: a culpa.

— A verdade é que... é que... mamãe só precisa de um novo amor porque... porque eu...eu... — o menino sentiu a garganta queimar e os olhos lacrimejarem.

Ágata não demorou para estender a caixa de lenços de papel para o adolescente. Não era toda quinta-feira que ele chorava, às vezes conseguia fugir do assunto principal que o levou à iniciar a terapia. Mas existiam dias mais difíceis, dias nos quais ele precisava ter a ferida cutucada.

A "cura" era de dentro pra fora, ele sabia disso, mas a dor interna era gritante e a ferida nunca cicatrizava. Talvez nunca fosse cicatrizar totalmente.

— Você deveria apoiar suas irmãs nessa jornada, talvez você descubra questões interessantes sobre a sua mãe e sobre os relacionamentos dela, principalmente relacionamentos amorosos. Talvez vocês possam conversar sobre o seu pai.

O menino negou com a cabeça. Se existia um assunto que não conversava muito sobre, nem mesmo em um ambiente protegido como a sala aconchegante da psicóloga, era o tópico papai. Era doloroso para si mesmo, e só era piorado ao ver os olhos da mãe saudosos ao falar sobre o grande amor da sua vida.

Odiava falar sobre o pai mesmo o amando infinitamente.

A palavra CULPA aparecia em letras garrafais na sua mente e com iluminação em neon vermelho.

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